Neste blogue discutiremos 4 temas: 1. A linguagem enganosa. 2 As estruturas e os processos de desumanização criados pelas oligocracias contra a democracia. 3. A economia política (e.g. Petty, Smith, Ricardo, Sismondi), remodelada e crismada (no fim do século XIX) de "economia matemática", a qual teria o direito de se proclamar "ciência económica" (Ingl. economics) — um direito que não lhe será reconhecido aqui. 4. A literatura imaginativa (prosa e poesia).

05 abril, 2025

 

 Temas 1, 2 e 3

Como a América Eliminou

o Gasoduto Nord Stream


Seymour Hersh [*] 


(Tradução de Fernando Oliveira [**])

 

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O New York Times chamou-lhe um “mistério,” mas os Estados Unidos levaram a cabo uma operação marítima oculta que foi mantida secreta – até agora [8.02.2023].

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Foto do Comando de Defesa Dinamarquês, mostrando a fuga de gás resultante das explosões que destruíram 3 dos 4 gasodutos Nordstream no Mar Báltico.


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O Centro de Mergulho e Salvamento da Marinha dos EUA pode ser encontrado num local tão obscuro como o seu nome — o que outrora foi um caminho rural na cidade rural de Panama City, uma cidade turística actualmente em expansão no sudoeste da Florida, cerca de 110 km a sul da fronteira do Alabama. O complexo do centro é tão desinteressante como a sua localização – uma estrutura pardacenta de betão pós Segunda Guerra Mundial que tem o aspecto de uma escola secundária profissional do Oeste de Chicago. Do outro lado do que é agora uma estrada de quatro faixas temos uma lavandaria que funciona com moedas e uma escola de dança.

Há décadas que o Centro tem vindo a treinar mergulhadores de águas profundas altamente qualificados que, uma vez destacados para unidades militares americanas em todo o mundo, são capazes de efectuar mergulhos técnicos para fazer bom uso de explosivos C4 na limpeza de portos e praias de detritos e munições por explodir — mas também mau uso, como fazer explodir plataformas petrolíferas estrangeiras, entupir válvulas de admissão para centrais eléctricas submarinas, destruir bloqueios em canais de navegação cruciais. O Centro de Panama City, que possui a segunda maior piscina coberta da América, foi o local perfeito para recrutar os melhores, e mais taciturnos, formandos da Escola de Mergulho que executaram com sucesso no Verão passado o que tinham sido autorizados a executar cerca de 80 metros [260 pés] abaixo da superfície do Mar Báltico.

Em Junho passado, os mergulhadores da Marinha, operando sob a cobertura de um exercício da OTAN (/NATO) amplamente divulgado em meados do Verão conhecido como BALTOPS 22, colocaram os explosivos accionados à distância que, três meses depois, destruíram três dos quatro gasodutos Nord Stream, de acordo com uma fonte com conhecimento directo do planeamento operacional.

Dois dos gasodutos, conhecidos colectivamente como Nord Stream 1, forneciam gás natural russo barato à Alemanha e a grande parte da Europa Ocidental há mais de uma década. Entretanto, fora construído um segundo par de gasodutos, denominado Nord Stream 2, mas que ainda não estava operacional. Agora, com as tropas russas a acumularem-se na fronteira ucraniana e a guerra mais sangrenta da Europa desde 1945 a aproximar-se, o Presidente Joseph Biden via os gasodutos como um veículo para Vladimir Putin transformar o gás natural numa arma para as suas ambições políticas e territoriais.

Solicitada a comentar, Adrienne Watson, porta-voz da Casa Branca, disse numa mensagem de correio electrónico, «Isto é falso, é uma ficção total». Tammy Thorp, porta-voz da Agência Central de Inteligência (CIA), escreveu de forma semelhante: «Esta afirmação é completa e totalmente falsa

A decisão de Biden de sabotar os gasodutos surgiu depois de mais de nove meses de debate altamente secreto dentro da comunidade de segurança nacional de Washington sobre a melhor forma de concretizar tal objectivo. Durante a maior parte desse tempo, a questão não era saber se a missão deveria ser cumprida, mas como fazê-lo sem qualquer indício claro de quem era o responsável.

Havia uma razão burocrática vital para confiar nos formandos da dura Escola de Mergulho do Centro de Panama City. Os mergulhadores eram apenas da Marinha, e não membros do Comando de Operações Especiais da América, cujas operações ocultas têm de ser comunicadas ao Congresso e informadas com antecedência ao Senado e à presidência da Câmara dos Representantes — o chamado Bando dos Oito. O governo Biden fez todos os possíveis para evitar fugas, uma vez que o planeamento teve lugar no final de 2021 e durante os primeiros meses de 2022.

O Presidente Biden e a sua equipa de política externa – o Conselheiro Nacional de Segurança Jake Sullivan, o Secretário de Estado Tony Blinken e Victoria Nuland, a Subsecretária de Estado para a Política Externa – têm sido eloquentes e consistentes na sua hostilidade contra os dois gasodutos, colocados lado a lado ao longo de cerca de 1350 km [750 milhas] no fundo do Mar Báltico, a partir de dois portos diferentes no nordeste da Rússia, perto da fronteira com a Estónia, passando perto da ilha dinamarquesa de Bornholm antes de terminarem no norte da Alemanha.

