Neste blogue discutiremos 5 temas: 1. A segurança social. 2. A linguagem enganosa. 3. As estruturas e os processos de desumanização criados pelas oligocracias contra a democracia. 4. A economia política (e.g. Petty, Smith, Ricardo, Sismondi), remodelada e crismada (no fim do século XIX) de "economia matemática", a qual teria o direito de se proclamar "ciência económica" (Ingl. economics) — um direito que não lhe será reconhecido aqui. 5. A literatura imaginativa (prosa e poesia).

10 abril, 2024

 Temas 2 e 3

A única questão importante da guerra na Ucrânia que continua em aberto

 

José Catarino Soares

 

1. A névoa não dura sempre

A segunda guerra na Ucrânia (a que começou em 24 de Fevereiro de 2022) trouxe à luz do dia vários factos da maior importância para a compreensão (i) do modo como está estruturado o “Ocidente alargado[1] e (ii) da natureza da sua relação com os demais países do mundo, que são a grande maioria.

Esses factos estavam escondidos do grande público pela espessa névoa artificial de imagens, sons, acções e palavras criada pela “comunicação estratégica[2] para alcançar os seus objectivos, frequentemente inconfessáveis.  

Lisboa. Cristo-rei e ponte 25 de Abril envoltos em névoa. Fonte: Pinterest.

O desenrolar da guerra na Ucrânia a partir do momento (9 de Abril de 2022) em que se converteu numa guerra feroz e sem quartel entre a Rússia e o “Ocidente alargado”, travada por interposta Ucrânia dissipou, aqui e ali, essa névoa que encobria as articulações fundamentais do “Ocidente alargado”. Pelas brechas assim abertas, o grande público pôde, então, aperceber-se de certos factos de primeira grandeza mantidos até então bem longe da sua vista.

2. Obediência, com temor e respeito

A lista completa desses factos é demasiadamente grande para poder ser apresentada aqui. Vou limitar-me a indicar dois deles, sem os aprofundar. Ambos fazem lembrar uma passagem da Carta [de São Paulo] aos Efésios [3]:

«Servos, obedecei aos vossos senhores temporais com temor e respeito, na sinceridade do vosso coração» /…/

Um desses factos é o completo alinhamento que a grande maioria dos governos (tanto de “direita” como de “esquerda”) dos Estados-membros da União Europeia (incluindo os mais poderosos: Alemanha, França e Itália), mas também do Reino Unido, da Noruega e até ‒pasme-se ‒ da neutral Suíça, com os interesses e a política belicista dos EUA contra a Rússia, desenvolvida por interposta Ucrânia [4].

É uma política que prejudica profundamente os interesses e o bem-estar dos povos europeus. Mas é também uma política, note-se, que prejudica muito seriamente e este é o aspecto susceptível de causar perplexidade, como veremos dentro de alguns instantes os lucros das empresas e as contas bancárias dos oligarcas que controlam a parte do leão da indústria transformadora na Europa. Naturalmente, excluo desta observação os fabricantes de armas de guerra: Rheinmetall e quejandos.

Esse completo alinhamento belicista entre os governos dos Estados europeus e o governo dos EUA contra um alegado inimigo comum (ainda por cima longínquo para muitos deles) teve precedentes já no século XXI — por exemplo, aquando da invasão do Afeganistão para derrubar o regime dos talibãs, em 2001. Mas teve também um grande revés.  Aquando da invasão do Iraque pelos EUA, em 2003, para derrubar Sadam Hussein, a França (representada pelo seu presidente de então, Jacques Chirac) e a Alemanha (representada pelo seu chanceler de então, Gerhard Schröeder), opuseram-se, juntamente com a Rússia (representada pelo seu então novo presidente, Vladimir Putin), a essa invasão, sem nunca claudicarem.

O “Blob americano [5] não se esqueceu dessa dissidência, que encarou com uma afronta intolerável à hegemonia dos EUA. Condoleezza Rice, conselheira para a Segurança Nacional e, mais tarde, ministra dos Negócios Estrangeiros do presidente Bush (filho), anunciou logo a seguir:  

«É preciso punir a França, ignorar a Alemanha e perdoar a Rússia» [6].

Desde então, ficámos a saber que a Rússia não foi nem nunca será “perdoada”; que a França não foi (com Sarkozy e Hollande) nem será (com Macron) “punida” [“para quê punir quem nos apoia?” terão raciocinado os sucessores de Condoleezza Rice] e que a Alemanha foi tudo menos “ignorada” — como veremos mais adiante.

O outro facto, ainda mais espantoso, foi aquele a que aludi mais acima indirectamente. Refiro-me ao completo alinhamento dos proprietários e gestores empresariais das indústrias de transformação dos países europeus (incluindo, em primeiro lugar, as da Alemanha, o Estado mais poderoso da União Europeia) pelos interesses e objectivos do complexo militar-industrial e do Blob dos EUA, oficialmente representados pelo governo de Joe Biden.

