Temas 2 e 3
Uma pseudo “Cimeira
para a Paz na Ucrânia”
promovida e realizada
por
um pseudo “país
neutral”
José Catarino Soares
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Índice
1. Os resultados da cimeira
de Bürgenstock
2. Avaliação dos resultados
da cimeira de Bürgenstock
2.1. Marcelo Rebelo de Sousa
2.2. Os factos mais importantes
2.3. Zelensky e o acordo de Istambul
2.4. A Suíça: da neutralidade permanente ao
seguidismo punitivo casuístico
2.4.1.
A neutralidade permanente nos primeiros três séculos
2.4.2. 1948-1990:
Maria-vai-com-as-outras
2.4.3. O abandono da neutralidade
permanente
2.4.4. A Suíça esmera-se na hostilidade
contra a Rússia
3. Bons ofícios e “maus
ofícios”
4. Os verdadeiros
objectivos da cimeira de Bürgenstock
4.1. A Paz de Zelensky
4.2. O caminho para “a paz de Zelensky”
4.3. Amparar um usurpador
Em 15 e 16 de Junho de 2024, na estância turística de luxo de Bürgenstock, na cidade suíça de Lucerna, realizou-se uma denominada “Cimeira para a Paz na Ucrânia”, promovida e organizada pelo Conselho Federal da Suíça, o seu governo.
“Foto de família” da cimeira de Bürgenstock. Foto: FDFA, Switzerland. |
1. Os resultados da cimeira de Bürgenstock
Existem 195 Estados representados na ONU, dois dos quais
(Vaticano e Palestina) com o estatuto de observadores. Destes, 160 foram
convidados para a cimeira. Estiveram presentes apenas 92 (47% dos Estados membros
da ONU e 57% dos Estados convidados).
Dos 92 Estados presentes, 78 fizeram-se representar ao mais alto nível (foi o caso de Portugal, que se fez representar pelo presidente da república e pelo ministro dos Negócios Estrangeiros), os outros 18 não. O primeiro grupo era constituído, na sua maioria, pelos Estados do chamado “Ocidente alargado” ‒ incluindo os 27 Estados-membros da União Europeia (UE), os EUA, o Reino Unido, o Japão, a Coreia do Sul, a Austrália e a Nova-Zelândia ‒ que são, com duas excepções (Hungria e Eslováquia), aliados de primeira linha do regime ucraniano.
Dos 92 países presentes na cimeira, 79 (incluindo Portugal) assinaram o comunicado conjunto final e 13 recusaram-se a fazê-lo: Índia, Brasil, África do Sul, México, Indonésia, Arábia Saudita, Arménia, Tailândia, Colômbia, Barém, Emirados Árabes Unidos, Suriname, Líbia. Isto sucedeu apesar do comunicado ser uma versão muito aligeirada das exigências de Quieve — o “plano de paz” em 10 pontos apresentado por Volodymyr Zelensky em 15 de Novembro de 2022, durante a reunião do G7 em Bali.
Os 10 pontos foram reduzidos a três: “segurança alimentar” (entenda-se: a possibilidade da Ucrânia
continuar a exportar cerais); “segurança
nuclear” (entenda-se: a retirada das tropas russas do território da central
nuclear de Zaporíjia, em Enerhodar, no oblast de Zaporíjia, e a
transferência do seu controlo para a Ucrânia), e “prisioneiros e deportados” (entenda-se: o “regresso a penates” de milhares de crianças ucranianas alegadamente
levadas para a Rússia sem o consentimento dos pais e encarregados de educação e
a “libertação” de milhares de cidadãos ucranianos alegadamente retidos à força nos
territórios da República Popular de Lugansk [RPL] e da República Popular de
Donestsk [RPD] e nos oblasti de Zaporíjia e Quérson, incorporados na Federação
Russa por via de referendos realizados em 23-27 de Setembro de 2022).
2. Avaliação dos resultados da cimeira de Bürgenstock
Com base nestes factos (número e identidade dos Estados presentes na cimeira e número e identidade dos que assinaram o seu comunicado final conjunto), o presidente da república portuguesa, Marcelo Rebelo de Sousa, emitiu a sua opinião. No domingo, dia 16 de Junho, anunciou o que iria dizer nesse mesmo dia na sua intervenção na cimeira:
«Vou dizer por que é que acho que esta cimeira ‒ contra muitas previsões ‒ foi um sucesso» (Rádio Renascença, 16 de Junho de 2024).
A seguir à cimeira declarou que ela
«foi um sucesso pela sua representatividade» e que “é imparável esta via, este caminho, este passo que foi dado hoje» (Lusa, 16 de Junho de 2024).