A rota directa, que contornou qualquer necessidade de atravessar a Ucrânia, foi uma bênção para a economia alemã, que desfrutava de uma abundância de gás natural russo barato — suficiente para fazer funcionar as fábricas e aquecer as casas, ao mesmo tempo que permitia aos distribuidores alemães vender o excesso de gás, com lucro, em toda a Europa Ocidental. Qualquer acção que pudesse ser rastreada até ao Governo Biden violaria as promessas dos EUA de minimizar o conflito directo com a Rússia. O segredo era, pois, essencial.

Logo desde o início, o Nord Stream 1 foi visto por Washington e pelos seus parceiros anti-russos da OTAN como uma ameaça ao domínio ocidental. A holding por detrás dela, a Nord Stream AG, foi constituída na Suíça em 2005 em parceria com a Gazprom, uma empresa russa cotada em bolsa que obtém lucros enormes para os accionistas e que é dominada por oligarcas conhecidos por serem “reféns” de Putin. A Gazprom controlava 51% da empresa, com quatro empresas energéticas europeias – uma em França, outra na Holanda e duas na Alemanha – partilhando os restantes 49% das acções, e tendo o direito de controlar as vendas a jusante do gás natural barato a distribuidores locais na Alemanha e na Europa Ocidental. Os lucros da Gazprom eram partilhados com o governo russo, e as estimativas apontam que as receitas estatais de gás e petróleo em alguns anos ascenderam a 45 por cento do orçamento anual da Rússia.

Os receios políticos da América eram reais: Putin teria agora uma importante fonte de rendimento adicional e muito necessária, e a Alemanha e o resto da Europa Ocidental ficariam viciados em gás natural barato fornecido pela Rússia — ao mesmo tempo que reduziam a dependência europeia da América. Na realidade, foi exactamente isso que aconteceu. Muitos alemães viram o Nord Stream 1 como parte da concretização da famosa teoria da Ostpolitik do antigo Chanceler Willy Brandt, que permitiria a reabilitação da Alemanha do pós-guerra e de outras nações europeias destruídas na Segunda Guerra Mundial com, entre outras iniciativas, a utilização do gás russo barato para alimentar um mercado e uma economia comercial prósperos na Europa Ocidental.

O Nord Stream 1 já era suficientemente perigoso, na opinião da OTAN [/NATO] e de Washington, mas o Nord Stream 2, cuja construção foi concluída em Setembro de 2021, iria, se aprovado pelos reguladores alemães, duplicar a quantidade de gás barato que estaria disponível para a Alemanha e a Europa Ocidental. O segundo gasoduto também forneceria gás suficiente para mais de 50% do consumo anual da Alemanha. As tensões entre a Rússia e a OTAN aumentavam constantemente, apoiadas pela agressiva política externa do Governo Biden.

A oposição ao Nord Stream 2 reacendeu-se na véspera da tomada de posse de Biden em Janeiro de 2021, quando os Republicanos do Senado, dirigidos por Ted Cruz do Texas, suscitaram repetidamente a ameaça política do gás natural russo barato durante a audiência de confirmação de Blinken como Secretário de Estado. Nessa altura, um Senado unificado tinha aprovado com sucesso uma lei que, como disse Cruz a Blinken, «suspendia o processo [do gasoduto]». Haveria uma enorme pressão política e económica por parte do governo alemão, então chefiado por Angela Merkel, para colocar em funcionamento o segundo gasoduto.

Iria Biden fazer frente aos alemães? Blinken disse que sim, mas acrescentou que não tinha discutido os pontos de vista específicos do novo Presidente. «Conheço a sua forte convicção de que o Nord Stream 2 se trata de uma má ideia», disse Blinken. «Sei que ele gostaria que usássemos todas as ferramentas persuasivas de que dispomos para convencer os nossos amigos e parceiros, incluindo a Alemanha, a não avançarem com ela

Alguns meses mais tarde, quando a construção do segundo gasoduto se aproximava do fim, Biden piscou os olhos. Em Maio, numa viragem incrível, o Governo Biden renunciou às sanções contra a Nord Stream AG, tendo um funcionário do Departamento de Estado admitido que tentar parar o gasoduto através de sanções e diplomacia fora «sempre um tiro no escuro». Nos bastidores, funcionários do Governo terão supostamente instado o Presidente ucraniano Volodymyr Zelensky, que enfrentava então uma ameaça de invasão russa, a não criticar a medida.