O exemplo mais acabado da subserviência total dos oligarcas do capitalismo industrial no âmbito europeu relativamente ao governo americano e aos interesses que ele representa é o completo silêncio e a completa submissão dos proprietários e gestores das indústrias da Alemanha mais dependentes das importações de gás natural russo indústria química, siderurgia, metalurgia, automóvel, máquinas-ferramenta, papel, cerâmica perante a destruição do gasoduto Nord Stream 2 (duas condutas, ambas destruídas) e do gasoduto Nord Stream 1 (duas condutas, uma destruída) pelo governo dos EUA [7].

Agosto de 2022. O chanceler Olaf Scholz posa à frente de uma turbina destinada ao funcionamento do gasoduto Nord Stream 1. Dois meses depois, o governo dos EUA destruiria com explosivos uma das duas condutas do Nord Stream 1 e as duas condutas do gasoduto Nord Stream 2Foto AFP – Bernd Thissen /DPA /dpa Picture-Alliance via AFP.


Ora, para se entender o que tem de espantoso esta atitude de submissão do grande capital alemão aos ditames do governo, do Blob e do complexo militar-industrial dos EUA é preciso ter em conta o seguinte.

A indústria alemã, a mais desenvolvida da Europa aquém da Rússia, representava, em 2022, 29,3% do valor acrescentado total, 19% dos postos de trabalho directos e cerca de 50% do consumo total de energia desse país.  A lucratividade do sector industrial da Alemanha assentou, em grande medida, nos últimos 30 anos, sobre o aprovisionamento de petróleo russo, carvão russo e, sobretudo, a partir de 2012, de gás natural russo, abundantes e baratos. Em 2022, a Alemanha importava da Rússia 55% do seu gás natural e o gás natural constituía mais de 60% do consumo de energia na Alemanha.

Na decorrência das sanções económicas aplicadas à Rússia pela União Europeia (UE), o governo alemão teve uma epifania. “Descobriu”, subitamente, que a prosperidade e o conforto material da Alemanha dependiam, em grande medida, do gás natural russo. E “descobriu” também que isso era intolerável aos olhos do seu patrono americano, tal como este, pela boca do próprio Joe Biden, fez questão de deixar ficar bem claro, ao avisar que iria destruir e, depois, ao destruir mesmo, com potentes cargas explosivas, o gasoduto Nord Stream 2 e danificar o gasoduto Nord Stream 1.

Perante este acto de guerra do seu patrono na OTAN(/NATO), tão insólito quanto brutal, o governo alemão fez então o que não lembraria a ninguém. Em vez de denunciar este acto de guerra furtivo e traiçoeiro, pedir a sua condenação na Assembleia Geral da ONU, exigir uma indemnização aos EUA pelos estragos e prejuízos causados e apresentar um caso contencioso contra os EUA no Tribunal Internacional de Justiça, decidiu fingir que nada tinha ocorrido. Em seguida, tomou a decisão “heróica” de substituir a dependência relativamente ao gás natural russo pela dependência relativamente ao gás natural importado da Noruega e ao gás natural liquefeito importado dos EUA — mas a preços muito mais elevados!  

O preço do gás natural na Alemanha é agora cerca de duas vezes mais alto do que em 2021, prejudicando as empresas que necessitam dele para, por exemplo, manter vidro fundido ou metal fundido 24 horas por dia, e para a fabricação de revestimentos de cerâmica, de papel e de metal utilizados em edifícios e automóveis.

Outro exemplo do efeito boomerang das sanções económicas contra a Rússia é o da indústria química. Trata-se de uma indústria que era também uma grande consumidora de gás natural russo, não só como fonte de energia fabril, mas também

― (i) como matéria-prima ‒ por exemplo, na produção de amoníaco, ingrediente de base no fabrico de adubos ‒

e

― (ii) como combustível de veículos automóveis nos carros com motor de combustão a amoníaco, que se presume poderem garantir uma redução de 90% nas emissões de monóxido de carbono e de dióxido de carbono, comparativamente com motores a gasolina ou gasóleo.

Esta indústria, onde avultam empresas gigantes (BASF, Bayer, Covestro, Evonik, etc.), teve ano passado uma queda de 8% da sua produção e de 12% dos seus investimentos produtivos. O fecho de unidades de produção desta indústria e a deslocalização de outras para a China e para os EUA começaram em 2023.  

Fábrica do grupo químico BASF, em Ludwigschafen, Alemanha. Em Julho de 2023, este grupo empresarial estava a construir um complexo industrial petroquímico de 10 mil milhões de euros em Zhanjiang, China. Razão? O encarecimento do preço do gás natural na Alemanha em consequência da paragem da sua importação da Rússia. Foto: Ben Kilb/FP.