Cimeira de Bürgenstock. Foto de URS/FLUEELER/POOL/AFP via Getty Images. |
2.1. Marcelo Rebelo de Sousa
É impossível acompanhar Marcelo Rebelo de Sousa nesta avaliação, porque uma cimeira que pretende fazer a paz entre a Ucrânia e a Rússia começando por excluir um dos beligerantes (ainda por cima, o beligerante que está económica, social e militarmente na mó de cima, a Rússia) nunca pode ser considerada um “sucesso”. É, antes, um motivo de escárnio e risota.
A não ser, bem entendido, que os objectivos da cimeira de Bürgenstock nunca tivessem sido alcançar a paz. Nesse caso, a apreciação de Marcelo Rebelo de Sousa perde o seu carácter aparentemente lunático para ganhar um novo sentido. Voltaremos a esta questão na secção 4.
2.2. Os factos mais importantes
Para já, convém identificar quais são os factos mais importantes relativamente a esta Cimeira que cumpre destacar, porque nenhum deles consta do comunicado final conjunto que a maioria dos seus participantes aprovaram. São os quatro factos seguintes (que vou numerar com letras maiúsculas para facilitar referências futuras ao seu conteúdo).
A) A ausência da Rússia, não por opção, mas porque não foi convidada pelos organizadores da Cimeira.
B) A ausência da China, por opção, muito possivelmente em solidariedade com a Rússia, por esta não ter sido convidada.
C) A organização da Cimeira por um Estado, a Suíça, que proclama ser permanentemente neutral por lei ‒ e que o foi realmente durante centenas de anos e até muito recentemente ‒ mas que deixou, em grande medida, de o ser, em palavras e na prática, desde 1993.
D) A atitude comum de todos os 79 Estados (Portugal incluído) que assinaram o comunicado conjunto final de fingirem desconhecer:
― (D.1.) a existência e o teor do Acordo de Paz ultimado e rubricado entre a Ucrânia e a Rússia na segunda quinzena de Março/primeira quinzena de Abril de 2022, em Istambul;
― (D.2.) as razões que levaram Zelensky a repudiar esse acordo imediatamente a seguir à visita-surpresa que Boris Johnson (à época primeiro-ministro do Reino Unido) fez a Kiev em 9 de Abril de 2022.
O facto A é bem conhecido, mas o seu significado só pode ser compreendido em relação com o facto D.
2.3. Zelensky e o acordo de Istambul
Volodymyr Zelensky explicitou as razões pelas quais a Rússia não foi convidada para a cimeira na Suíça:
«A Rússia não está preparada para uma paz justa. Temos de fazer o nosso trabalho, não vamos pensar na Rússia, vamos fazer o que temos de fazer. Neste momento, a Rússia e os seus dirigentes não estão preparados para uma paz justa. É um facto» [1].
O que é um facto é que Zelensky mente com quantos dentes tem na boca. Há pouco
mais de dois anos, ele próprio foi um dos protagonistas principais de uma “paz
justa” que foi acordada em Istambul entre a Ucrânia e a Rússia. Mais,
sabemos ⎼ através de
múltiplas fontes insuspeitas de qualquer simpatia pela Rússia (The Telegraph,
Ukrayinska Pravda, Berliner Zeitung, Wall Street Journal, Die
Welt, Figaro, New York Times, entre outras), dos testemunhos
directos de Naftali Bennett (ex-primeiro-ministro de Israel) e Gerhard Schröeder
(ex-chanceler da Alemanha), que foram ambos mediadores das negociações
conducentes a esses acordos, e dos testemunhos directos de alguns dos membros
da delegação ucraniana que participou nessas negociações (Davyd Arakhamia,
Oleksandr Chaliy, Oleksiy Arestovych) ⎼ que o
Acordo de Istambul era muito favorável à Ucrânia.
Os pontos principais desse acordo eram os seguintes:
As tropas russas retirar-se-iam do território ucraniano e, em contrapartida, a Ucrânia
― (i) declarava a sua neutralidade militar, com a concomitante renúncia à sua intenção [a] de aderir à OTAN (/NATO); [b] de instalar armas nucleares, de fabrico próprio ou alheio, em território ucraniano; [c] de acolher bases militares e/ou tropas estrangeiras no seu território, obtendo em contrapartida [d] garantias de segurança por parte do conjunto de Estados-membros do Conselho de Segurança da ONU (EUA, Reino Unido, França, China, Rússia) e, eventualmente também, de outros Estados como, por exemplo, a Turquia (do agrado da Ucrânia) e a Bielorrússia (do agrado da Rússia);
― (ii) reconhecia, de uma vez por todas, a Crimeia como uma república autónoma da Federação Russa [2];
― (iii) garantia o respeito pela autonomia política, cultural e administrativa da RPL e da RPD no quadro de uma solução negociada semelhante, por exemplo, à do Tirol do Sul;
― (iv) garantia o respeito pelos direitos linguísticos e culturais das demais populações russófonas e russófilas da Ucrânia.