As consequências foram imediatas. Os Republicanos do Senado, chefiados por Cruz, anunciaram um bloqueio imediato de todos os nomeados para a política externa de Biden e atrasaram a aprovação da lei anual da Defesa durante meses, até finais do Outono. Mais tarde, o Politico descreveu a viragem de Biden no segundo gasoduto russo como «a única decisão que colocou em perigo a agenda de Biden, provavelmente mais do que a caótica retirada militar do Afeganistão

O governo Biden hesitava, apesar de ter obtido um adiamento da crise em meados de Novembro, quando os reguladores de energia da Alemanha suspenderam a aprovação do segundo gasoduto Nord Stream. Os preços do gás natural subiram 8% em poucos dias, no meio de receios cada vez maiores na Alemanha e na Europa de que a suspensão do gasoduto e a possibilidade crescente de uma guerra entre a Rússia e a Ucrânia levassem a um indesejado Inverno muito frio. Para Washington, não era clara a posição do recém-nomeado chanceler alemão Olaf Scholz. Meses antes, após a queda do Afeganistão, Scholtz tinha apoiado publicamente o apelo do Presidente francês Emmanuel Macron para uma política externa europeia mais autónoma num discurso em Praga — uma clara sugestão de menos confiança em Washington e nas suas acções imprevisíveis.

Ao longo de todo este processo, as tropas russas iam-se acumulando de forma constante e ameaçadora nas fronteiras da Ucrânia, e no final de Dezembro mais de 100.000 soldados estavam em posição de atacar a partir da Bielorrússia e da Crimeia. O alarme aumentava em Washington, incluindo uma avaliação de Blinken de que o número dessas tropas poderia «aumentar para o dobro a curto prazo

A atenção do Governo Biden centrou-se, mais uma vez, no Nord Stream. Enquanto a Europa permanecesse dependente dos gasodutos de gás natural barato, Washington receava que países como a Alemanha estivessem relutantes em fornecer à Ucrânia o dinheiro e as armas de que necessitava para derrotar a Rússia.

Foi neste momento de instabilidade que Biden autorizou Jake Sullivan a reunir um grupo interagências para elaborar um plano.

Todas as opções estavam em cima da mesa. Mas apenas uma surgiria.

PLANEAMENTO

Em Dezembro de 2021, dois meses antes dos primeiros tanques russos entrarem na Ucrânia, Jake Sullivan convocou uma reunião de um grupo de trabalho recentemente formado – homens e mulheres da Chefia do Estado-Maior Conjunto, da CIA e dos Departamentos de Estado e do Tesouro – e solicitou recomendações sobre como responder à iminente invasão de Putin.

Seria a primeira de uma série de reuniões ultra-secretas, numa sala segura num andar superior do antigo edifício do Gabinete Executivo, adjacente à Casa Branca, que era também a casa do Conselho Consultivo de Informações Externas do Presidente (PFIAB). As habituais conversas de ida e volta acabaram por conduzir a uma questão preliminar crucial: seria a recomendação transmitida pelo grupo ao Presidente reversível – como outro nível de sanções e restrições monetárias – ou irreversível – isto é, acções cinéticas, que não poderiam ser desfeitas?

O que ficou claro para os participantes, segundo uma fonte com conhecimento directo do processo, é que Sullivan pretendia que o grupo apresentasse um plano para a destruição dos dois gasodutos Nord Stream – e que estava a concretizar os desejos do Presidente.

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OS ACTORES. Da esquerda para a direita: Victoria Nuland, Anthony Blinken e Jake Sullivan.


 

Nas várias reuniões subsequentes, os participantes debateram opções para um ataque. A Marinha propôs a utilização de um submarino recentemente encomendado para atacar directamente o gasoduto. A Força Aérea sugeriu o lançamento de bombas com detonadores retardados que poderiam ser accionados remotamente. A CIA argumentou que o que quer que fosse feito, teria de ser encoberto. Todos os envolvidos compreenderam o que estava em jogo. «Isto não é coisa de crianças», disse a fonte. Se o ataque for rastreável até aos Estados Unidos, «é um acto de guerra

Na altura, a CIA era dirigida por William Burns, um antigo embaixador na Rússia, homem de temperamento suave que fora Secretário de Estado Adjunto no Governo Obama. Burns rapidamente autorizou um grupo de trabalho da Agência cujos membros ad hoc incluíam – por acaso – alguém que estava familiarizado com as capacidades dos mergulhadores de alto-mar da Marinha de Panama City. Ao longo das semanas seguintes, os membros do grupo de trabalho da CIA começaram a elaborar um plano para uma operação secreta que utilizaria mergulhadores de alto-mar para desencadear uma explosão no gasoduto.

Algo semelhante já tinha sido feito antes. Em 1971, a comunidade de informações americana teve conhecimento, a partir de fontes ainda desconhecidas, que duas importantes unidades da marinha russa estavam a comunicar através de um cabo submarino enterrado no Mar de Okhotsk, na costa do Extremo Oriente russo. O cabo ligava um comando regional da Marinha ao quartel-general continental em Vladivostok.