Por estas causas (e outras, menos determinantes, que não vêm agora ao caso), a economia alemã fechou o ano de 2023 em recessão, depois do PIB (Produto Interno Bruto) alemão ter encolhido 0,3%. O ano de 2024 apresenta-se também sombrio.  O ifoInstituto Leibniz para a Investigação Económica (sediado em Munique) previu que a actividade económica continuará a diminuir neste primeiro semestre de 2024 e que o PIB cairá para 0,2%.

«A economia alemã está num impasse. O estado de espírito das empresas e das famílias é mau e a incerteza é elevada» — afirmou o Instituto ifo [Al. “Information und Forschung”] nas suas previsões da primavera.

Nada disto, porém, impede o governo alemão de continuar a ajudar o  governo ucraniano com tudo o que pode carros de combate Leopard; veículos blindados Marder; sistemas de defesa aérea Skynex; mísseis para os sistemas antiaéreos Iris-T SLM ou Patriot; radares TRML-4D; sistemas de detecção de “drones” [aeronaves não tripuladas]; sistemas antiaéreos autopropulsados Gepard; carregadores de munições de artilharia de vários calibres, etc. a fim de que ele possa prosseguir a guerra contra a Rússia… até ao último soldado ucraniano.    

«Em 2023, as exportações de armas da Alemanha atingiram um recorde de 13,35 mil milhões de dólares (12,19 mil milhões de euros, à taxa de câmbio atual). A Ucrânia foi o principal destinatário de armas da Alemanha, no total 4,82 mil milhões de dólares (4,4 mil milhões de euros)» (Expresso, 4 de Janeiro de 2024).

3. Uma questão crucial ainda em aberto na guerra na Ucrânia

Por estas razões, o contraste não poderia ser maior entre a obediência reverencial das classes dirigentes europeias às iniciativas e aos planos belicistas do seu patrono do outro lado do Atlântico, e o desassombro de um magnata dessas bandas, Elon Musk, que faz questão de pensar geopoliticamente pela sua própria cabeça e dizer o que pensa sem temer represálias.

São suas estas sábias palavras:

«Foi um trágico desperdício de vidas para a Ucrânia atacar um exército maior que tinha defesa em profundidade, campos minados e artilharia mais forte, quando a Ucrânia não tinha blindagem nem superioridade aérea! Qualquer idiota poderia ter previsto isso.

A minha recomendação, há um ano, era que a Ucrânia se entrincheirasse e aplicasse todos os recursos na defesa. Mesmo assim, é difícil manter um território que não tem fortes barreiras naturais.

Não há qualquer hipótese de a Rússia tomar toda a Ucrânia, uma vez que a resistência local seria extrema na parte ocidental, mas a Rússia ganhará certamente mais terreno do que tem actualmente.

Quanto mais tempo durar a guerra, mais território a Rússia ganhará até atingir o Dniepre, que é difícil de ultrapassar. No entanto, se a guerra durar o tempo suficiente, Odessa também cairá.

Se a Ucrânia perde ou não todo o acesso ao Mar Negro é, a meu ver, a verdadeira questão que resta. Recomendo uma solução negociada antes que isso aconteça» (Elon Musk, X, 30 de Março de 2024). [realce a traço grosso acrescentado ao original]

Creio que qualquer analista sério concordará com este diagnóstico. Acrescentarei apenas o seguinte, para prevenir possíveis mal-entendidos.

A questão (ainda em aberto) de saber se a Rússia ocupará ou não os oblasti de Micolaíve e Odessa, fechando desse modo o acesso da Ucrânia ao Mar Negro, não tem uma motivação (de conquista) territorial, mas de segurança. A ocupação desses dois oblasti ‒ assim como, na direcção oposta, do oblast de Carcóvia ‒ só teria (/terá) racionalidade para a Rússia se fosse (/for) considerada um meio indispensável de aumentar a profundidade estratégica da Crimeia e da Donbass.

Este é, porém, um assunto que só analistas com uma formação militar muito avançada (não é o meu caso) e, também, naturalmente, possuidores de grande competência e argúcia, poderão deslindar e desenvolver cabalmente. Há alguns em Portugal que reunem esses requisitos, além, bem entendido, da indispensável integridade intelectual. Esperemos que nos brindem com uma análise aprofundada desta questão.

4. Forças e fraqueza do plano de paz de Musk

Não é a primeira vez que Musk se pronuncia sobre a guerra na Ucrânia de um modo certeiro e completamente em contracorrente não só daquele que prevalece entre os membros da sua classe social (a dos grandes capitalistas e dos gestores empresariais ao seu serviço) aquém e além Atlântico, mas também daquele que prevalece no governo e no Blob dos EUA, no Conselho Europeu, na Comissão Europeia e na OTAN (/NATO).