O New York Times, na sua edição de 15 de Junho de 2024, veio confirmar o que já se sabia há muitos meses e, nalguns aspectos, há mais de 2 anos.
A manchete do New York Times de 15 de Junho de 2024 diz: “A Paz entre a Ucrânia e a Rússia nunca esteve tão fugidia. Mas em 2022 elas estavam a conversar uma com a outra”. |
Fê-lo ao publicar a versão preliminar (da autoria da delegação de negociadores da Ucrânia) do Acordo de Paz entre a Ucrânia e a Rússia, de 15 de Março de 2022, apresentado nas negociações de paz em Istambul; o comunicado conjunto (da autoria das duas delegações: Ucrânia e Rússia) sobre as “Disposições principais para o Tratado de Garantias de Segurança da Ucrânia” de 28 de Março de 2022; e o “Tratado de Neutralidade Permanente e Garantias de Segurança” de 15 de Abril de 2022, redigido, finalizado e rubricado na mesma cidade turca por ambas as delegações.
O que o New York Times não diz aos seus leitores (e veremos mais adiante porquê) é a razão pela qual Zelensky acabou por repudiar esse Tratado de Paz que os negociadores ucranianos, cumprindo instruções suas, tinham laboriosamente construído com os negociadores russos, primeiro em Minsk (no fim de Fevereiro de 2022, logo no início da “Operação Militar Especial” [OME] da Rússia) e depois em Istambul (na segunda quinzena de Março de 2022 e na primeira quinzena de Abril de 2022).
Mas isso não é segredo para ninguém. Como já tive ocasião de o lembrar em artigos anteriores [3], Zelensky rompeu as negociações e repudiou o acordo que tinha feito com o governo da Rússia para fazer a vontade aos EUA, ao Reino Unido, à Alemanha e à França, cujos governantes se puseram de acordo para enviar a Quieve, como seu mensageiro, numa visita-surpresa que teve lugar em 9 de Abril de 2022, o senhor Boris Johnson, à época primeiro-ministro do Reino Unido.
Segundo relatou o jornal ucraniano Ukrayinska Pravda na sua edição de 5 de Maio de 2022, a mensagem que Boris Johnson, no duplo papel de deus Mercúrio e de demónio Mefistófeles, levou a Zelensky foi muito simples e clara e pode ser resumida assim:
«Se o senhor fizer um acordo com Putin, nós nunca mais ajudaremos a Ucrânia em nada. Fica por sua conta. Se, pelo contrário, o senhor se dispuser a combater a Rússia para a enfraquecer e derrotar, custe o que custar, pode contar com o apoio total dos nossos Estados e de todo o “Ocidente alargado”».
18 meses depois, o senhor Davyd Arakhamia ⎼ chefe do grupo parlamentar do partido Servente do Povo (o partido criado por Zelensky), maioritário no parlamento ucraniano, e chefe da delegação de negociadores com a Rússia ‒ deu uma entrevista ao canal de televisão ucraniano 1+1, durante a qual corroborou inteiramente o relato feito um ano e meio antes pelo Ukrayinska Pravda. As declarações de Arakhamia foram, de resto, reproduzidas pelo mesmo jornal, na sua edição inglesa, em 24 de Novembro de 2023.
Em suma, Zelensky escolheu sacrificar o seu povo e o seu país para servir os desígnios do “Ocidente alargado”. Para esconder o pacto Faustiano que fez com Boris Johnson e a sua súcia (Biden, Scholz, Macron) e encobrir as suas terríveis consequências para o seu povo e o seu país, Zelensky chegou ao cúmulo de fazer um decreto ‒ o decreto presidencial n.º 670/2022, de 30 de Setembro de 2022 ‒ em que proíbe (a si próprio!) entabular novas negociações de paz com a Rússia enquanto Putin estiver no poder... Como se Putin fosse o culpado da sua ignominiosa traição aos interesses do seu povo e do seu país!