Uma equipa escolhida a dedo de agentes da Agência Central de Inteligência (CIA) e da Agência Nacional de Segurança (NSA) foi reunida algures na área de Washington, ao abrigo do maior segredo, e elaborou um plano, utilizando mergulhadores da Marinha, submarinos modificados e um veículo submarino de resgate profundo, que conseguiu, após muitas tentativas e erros, localizar o cabo russo. Os mergulhadores colocaram um sofisticado dispositivo de escuta no cabo que interceptou com sucesso o tráfego russo e o registou num sistema de gravação.

A NSA soube que oficiais superiores da marinha russa, convencidos da segurança da sua ligação de comunicação, conversavam com os seus pares sem qualquer encriptação. O dispositivo de gravação e a respectiva fita tinham de ser substituídos mensalmente e o projecto continuou alegremente durante uma década, até ser comprometido por um técnico civil da NSA de quarenta e quatro anos de nome Ronald Pelton, que era fluente em russo. Pelton foi traído por um desertor russo em 1985 e condenado a uma pena de prisão. Recebeu dos russos apenas 5000 USD [dólares americanos] pelas revelações sobre a operação acrescidos de 35 000 USD por outros dados operacionais russos que ele forneceu e que nunca foram tornados públicos.

Aquele sucesso submarino, com o nome de código Ivy Bells, foi inovador e arriscado, e permitiu obter informações inestimáveis sobre as intenções e o planeamento da Marinha russa.

Ainda assim, o grupo interagências foi inicialmente céptico em relação ao entusiasmo da CIA por um ataque encoberto em alto-mar. Havia demasiadas perguntas sem resposta. As águas do Mar Báltico eram fortemente patrulhadas pela marinha russa, e não havia plataformas petrolíferas que pudessem ser utilizadas como cobertura para uma operação de mergulho. Será que os mergulhadores teriam de ir à Estónia, do outro lado da fronteira mesmo em frente às instalações de carregamento do gás natural da Rússia, para treinar para a missão? «Seria uma coisa tramada», disseram à Agência.

Ao longo de «todo este esquema», referiu a fonte, «alguns tipos que trabalhavam na CIA e no Departamento de Estado disseram: “Não façam isso. É uma estupidez e será um pesadelo político quando se souber”.»

No entanto, no início de 2022, o grupo de trabalho da CIA apresentou um relatório ao grupo interagências de Sullivan: «Temos uma forma de fazer explodir os gasodutos

O que veio a seguir foi espantoso. A 7 de Fevereiro, menos de três semanas antes da aparentemente inevitável invasão russa da Ucrânia, Biden encontrou-se no seu gabinete da Casa Branca com o Chanceler alemão Olaf Scholz, que, depois de algumas oscilações, estava agora firmemente do lado da equipa americana. Na conferência de imprensa que se seguiu, Biden disse em tom de desafio, «Se a Rússia invadir… deixará de haver Nord Stream 2. Vamos acabar com ele

Vinte dias antes, a Subsecretária Nuland transmitira no essencial a mesma mensagem num briefing do Departamento de Estado, com pouca cobertura de imprensa. «Quero ser muito clara para vós hoje», disse ela em resposta a uma pergunta. «Se a Rússia invadir a Ucrânia, de uma forma ou de outra o Nord Stream 2 não irá para a frente

https://youtu.be/OS4O8rGRLf8

Alguns dos envolvidos no planeamento da missão do gasoduto ficaram consternados com o que consideraram como referências indirectas ao ataque.

«Foi como colocar uma bomba atómica no solo de Tóquio e dizer aos japoneses que a íamos detonar», disse a fonte. «O plano era que as opções fossem executadas após a invasão e não fossem anunciadas publicamente. Biden simplesmente não percebeu ou ignorou a recomendação

A indiscrição de Biden e Nuland, se é que foi isso, pode ter frustrado alguns dos planeadores. Mas também criou uma oportunidade. Segundo a fonte, alguns dos altos funcionários da CIA determinaram que fazer explodir o gasoduto «já não podia ser considerado uma opção encoberta porque o Presidente acabou de anunciar que sabíamos como o fazer.»

O plano para fazer explodir o Nord Stream 1 e 2 passou subitamente de uma operação secreta, exigindo que o Congresso fosse informado, para uma operação considerada como sendo de informação de segurança altamente classificada com o apoio militar dos EUA. Nos termos da lei, esclareceu a fonte: «Já não havia a obrigação legal de informar o Congresso sobre a operação. Tudo o que tinham de fazer agora era apenas executá-la – mas ainda assim tinha de ser secreta. Os russos exercem uma vigilância superlativa do Mar Báltico

Os membros do grupo de trabalho da Agência não tinham contacto directo com a Casa Branca, e estavam ansiosos por descobrir se o Presidente queria dizer o que disse — isto é, se a missão ia para a frente. A fonte recordou: «Bill Burns regressa e diz: “Vamos em frente”.»


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“A Marinha norueguesa foi rápida a encontrar o local certo, em águas pouco profundas a algumas milhas da ilha dinamarquesa de Bornholm…”


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A OPERAÇÃO 

A Noruega era o local perfeito para basear a missão.