No dia 3 de Outubro de 2022, Elon Musk publicou a seguinte plano de paz no Twitter (hoje X):

A Paz entre a Ucrânia e a Rússia [passa por, n.e.]:

1) ― Repetir as eleições nas regiões anexadas [pela Rússia: Lugansk, Donetsk, Quérson, Zaporíjia, n.e.] sob a supervisão da ONU. A Rússia abandona o país se essa for a vontade do povo.  

2) ― A Crimeia faz formalmente parte da Rússia, como tem sido o caso desde 1783 (até ao erro de Khrushchev).

3) ― O abastecimento de água à Crimeia é assegurado.

4) ― A Ucrânia mantém-se neutral.

A numeração das propostas foi acrescentada por mim (para facilitar a remissão ao seu teor), assim como as notas entre colchetes [n.e.= nota editorial], para clarificar o seu teor.

O artigo 1) do plano de paz entre a Ucrânia e a Rússia proposto por Musk contém um erro, que tem todo o ar de ser um lapsus linguae. Não se trataria de “repetir eleições”, mas “referendos”.

A este respeito convém recordar o seguinte. Nos dias 23 a 27 de Setembro de 2022, foram realizados referendos nos quatro oblasti ocupados pelas tropas russas. Como esses oblasti não tinham todos o mesmo estatuto político-jurídico aos olhos da Federação Russa, a pergunta feita em cada um deles não foi exactamente a mesma, nem as línguas utilizadas para as formular foram exactamente as mesmas.

Os referendos realizados na República Popular de Donetsk (RPD) e na República Popular de Lugansk (RPL), que se separaram da Ucrânia em Maio de 2014, formularam a seguinte pergunta, em russo, aos votantes:

 ― «Aprova que a República Popular de [Donetsk ou Lugansk, consoante o caso, n.e.] seja incorporada na Federação Russa com os direitos de sujeito da Federação Russa?»

Os referendos realizados nos oblasti de Quérson e Zaporíjia, que estavam incorporados na Ucrânia à data de 24 de Fevereiro de 2022, formularam a seguinte pergunta, em russo e em ucraniano, aos votantes:

― «Aprova a saída do oblast de [Quérson ou Zaporíjia, consoante o caso, n.e.] da Ucrânia, a reforma do oblast de [Quérson ou Zaporíjia] num Estado autónomo e a sua incorporação na Federação Russa, com os direitos de sujeito da Federação Russa?».

A resposta «Sim» a estas perguntas foi largamente maioritária [8]. Isso só surpreenderá quem desconheça que (i) a população destes territórios é maioritariamente russa, russófona e russófila [9]; que (ii) foi privada dos seus direitos linguísticos pelo regime ucraniano nascido do golpe de Estado de Maidan (Fevereiro de 2014) [10], e que (iii) foi militarmente atacada, bombardeada e martirizada pelo mesmo regime durante 8 anos (2014-2022) antes, e mesmo depois, do começo da denominada “Operação Militar Especial” da Rússia [11].  

Feita a correcção (referendos e não eleições), parece claro que o artigo 1) do plano de paz proposto por Musk já tinha ultrapassado há muito tempo o seu prazo de validade quando foi apresentado. O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, chamou a atenção para esse anacronismo:

«É muito positivo que uma pessoa como Elon Musk esteja a tentar encontrar uma solução pacífica. Todavia, «no que respeita aos referendos, as pessoas expressaram a sua opinião e não poderá haver mais nada» [12].

É necessário acrescentar que um referendo que fosse convocado para averiguar se a população da RPD, da RPL, de Quérson e de Zaporíjia preferia um processo de autodeterminação conducente:

A) à sua permanência na Ucrânia com um estatuto autonómico semelhante ao do Tirol do Sul (em relação à Itália)

ou

B) à sua incorporação na Federação Russa com os direitos de sujeito autónomo da Federação Russa

teria sido possível de realizar logo no início da guerra entre a Rússia e a Ucrânia, e nada obstaria a que fosse supervisionado pela ONU.

A prova disso é que a possibilidade A) foi um dos artigos explicitamente contemplado e acordado nas negociações que culminaram no acordo de paz celebrado entre a Ucrânia e a Rússia no fim de Março de 2022, em Istambul.

Sabemos que Zelensky rompeu esse acordo em 9 de Abril de 2022 e sabemos as razões por que o fez. Examinei pormenorizadamente esta questão noutro lugar, pelo que não é necessário voltar aqui, outra vez, ao assunto [13].  Por conseguinte, em 3 de Outubro de 2022, a proposta contida no artigo 1) do plano de paz apresentado por Musk já tinha sido irreversivelmente ultrapassada pela evolução da guerra e da situação política no terreno nos 6 meses anteriores.

Quanto aos demais artigos (2, 3, 4) do plano de paz proposto por Elon Musk, eles continuam actuais. Não haverá paz na Ucrânia enquanto não forem cumpridos.