Zelensky na cimeira de Bürgenstock (15-16 de Junho de 2024) |
Como Zelensky tem agora as mãos manchadas de sangue das centenas de milhares de soldados seus compatriotas que, entretanto, morreram ou ficaram estropiados em combate em resultado da sua decisão insana de continuar uma guerra cujo início poderia ter facilmente evitado (se tivesse cumprido os acordos de Minsk), cuja continuação poderia ter facilmente evitado logo nas suas primeiras semanas (se não tivesse repudiado o acordo que fez em Istambul) e que nunca poderá ganhar, tem de mentir despudoradamente, constantemente, acusando a Rússia de “não estar preparada para uma paz justa”. E todos os Estados membros da OTAN e da UE que subscreveram o comunicado conjunto final da cimeira na Suíça têm de fingir o mesmo, pelas mesmas razões. Nenhum deles quer perder a face, admitindo a responsabilidade que têm na situação de descalabro em que se encontra actualmente a Ucrânia.
Quanto ao New York Times, não quer naturalmente fazer nada que possa denegrir este festival de hipocrisia multilateral [4].
2.4. A Suíça: da neutralidade permanente ao seguidismo punitivo casuístico
Resta-me fundamentar o facto C, antes de avançar em direcção à conclusão.
2.4.1. A neutralidade permanente nos primeiros três séculos
A Suíça viu reconhecida a sua independência como Estado pelos Tratados que estabeleceram a Paz de Vestefália, em 1648. É também um Estado neutral desde longa data. A neutralidade da Suíça foi estabelecida, inicialmente, por vontade própria do seu parlamento (a Dieta da Confederação Suíça), em 1674, quando a França invadiu o Franco-Condado. A Dieta da Confederação Suíça tornou a estabelecer a neutralidade da Suíça em 1813, depois da Suíça ter recuperado a sua independência após a invasão da França em 1798. Em 1815, no Congresso de Viena, a neutralidade da Suíça foi também reafirmada por imposição e conveniência das potências europeias que fizeram frente à França de Napoleão Bonaparte: Rússia (que desempenhou o papel mais importante nessa decisão), Grã-Bretanha, Prússia, Áustria.
A Conferência de Paz realizada em Haia em 1907 constituiu um marco fundamental na definição e instituição da neutralidade permanente de um Estado no direito internacional público. O direito internacional público relativo à neutralidade dos Estados foi aí codificado em duas Convenções ‒ a 5.ª (relativa à guerra terrestre) e a 8.ª (relativa à guerra marítima) ‒ que a Suíça aprovou em 1907 e ratificou em 1910.
Essas duas convenções continuam a ser, até aos dias de hoje, as duas mais importantes fontes legais do direito internacional público sobre a neutralidade dos Estados. Durante a 1.ª Guerra Mundial e durante a 2.ª Guerra Mundial (nesta, porém, com muitas entorses na prática a favor dos EUA) a Suíça manteve-se fiel, oficialmente, ao seu estatuto de Estado adepto da neutralidade permanente por autodeterminação legal. Mas tudo começou a mudar depois da 2.ª Guerra mundial e, sobretudo, depois do fim da Guerra Fria.
2.4.2. 1948-1990: Maria-vai-com-as-outras
Em 1951, por exemplo, a Suíça cedeu à pressão dos EUA para participar secretamente na política das impropriamente chamadas “sanções económicas” [5] (na ocorrência o embargo sobre a exportação de muitas espécies de mercadorias suíças) para os 17 Estados do Leste da Europa membros do CAEM (Conselho de Auxílio Económico Mútuo) — uma organização de entreajuda económica criada pela União Soviética, em 1949, como resposta ao Plano Marshall para a Europa Ocidental criado pelos EUA em 1947.
A partir dos anos 1960, a Suíça afastou-se gradualmente do entendimento da neutralidade permanente que cultivara antes das (e durante as) duas guerras mundiais. De permanente, a sua neutralidade passou a ser casuística e de baseada no direito internacional público passou a ser baseada numa avaliação política ad hoc das conjunturas. Para isso, muito contribuiu a sua adesão a organizações pretensamente supranacionais como o Conselho da Europa (em 1963), a CSCE (em 1973) [a CSCE, Conferência de Segurança e Cooperação na Europa, mudou o “C” inicial para “O” de “organização”, em 1995], e a ONU (em 2002).