Nos últimos anos da crise Leste-Oeste, as forças armadas americanas expandiram enormemente a sua presença no interior da Noruega, cuja fronteira ocidental se estende por mais de 2200 km [1400 milhas] ao longo do Atlântico Norte e se funde acima do Círculo Árctico com a Rússia. O Pentágono criou empregos e contratos altamente remunerados, no meio de alguma controvérsia local, ao investir centenas de milhões de dólares para modernizar e expandir as instalações da Marinha americana e da Força Aérea na Noruega. O mais importante é que as novas obras incluíram um avançado radar de abertura sintética muito a norte, capaz de penetrar nas profundezas da Rússia e que entrou ao serviço no momento em que a comunidade de inteligência americana perdia o acesso a uma série de locais de escuta de longo alcance dentro da China.

Uma base submarina americana recentemente remodelada, que estava em construção há anos, tornou-se operacional e mais submarinos americanos podiam agora trabalhar em estreita cooperação com os seus colegas noruegueses para monitorizar e espiar um importante reduto nuclear russo 400 km [250 milhas] a leste, na Península de Kola. A América também expandiu significativamente uma base aérea norueguesa no norte e entregou à Força Aérea norueguesa uma frota de aviões de patrulha Boeing P8 Poseidon para reforçar a espionagem de longo alcance sobre tudo o que se passava na Rússia.

Em troca, o governo norueguês enfureceu os liberais e alguns moderados no seu parlamento, em Novembro passado, ao aprovar o Acordo Suplementar de Cooperação em Matéria de Defesa (SDCA). Ao abrigo do novo Acordo, o sistema jurídico norte-americano teria jurisdição em certas “áreas acordadas no Norte em matéria de soldados americanos acusados de crimes fora da base, bem como de cidadãos noruegueses acusados ou suspeitos de interferirem com o trabalho na base.

A Noruega foi um dos signatários originais do Tratado da OTAN [/NATO] em 1949, nos primeiros dias da Guerra Fria. Hoje, o Secretário-geral da OTAN é Jens Stoltenberg, um anti-comunista fervoroso, que foi primeiro-ministro da Noruega durante oito anos antes de passar para o alto cargo na OTAN, com o apoio americano, em 2014. Stoltenberg foi um radical em tudo o que respeitasse a Putin e à Rússia, cooperou com a comunidade dos serviços secretos americanos desde a Guerra do Vietname. Desde então, tem sido de uma confiança total. «Ele é a luva que cabe na mão americana», disse a fonte.

De volta a Washington, os planeadores sabiam que tinham de ir para a Noruega. «Odiavam os russos, e a Marinha norueguesa estava cheia de excelentes marinheiros e mergulhadores que tinham uma experiência de gerações na exploração altamente lucrativa de petróleo e gás em alto-mar», disse a fonte. Também se podia confiar neles para manter o sigilo da missão. (Os noruegueses podem também ter tido outros interesses. A destruição do Nord Stream – se os norte-americanos conseguissem fazê-lo – permitiria à Noruega vender muito mais do seu próprio gás natural à Europa.)

Algures em Março, alguns membros da equipa voaram para a Noruega para se encontrarem com os Serviços Secretos e a Marinha norueguesa. Uma das questões-chave era a de saber qual seria exactamente o melhor local no Mar Báltico para colocar os explosivos. O Nord Stream 1 e 2, cada um com dois conjuntos de gasodutos, estavam separados por cerca de 2 km [pouco mais de 1 milha] no seu percurso em direcção ao porto de Greifswald, no extremo nordeste da Alemanha.

A Marinha norueguesa rapidamente encontrou o ponto certo, nas águas pouco profundas do mar Báltico, a poucos quilómetros da ilha dinamarquesa de Bornholm. Os gasodutos estavam separados por cerca de 2 km [pouco mais de 1 milha], assentes no fundo do mar a pouco mais de 80 m [260 pés] de profundidade. Tudo isto estaria bem dentro do alcance dos mergulhadores que, operando a partir de um caça-minas norueguês da classe Alta, mergulhariam com uma mistura de oxigénio, azoto e hélio a fluir das suas garrafas, e colocariam cargas C4 nos quatro gasodutos com coberturas protectoras de betão. Seria um trabalho fastidioso, demorado e perigoso, mas as águas ao largo de Bornholm tinham outra vantagem: não existiam grandes correntes de maré, o que dificultaria muito a tarefa dos mergulhadores.

Após alguma pesquisa, os americanos ficaram convencidos.

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Foi então que o obscuro grupo de mergulho profundo da Marinha em Panama City entrou mais uma vez em jogo. As escolas de mergulho profundo de Panama City, cujos estagiários participaram no Ivy Bells, são vistas como inofensivos indesejados pelos graduados de elite da Academia Naval em Annapolis, que normalmente procuram a glória de serem designados SEALS, pilotos de caça, ou submarinistas. Se alguém tem de passar a usar “sapatos pretos” – isto é, passar a ser membro do menos desejável comando de um navio de superfície – quanto mais não seja há sempre serviço num contratorpedeiro, cruzador ou navio anfíbio. A menos apetecível de todas é a guerra das minas. Os seus mergulhadores nunca entram em filmes de Hollywood, nem fazem capas de revistas populares.