5. O “Ocidente alargado” contra-ataca

Elon Musk é um cidadão americano, um gestor industrial bem-sucedido e um prolífico inventor. É também um magnata capitalista, um oligarca com uma fortuna avaliada de 198,2 mil milhões de dólares, o que faz dele, em 2024, o segundo homem mais rico do mundo, segundo a Forbes.

2015. Elon Musk apresenta um dos carros eléctricos Tesla que concebeu. Foto Justin Sullivan
Getty Images News via Getty Image

Musk não faz segredo das suas simpatias políticas. Afirmou que votou em Hillary Clinton nas eleições presidenciais norte-americanas de 2016 e que votou em Joe Biden nas eleições presidenciais norte-americanas de 2020. 

Sobre os EUA, o seu país adoptivo (Musk nasceu e cresceu na África do Sul), Musk declarou:

«Penso que os Estados Unidos são o melhor país que já existiu na Terra [!]. E penso que será difícil argumentar, em bases objectivas, que não o são. Penso que os factos apontam realmente nessa direcção. É a maior força em prol do bem de todos os países que já existiram [!]. Não haveria democracia no mundo se não fossem os Estados Unidos [!]» [14].

Por último, cabe lembrar que a Ucrânia tem estado totalmente dependente do serviço de Internet por satélite Starlink ‒ cujo proprietário é Elon Musk ‒ para as suas comunicações desde a invasão russa em 24 de Fevereiro de 2022.

Em suma, sociologicamente falando, Elon Musk é o exemplo mais perfeito do “sonho americano” na sua versão mais cor-de-rosa e mais exaltante para os doutrinadores e praticantes da comunicação estratégica dos EUA.

Assim sendo, os muitos e extraordinários predicados de Musk deveriam,  em bom rigor, garantir-lhe ficar ao abrigo de qualquer suspeita de querer ajudar a Rússia a conquistar ou destruir a Ucrânia. Desengane-se, porém, quem assim pensar!

O plano que Musk propôs, desinteresseiramente, em 3 de Outubro de 2022, para pôr fim à guerra entre a Rússia e Ucrânia e estabelecer uma paz justa e duradoura entre esses dois países, assim como a advertência assustadora (mas realista) que fez em 30 de Março de 2024 ‒ sobre a ameaça que paira sobre a Ucrânia de perder o acesso ao Mar Negro se persistir no seu iníquo [15], inútil, alucinado e suicidário esforço de guerra ‒ valeram ao seu autor não um agradecimento e louvor da parte dos dirigentes desse Estado e dos Estados seus apoiantes (como seria de esperar se estivessem de boa-fé), mas, pelo contrário, um cerrado e venenoso ataque. Eis alguns exemplos.

A senhora Fiona Hill, ex-directora para a Europa e a Rússia do Conselho de Segurança Nacional do presidente Donald Trump e um proeminente membro do Blob, veio imediatamente declarar que o plano de paz proposto por Musk tinha sido, de facto, redigido por Putin para ser transmitido por Musk, uma mera correia de transmissão ao seu serviço [16]. Musk seria, pois, um agente secreto de Putin! 

Ian Bremmer  professor universitário, fundador e presidente do Eurasia Group e também um proeminente membro do Blob  acusou Musk de ter falado com Putin antes de ter apresentado o seu plano, insinuando que o plano só foi publicado porque teria obtido a benção prévia de Putin! Musk desmentiu imediatamente essa atoarda no Tweeter

«Não, não é verdade [que tenha falado com Putin sobre o plano de paz para a Ucrânia]. Falei com Putin apenas uma vez e isso foi há cerca de 18 meses. O assunto foi o espaço». 

O desmentido foi em vão, porque Bremmer, em vez de se retractar, reiterou a sua acusação.  

Por sua vez, o presidente Zelensky veio a público afirmar que havia dois Musks: um que apoiava a Ucrânia [com o seu sistema Starlink] e outro que apoiava a Rússia [com o seu plano de paz], para, de seguida, perguntar sarcasticamente aos seus leitores do Tweet/X: “qual é o Musk de que gostam mais?”.

Musk respondeu a Zelensky:

«O custo suportado pela SpaceX para activar e apoiar a Starlink na Ucrânia é de cerca de 80 milhões de dólares até agora. O nosso apoio à Rússia é de 0 $. Obviamente, somos a favor da Ucrânia».

«Continuo a apoiar fortemente a Ucrânia, mas estou convencido de que uma escalada maciça da guerra causará grandes danos à Ucrânia e possivelmente ao mundo».

Mykhaylo Podolyak, assessor do presidente Zelensky, sugeriu “um plano melhor”: 1) a Crimeia seria reanexada pela Ucrânia; 2) a Rússia seria desmilitarizada e desnuclearizada [por quem, Podolyak não disse, mas depreende-se que seriam os EUA com a ajuda de todos os outros Estados-membros da OTAN(/NATO), dando assim início à terceira e derradeira guerra mundial] e 3) os “criminosos de guerra” seriam julgados num tribunal internacional [quem seriam os réus, Podolyak não disse, mas depreende-se que seriam seleccionados exclusivamente no lado russo].

Musk respondeu-lhe no Tweeter (/X):

«A Rússia está a fazer uma mobilização parcial. Se a Crimeia estiver em risco, os russos vão mobilizar-se para uma guerra total. A mortandade será devastadora em ambos os lados da contenda. A Rússia tem (mais de) 3 vezes a população da Ucrânia, por isso a vitória da Ucrânia é improvável numa guerra total. Se te preocupas com o povo da Ucrânia, procura a paz».

O desembaraçado e desbocado embaixador da Ucrânia na Alemanha, Andriy Melnyk, escreveu com a sua proverbial elegância:

«Vai à merda, é a minha muito diplomática réplica para ti, Elon Musk»

Musk limitou-se a retorquir que não lhe importava que o seu plano de paz não fosse do agrado de todos, argumentando que só se importava

«com o facto de milhões de pessoas poderem morrer desnecessariamente por um resultado essencialmente idêntico. Vamos então tentar isto: a vontade das pessoas que vivem na Donbass e na Crimeia deve decidir se fazem parte da Rússia ou da Ucrânia»[17].

Tudo em vão, naturalmente. Os argumentos de Musk só serviram para ele próprio, apesar de todo o seu enormíssimo poder económico e mediático (ele é dono não só do Starlink, mas também do X), ser incluído definitivamente na lista dos “putinistas”, “agentes putinescos do Kremlin”, “idiotas úteis a Putin”.

6. Mudam-se os tempos…

Estes e outros mimos lançados pelo Blob, pelas oligarquias dirigentes do “Ocidente alargado” e pelos comentadores do sistema mediático dominante de comunicação social (estações de rádio e televisão de grande audiência e jornais e revistas de grande circulação) têm uma função puramente intimidatória: amedrontar e silenciar toda e qualquer pessoa que se recuse a trocar o apego aos factos (todos os factos pertinentes e não apenas alguns) e o apreço pela verdade pelo inebriante alucinogénio da comunicação estratégica.  

É uma função cada vez mais difícil de realizar. Um minúsculo (mas nem por isso menos informativo) sintoma dessa dificuldade foi a idêntica objecção, pretensamente irónica, que dois apresentadores diferentes da CNN-Portugal formularam, em dois programas diferentes, quando foram confrontados com a advertência de Musk que traduzi e reproduzi mais acima (cf. secção 3):

«Que eu saiba, Elon Musk não é um especialista em relações internacionais…»

Subentendido:

Não vamos, por isso, perder tempo com o que esse indivíduo diz sobre a guerra na Ucrânia. Temos mais que fazer”.

Como se a grande maioria dos alegados “especialistas” que a CNN-Portugal contratou como comentadores da guerra na Ucrânia (e do genocídio em Gaza) não debitassem, todos os dias, um chorrilho de inanidades, meias-verdades, falsidades e disparates sobre o assunto!   

Seja como for, há um pequeno progresso a registar. Há um ano, os mesmos apresentadores teriam, provavelmente, invocado as calúnias da senhora Fiona Hill, os sarcasmos de Zelensky ou as fanfarronadas do senhor Mykhaylo Podolyak na esperança de assestar um murro imaginário em Musk que o pusesse K.O. à frente de milhões de anónimos e mudos telespectadores.

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Notas e referências

[1] Ocidente alargado” é uma expressão cara a Zbigniew Brzezinski (1928-2017) ‒ um dos mais cínicos ideólogos da supremacia dos EUA sobre todos os outros países do mundo ‒ que a empregava para designar o conjunto formado pelos EUA e os seus aliados/clientes na América do Norte [Canadá], Europa [os Estados-membros da OTAN e da UE], Ásia [Japão, Coreia do Sul] e Australásia [Austrália e Nova Zelândia]. Emprego aqui a palavra “clientes” num sentido afim daquele que tinha na Roma antiga. Os “clientes” constituíam uma classe constituída por plebeus, escravos libertos, estrangeiros ou filhos ilegítimos que se associavam, de forma subalterna, aos patrícios, a classe romana superior, prestando-lhes diversos serviços em troca de auxílio económico e protecção social e militar.

[2] Por “comunicação estratégica”, no âmbito geopolítico e geoeconómico, deve entender-se, segundo os seus praticantes, «os esforços concentrados do governo dos Estados Unidos para compreender e envolver audiências-chave para criar, reforçar ou preservar condições favoráveis ao avanço dos interesses, políticas e objectivos do governo dos Estados Unidos através da utilização de programas coordenados, planos, temas, mensagens e produtos sincronizados com as acções de todos os instrumentos do poder nacional» (Joint Publication 1-02, Department of Defense Dictionary of Military and Associated Terms. Washington D.C., 8 November 2010 [as amended through 15 February 2016]).