«Os melhores mergulhadores com qualificações de mergulho profundo são uma comunidade restrita, e apenas os melhores são recrutados para a operação e instruídos para estarem preparados para serem convocados para a CIA em Washington», disse a fonte.

Noruegueses e americanos dispunham de um local e de operacionais, mas havia outro problema: qualquer actividade subaquática invulgar nas águas de Bornholm não deixaria de atrair a atenção das marinhas da Suécia e da Dinamarca, que podiam denunciá-la.

A Dinamarca também tinha sido um dos signatários originais da OTAN e era conhecida na comunidade dos serviços secretos pelos seus laços especiais com o Reino Unido. A Suécia tinha-se candidatado à adesão à OTAN, e demonstrara uma excelente habilidade na gestão dos seus sistemas de som e sensores magnéticos submarinos que rastreavam com sucesso os submarinos russos que ocasionalmente navegavam em águas remotas do arquipélago sueco e eram forçados a vir à superfície.

Os noruegueses juntaram-se aos americanos na insistência de que alguns altos funcionários da Dinamarca e da Suécia fossem informados em termos gerais sobre possíveis actividades de mergulho na área. Desta forma, alguma patente superior poderia intervir e manter um relatório fora da cadeia de comando, isolando assim a operação do gasoduto. «O que lhes foi dito e o que sabiam era propositadamente diferente», disse-me a fonte (a embaixada norueguesa, solicitada a comentar esta história, não respondeu.)

Os noruegueses foram decisivos para a resolução de outros obstáculos. A marinha russa era conhecida por possuir tecnologia de vigilância capaz de detectar, e accionar, minas submarinas. Os dispositivos explosivos americanos precisavam de ser camuflados de uma forma que fizesse com que o sistema russo os identificasse como parte do fundo natural — algo que exigia uma adaptação à salinidade específica da água. Os noruegueses tinham uma solução.

Os noruegueses também deram uma solução para a questão crucial de quando a operação deveria ter lugar. Todos os anos ao longo dos últimos 21 anos, em Junho, a Sexta Esquadra Americana, cujo navio almirante está baseado em Gaeta, Itália, a sul de Roma, tem patrocinado um importante exercício da OTAN no Mar Báltico, envolvendo dezenas de navios aliados em toda a região. O exercício deste ano, realizado em Junho, seria designado Baltic Operations 22, ou BALTOPS 22. Os noruegueses propuseram que esta seria a cobertura ideal para colocar as minas.

Os americanos apresentaram um elemento vital: convenceram os planeadores da Sexta Esquadra a acrescentar ao programa um exercício de investigação e desenvolvimento. O exercício, como foi tornado público pela Marinha, envolveu a Sexta Esquadra em colaboração com os “centros de investigação e guerra” da Marinha. O evento no mar decorreria ao largo da costa da Ilha de Bornholm e envolveria a colocação de minas por equipas de mergulhadores da OTAN, com equipas concorrentes a recorrerem à mais recente tecnologia subaquática para as encontrar e destruir.

Foi em simultâneo um exercício útil e uma cobertura engenhosa. Os rapazes de Panama City fariam o seu trabalho e os explosivos C4 seriam colocados no final do BALTOPS22, ligados a um temporizador de 48 horas. Americanos e noruegueses já teriam desaparecido há muito aquando da primeira explosão. 

O tempo estava em contagem decrescente. «O relógio estava a contar, e estávamos prestes a cumprir a missão», disse a fonte.

Mas foi então que Washington repensou a operação. As bombas seriam colocadas ainda durante o BALTOPS, mas a Casa Branca temia que uma janela de dois dias para a sua detonação estivesse demasiado próxima do fim do exercício, e o envolvimento da América seria óbvio.

Em vez disso, a Casa Branca reformulou o seu pedido: «Poderão os homens no terreno arranjar alguma forma de a ordem de rebentar os gasodutos ser dada mais tarde

Alguns membros da equipa de planeamento ficaram indignados e frustrados com a aparente indecisão do Presidente. Os mergulhadores de Panama City tinham praticado repetidamente a colocação de C4 em gasodutos, como fariam no decurso do BALTOPS, mas agora a equipa na Noruega tinha de arranjar uma forma de dar a Biden o que ele queria — a capacidade de emitir uma ordem de execução bem-sucedida num momento à sua escolha.

Ter de assumir uma missão com uma alteração arbitrária e de última hora era algo que a CIA estava habituada a gerir. Mas também renovou as preocupações partilhadas por alguns sobre a necessidade, e legalidade, de toda a operação.

As ordens secretas do Presidente também evocaram o dilema da CIA nos dias da Guerra do Vietname, quando o Presidente Johnson, confrontado com o crescente sentimento contra a Guerra, ordenou à Agência que violasse o seu estatuto – que a impedia especificamente de operar dentro da América – espiando os dirigentes antiguerra para verificar se estavam a ser controlados pela Rússia comunista.