[3] “Carta aos Efésios”, 6.5. In Bíblia Sagrada. Verbo. 1982, p.1329.

[4] As únicas excepções são as do governo de Viktor Orban (Hungria) e do governo de Robert Fico (Eslováquia) — este último acaba de sair reforçado com a eleição do seu aliado, Peter Pellegrini, para presidente da República. Estes dois países são ambos países encravados, sem saídas para os mares e oceanos que banham a Europa. São também, há muitas décadas, altamente dependentes do petróleo e do gás natural russo que lhes chega através de  um oleoduto (Druzhba, ou oleoduto da Amizade) e de um gasoduto que atravessam a Ucrânia e que continuam a funcionar com o acordo do governo da Ucrânia (!), o qual continua a cobrar e receber da Rússia as portagens que foram contratualizadas antes da guerra para o trânsito desses hidrocarbonetos. Sem o petróleo e o gás russos, abundantes e baratos, a Eslováquia e a Hungria ficariam energeticamente estranguladas. Por isso, Orban (um governante dito de “direita”) e Fico (um governante dito de “esquerda”) fizeram a única escolha racional e correcta, do ponto de vista dos interesses dos seus respectivos países e povos: continuar a importar o petróleo (e o gás natural) russo e manter boas relações com a Rússia e o seu presidente. São decisões “soberanistas” que os demais membros da UE ‒ geopolítica e geoeconomicamente alinhados com o Blob americano ‒ consideram abomináveis e que tudo farão para reverter.

[5] Blob é a denominação coloquial em Inglês do physarum polycephalum, que literalmente quer dizer “bolor de várias cabeças”. Esta biospécie é constituída por organismos unicelulares do grupo dos micomixetos, ou bolor limoso, uma subcategoria da família das amibas. Apesar de não ter um sistema nervoso central, o blob é capaz de se locomover (através de pseudópodes), aprender com as suas experiências e mudar o seu comportamento em conformidade. Por exemplo, quando se sente ameaçado entra em estado de hibernação e “seca”, para ressuscitar em condições ambientais mais favoráveis. O blob reproduz-se através de esporos que se transformam em novos blobs. Quando dois blobs se encontra fundem-se um no outro num blob maior que, deste modo, pode atingir dez metros de comprimento.

O termo blob tem a sua origem no título de um filme de ficção científica (The Blob), estreado em 1958, que tinha como protagonista principal Steve McQueen. O filme narrava a invasão da Terra por um organismo extraterrestre que devora tudo o que encontra pela frente numa pequena cidade dos EUA.

Em 2016, Ben Rhodes ‒ um assessor do presidente Barak Obama (o seu guru para a Segurança Nacional) e o autor de muitos dos seus discursos ‒ empregou o termo Blob (com inicial maiúscula) numa conversa com o jornalista David Samuels, do New York Times Magazine, para denominar depreciativamente um grupo específico da oligarquia dirigente dos EUA. Trata-se de um grupo «composto por democratas e republicanos ‒ um grupo díspar de elementos pertencentes à fina-flor dos centros de estudos [Ingl. “elite think-tankers”], legisladores, jornalistas e outros que tais na Washington oficial ‒ que se aglutinam em torno de uma política externa que defenda o velho evangelho da chefia americana na cena mundial» (Jacob Heilbrunn, “How the War in Ukraine Is Reviving the Blob”. Politico. 5/06/2022). Convém acrescentar que «o Blob não é, estritamente falando, o sistema oficial de instituições que sustentam a política externa americana (os centros de estudos [Ing. “think tanks”], as escolas de política pública, os meios de comunicação social, os organismos governamentais), e não são, estritamente falando, todos os habitantes dessas instituições. O Blob é um subconjunto grande e dominante das pessoas que habitam essas instituições — um subconjunto cujos membros, embora por vezes discordem, partilham certas tendências que moldam a política externa americana» (Robert Wright, “Toward a unified theory of Blob-dom”. Responsible Statecraft, October 13, 2021). «De acordo com Rhodes», o Blob incluía, em 2016, «Hillary Clinton, Robert Gates e outros promotores da guerra do Iraque de ambos os partidos que agora se queixam incessantemente da derrocada da ordem de segurança americana na Europa e no Médio Oriente» (David Samuels, “The Aspiring Novelist Who Became Obama’s Foreign-Policy Guru. How Ben Rhodes rewrote the rules of diplomacy for the digital age”. New York Times Magazine, May 15, 2016).   

[6] «Punish France, ignore Germany, forgive Russia” was the famously pithy advice of Condoleezza Rice, America’s national security adviser, after the rows over Iraq at the United Nations earlier this year». In “Europe and Uncle Sam”. The Economist, September 4, 2003.