A Agência acabou por aceitar, e ao longo dos anos 70 ficou claro até onde tinha estado disposta a ir. Houve revelações posteriores em jornais no rescaldo dos escândalos do Watergate sobre a espionagem da Agência a cidadãos americanos, o envolvimento no assassinato de dirigentes estrangeiros e o enfraquecimento do governo socialista de Salvador Allende.

Estas revelações levaram a um conjunto dramático de audiências em meados dos anos 1970 no Senado, dirigidas por Frank Church do Idaho, que deixaram claro que Richard Helms, o director da Agência na altura, aceitou que tinha a obrigação de fazer o que o Presidente quisesse, mesmo que isso significasse violar a lei.

Num testemunho à porta fechada e não publicado, Helms explicou penosamente que «quase se tem uma Imaculada Conceição quando se faz algo» sob ordens secretas de um Presidente. «Quer esteja certo que a tenha, ou errado que a tenha, [a CIA] trabalha sob regras e regras básicas diferentes das de qualquer outra parte do governo». No essencial o que disse aos senadores foi que ele, como chefe da CIA, compreendia que tinha estado a trabalhar para o Poder, e não para a Constituição.

Os americanos a trabalhar na Noruega operavam sob a mesma dinâmica, e começaram a trabalhar com zelo no novo problema — como detonar remotamente os explosivos C4 por ordem de Biden. Foi uma tarefa muito mais exigente do que julgavam os que estavam em Washington. Não havia maneira de a equipa na Noruega saber quando é que o Presidente poderia carregar no botão. Seria dentro de semanas, de meses ou de meio ano ou mais?

O C4 ligado às condutas seria accionado por uma bóia de sonar largada por um avião no último momento, mas o procedimento envolveu a mais avançada tecnologia de processamento de sinais. Uma vez no lugar, os dispositivos de temporização retardada ligados a qualquer umas das quatro condutas poderiam ser acidentalmente accionadas pela complexa mistura de ruídos oceânicos de fundo em todo o Mar Báltico fortemente movimentado – de navios próximos e distantes, perfuração submarina, eventos sísmicos, ondas e até criaturas marinhas. Para evitar isto, a bóia de sonar, uma vez instalada, emitiria uma sequência de sons de baixa frequência de tonalidade única – muito semelhantes aos emitidos por uma flauta ou um piano – que seriam reconhecidos pelo dispositivo de temporização e, após um conjunto de horas pré-definidas de atraso, accionariam os explosivos. («Querem um sinal suficientemente robusto para que nenhum outro sinal possa acidentalmente enviar um impulso que detone os explosivos», foi-me dito pelo Dr. Theodore Postol, professor emérito da Ciência, Tecnologia e Política de Segurança Nacional no MIT. Postol, que foi conselheiro científico do Chefe de Operações Navais do Pentágono, disse que a questão que o grupo enfrentava na Noruega devido ao atraso de Biden era uma questão de sorte: «Quanto mais tempo os explosivos permanecerem na água, maior será o risco de um sinal aleatório que accionar as bombas.»)

A 26 de Setembro de 2022, um avião de vigilância P8 da Marinha Norueguesa fez um voo aparentemente de rotina e largou uma bóia de sonar. O sinal propagou-se debaixo de água, inicialmente para o Nord Stream 2 e depois para o Nord Stream 1. Algumas horas mais tarde, os explosivos C4 de alta potência foram activados e três dos quatro gasodutos foram colocados fora de serviço. Em poucos minutos, foi possível ver bolsas de gás metano que ficaram nas condutas fechadas a espalharem-se à superfície da água e o mundo soube que algo irreversível tinha acontecido.

CONSEQUÊNCIAS

Na sequência imediata do bombardeamento do gasoduto, os meios de comunicação americanos trataram-no como um mistério sem solução. A Rússia foi repetidamente apontada como provável culpado, impelida por fugas calculadas da Casa Branca — mas sem nunca estabelecer um motivo claro para tal acto de auto-sabotagem, para além da simples retaliação. Alguns meses depois, quando se verificou que as autoridades russas tinham estado a receber calmamente estimativas dos custos de reparação dos gasodutos, o New York Times descreveu a notícia como «complicadas teorias sobre quem estava por detrás» do ataque. Nenhum grande jornal americano se debruçou sobre as anteriores ameaças aos gasodutos feitas por Biden e pela Subsecretária de Estado Nuland.

Embora nunca fosse claro por que razão a Rússia procuraria destruir o seu próprio gasoduto lucrativo, uma razão mais reveladora para a acção do Presidente veio do Secretário de Estado Blinken.

Questionado numa conferência de imprensa em Setembro passado sobre as consequências do agravamento da crise energética na Europa Ocidental, Blinken descreveu o momento como potencialmente bom:

«É uma excelente oportunidade para eliminar de uma vez por todas a dependência da energia russa e assim retirar a Vladimir Putin a arma da energia como meio de fazer avançar os seus desígnios imperiais. Isso é muito significativo e constitui uma grande oportunidade estratégica para os próximos anos, mas, entretanto, estamos decididos a fazer tudo o que pudermos para garantir que as consequências de tudo isto não sejam suportadas pelos cidadãos dos nossos países ou, aliás, de todo o mundo.»