[7] Ver as confissões ante acta de Victoria Nuland [https://www.youtube.comwatch?v= RLeAgMF0Q6y] e de Joe Biden [https://www.youtube.com/watch?v=kBQSSjMhDmA], assim como o artigo de Seymour Hersh, “How America Took Out The Nord Stream Pipeline”, Substack, February 2, 2023.

[8] De acordo com os resultados divulgados pela Comissão Eleitoral Central da Rússia, através das suas secções na RPD e na RPL, 99,23% (2.116.800 votantes) apoiaram a incorporação da RPD na Federação Russa e 98,42% (1.636.302 votantes) apoiaram a incorporação da RPL na Federação Russa. A taxa de participação foi de 97,51% (2.131.207 votantes) e 94,15% (1.662.607 votantes), respectivamente.

De acordo com os resultados divulgados pela secção regional de Quérson da Comissão Eleitoral Central da Rússia, 87,05% (497.051 votantes) apoiaram a incorporação deste oblast na Federação Russa, com 12,05% (68.832 votantes) contra e 0,9% de votos nulos, numa taxa de participação de 76,86%. De acordo com os resultados divulgados pela secção regional de Zaporíjia da Comissão Eleitoral Central da Rússia 93,11% (541.093 votantes) a favor da incorporação deste oblast na Federação Russa. A taxa de participação declarada foi de 85,4%.

De acordo com os dados fornecidos pela Comissão Eleitoral Central, o apoio à incorporação foi de 90,01% no Raion [= município] de Melitopol, enquanto no seu centro administrativo, Melitopol, foi de 96,78%. (Cf. “Residents of Donbass, Zaporozhye and Kherson region overwhelmingly supported joining the Russian Federation”. Tass.Ru, 28 September 2022).

[9] Ver a secção 1 [“Causas da primeira guerra na Ucrânia”] do meu livro, Dissipando a Névoa Artificial da Guerra: um roteiro para o fim das guerras na Ucrânia, a paz na Europa e o desarmamento nuclear universal (Editora Primeiro Capítulo. Agosto de 2023).

[10] Ver “Causas da primeira guerra na Ucrânia”, op.cit.

[11] Ver Bruno Amaral de Carvalho, A Guerra a Leste: oito meses no Donbass. Editorial Caminho. Abril de 2024.

[12] “Elon Musk’s peace plan for Ukraine draws condemnation from Zelensky”. Associated Press, 4 October 2022.

[13] Ver José Catarino Soares, “Em 9 de Abril de 2022 Zelensky preferiu a guerra à paz pelos motivos mais mesquinhos”, Estátua de Sal

1.    https://estatuadesal.com/2023/12/12/em-9-de-abril-de-2022-zelensky-preferiu-a-guerra-a-paz-pelos-motivos-mais-mesquinhos/

2.    https://estatuadesal.com/2024/02/12/em-9-de-abril-de-2022-zelensky-preferiu-a-guerra-a-paz-pelos-motivos-mais-mesquinhos-parte-ii/

3.    https://estatuadesal.com/2024/02/13/em-9-de-abril-de-2022-zelensky-preferiu-a-guerra-a-paz-pelos-motivos-mais-mesquinhos-parte-iii/

4.    https://estatuadesal.com/2024/02/17/em-9-de-abril-de-2022-zelensky-preferiu-a-guerra-a-paz-pelos-motivos-mais-mesquinhos-parte-iv/

5.    https://estatuadesal.com/2024/02/21/em-9-de-abril-de-2022-zelensky-preferiu-a-guerra-a-paz-pelos-motivos-mais-mesquinhos-parte-v-e-ultima/

[14] Ben Watterberger, “Elon Musk and the frontier of Technology”.Think Tank, 12/13/ 2007.

[15] A partir do momento (9 de Abril de 2022) que Zelensky rompeu o acordo de paz, muito favorável, que tinha celebrado com a Rússia em fim de Março de 2022, em Istambul, o esforço de guerra do governo ucraniano contra as tropas russas perdeu toda e qualquer legitimidade. Converteu-se numa iníqua forma de destruir centenas de milhares de vidas ucranianas (e muitas dezenas de milhares de vidas russas) em nome de um nacionalismo opressor, etnofóbico, obscurantista e niilista.  

[16] Maura Reynolds, «Fiona Hill: ‘Elon Musk Is Transmitting a Message for Putin’». Politico, 17 October 2022.

[17] As citações foram colhidas nestas fontes: “Zelenskiy hits back as Elon Musk sets up Twitter poll on areas of Ukraine”. The Guardian, 4 October 2022; “Elon Musk’s peace plan for Ukraine draws condemnation from Zelensky”. Associated Press, 4 October 2022; “Elon Musk Sets Off Uproar in Ukraine by Tweeting His ‘Peace’ Plan”. Time, 4 October 2022; “Elon Musk Spoke to Putin Before Tweeting Ukraine Peace Plan: Report”. Vice, October 11, 2022.