Mais recentemente, Victoria Nuland expressou satisfação com o desaparecimento do mais recente dos gasodutos. Testemunhando numa audiência da Comissão de Relações Externas do Senado no final de Janeiro, disse ao Senador Ted Cruz: «Tal como vós, estou, e penso que o Governo está, muito satisfeita por saber que o Nord Stream 2 é agora, como gostais de dizer, um monte de sucata no fundo do mar.»

A fonte tinha uma visão muito mais corriqueira da decisão de Biden de sabotar mais de 2000 km [1500 milhas] de gasoduto Gazprom à medida que o Inverno se aproximava. «Bem», disse ele, falando do Presidente, «tenho de admitir que o tipo tem tomates. Disse que ia fazê-lo, e fê-lo.»

Questionado sobre o que pensava do facto de os russos não responderem, foi cínico: «Talvez eles queiram possuir a capacidade de fazer as mesmas coisas que os EUA fizeram».

«Foi uma bela história de capa», prosseguiu ele. «Por detrás dela estava uma operação encoberta que colocou peritos no terreno e equipamento que funcionou com um sinal encoberto. A única falha foi a decisão de a realizar

 

Fonte, aqui: https://seymourhersh.substack.com/p/how-america-took-out-the-nord-stream?utm_campaign=post&utm_medium=web

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Notas Editoriais sobre o autor e o tradutor do artigo

 

[*] Seymour [Myron] Hersh é um cidadão americano, autor de 11 livros e jornalista de investigação veterano, galardoado múltiplas vezes pelos seus trabalhos: Prémio Pulitzer de Reportagem Internacional (1970), George Polk Award (1969, 1973, 1974, 1981, 2004),  National Book Critics Circle Award (1983), National Magazine Award (2004, 2005).

Especializou-se em geopolítica, actividades ilícitas dos serviços secretos americanos e assuntos militares dos Estados Unidos da América. Entre os seus principais feitos jornalísticos, que lhe granjearam reconhecimento internacional, incluem-se:

# — a revelação do “morticínio de My Lai” (um crime hediondo cometido por tropas americanas contra a população civil da aldeia de My Lai, no Vietnam, em Novembro de 1969), o que lhe valeu o prémio Pulitzer de 1970.

# — a revelação dos bombardeamentos secretos do Cambodja feitos pelos EUA de Maio de 1969 a Maio de 1970.

 # — a revelação do “projecto Jennifer” (uma tentativa de resgate dos destroços do submarino soviético K-129 promovida pela CIA em 1969, visando recuperar, em proveito dos Estados Unidos, dados e tecnologias soviéticas).

# — a revelação da Operação CAOS, um projecto de espionagem doméstica e de outras actividades ilegais da CIA contra cidadãos americanos, organizações anti-guerra e outros movimentos políticos de oposição, nos EUA,  de 1967 a 1974, da qual resultou a demissão de James Jesus Angleton, chefe da contra-espionagem da CIA.

# — a revelação da existência do “Office of Special Plans” (OSP) [Gabinete dos Planos Especiais] do Departamento de Defesa dos EUA, em 2004.

# — a revelação das torturas de prisioneiros na prisão iraquiana de Abu Ghraib infligidas por militares dos EUA e agentes da CIA, em 2004.

# — a revelação dos verdadeiros autores do ataque químico de Goutha (Síria) que matou centenas de civis com gás sarin em Agosto de 2013, falsamente atribuído ao governo de Bashar Al-Assad.

 

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[**] Fernando Oliveira é um cidadão português, engenheiro químico e tradutor de conferência.

Esta sua tradução do artigo de Seymour Hersh que aqui publico com a devida vénia e um forte abraço é encarada por ele (e também por mim) como um serviço pro bono prestado ao público leitor português ou de língua portuguesa que não quer ficar dependente da propaganda, omissões selectivas e desinformação veiculadas em doses cavalares pelo sistema mediático oligopolista de comunicação social (SMOCS) do chamado “Ocidente alargado”.

O SMOCS é constituído pelos jornais e revistas mundanas de grande circulação (incluindo os jornais e revistas ditos de referência); pelos canais de televisão e emissoras de rádio de grande audiência; pelas agências noticiosas globais mais importantes [Associated Press (AP), Agence France Press (AFP), Reuters, Agencia EFE, Deutsche Presse-Agentur (DPA)]; e pelas grandes agências de comunicação estratégica [e.g., Bellingcat, Coda Media, Hill & Knowlton Strategies, National Endowment for Democracy].

Na sua tradução, Fernando Oliveira seguiu a ortografia anterior ao [Des]Acordo Ortográfico de 1990 — uma opção que é também a deste blogue. Editei ligeiramente o texto para o adequar às normas tipográficas e estilísticas da Tertúlia Orwelliana. J.C.S