Mas o ponto de viragem foram os anos 1989-1991: queda do muro de Berlim, reunificação da Alemanha, fim da “Guerra Fria”, dissolução da União Soviética. Estes acontecimentos em catadupa deram origem ao que Charles Krauthammer denominou, logo em 1 de Janeiro de 1990, “o momento unipolar” — ou seja, o momento em que a elite dirigente dos EUA tomou consciência de que os EUA tinham atingido o auge da sua supremacia absoluta (económica, militar, política, tecnológica, cultural) sobre todos os Estados do planeta, e de que poderiam doravante reinar sem entraves num “mundo unipolar”, um mundo onde seriam os únicos a ditar as regras. É o significado da sua expressão favorita: uma “ordem internacional baseada em regras” (ing. “international rule-based order”) e já não baseada no direito internacional público, incluindo a Carta da ONU.
A primeira machadada no estatuto de neutralidade permanente da Suíça ocorreu logo em 1990. Nesse ano, o Conselho de Segurança da ONU decretou “sanções económicas” contra o Iraque, por este ter invadido o Kuwait. O Conselho Federal da Suíça decidiu então, pela primeira vez na história desse país, adoptar essas sanções não-militares. Mais: esta machadada no estatuto de neutralidade permanente da Suíça foi desferida apesar da Suíça não fazer sequer parte da ONU nessa época (!), o que só viria a acontecer doze anos mais tarde.
2.4.3. O abandono da neutralidade permanente
Para justificar este flagrante atentado contra o estatuto de neutralidade permanente, o Conselho Federal da Suíça produziu subsequentemente (1993) um “Livro Branco”. O Livro Branco de 1993 [6] definiu os seguintes parâmetros (P) [a numeração foi acrescentada por mim]:
― P.1. Excepções à neutralidade permanente. A neutralidade permanente não se aplica às medidas coercivas, militares ou económicas, impostas contra os Estados pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas.
― P.2. Adopção autónoma das medidas coercivas não-militares da ONU e permissão para participar também nas medidas coercivas militares. O Livro Branco do Conselho Federal concluiu, por conseguinte, que a Suíça apoiaria a ONU e participaria autonomamente em medidas coercivas não militares e, em especial, nas chamadas “sanções” económicas. Relativamente a casos específicos, a Suíça teria também de avaliar, em circunstâncias particulares, se estaria disposta a apoiar as medidas coercivas militares da ONU, por exemplo, concedendo direitos de sobrevoo sobre o seu território.
― P.3. Participação em sanções não impostas pelas Nações Unidas. O Livro Branco do Conselho Federal declarou igualmente que as sanções não impostas pela ONU podem igualmente servir para restabelecer a ordem e a paz e que, por conseguinte, a Suíça pode participar em sanções económicas impostas fora do sistema das Nações Unidas. O Livro Branco do Conselho Federal observou que as decisões serão tomadas caso a caso, após ponderação de todas as questões envolvidas.
― P.4. A neutralidade permanente não constitui um obstáculo à adesão da Suíça à União Europeia (UE). O Livro Branco do Conselho Federal determinou que, do ponto de vista jurídico, a adesão à União Europeia permitiria à Suíça manter a sua neutralidade, uma vez que os membros da UE não eram obrigados a prestar assistência militar. Além disso, o Livro Branco do Conselho Federal salientou que a política externa e de segurança comum da UE ainda não está totalmente desenvolvida. O Livro Branco do Conselho Federal observou na altura que a Suíça devia estar preparada para reconsiderar fundamentalmente a sua neutralidade no caso de a UE atingir o seu objetivo de criar uma estrutura de defesa firme e permanente e de a Suíça aspirar a participar nessa estrutura.
― P.5. Bons ofícios. O Conselho Federal observou no Livro Branco que, a par da função mais passiva da neutralidade permanente suíça, a Suíça contribuía activamente, desde há muito, para os esforços de paz através da prestação de bons ofícios, «conferindo uma função quase universal à sua neutralidade». No entanto, salientou também que a Suíça era agora menos frequentemente solicitada a prestar os seus bons ofícios, principalmente porque as organizações supranacionais estavam a ganhar maior proeminência. Por conseguinte, o Conselho Federal concluiu que, para continuar a apoiar os esforços de manutenção da paz, era necessário que a Suíça alargasse e desenvolvesse os seus bons ofícios.
― P.6. Cooperação e participação. O Livro Branco do Conselho Federal da Suíça asseverou que a neutralidade permanente deve ser apoiada por uma «solidariedade abrangente, pela cooperação e participação global e regional» como a melhor forma de servir os interesses da Suíça. Por conseguinte, sublinhou, parece apropriado que a Suíça abandone a sua posição restritiva do passado e aumente a sua cooperação com outros Estados [7].
Nos últimos 30 anos, o Conselho Federal da Suíça abandonou a posição tradicional da Suíça de neutralidade permanente baseada no direito internacional público para adoptar, em seu lugar, uma forma de seguidismo punitivo casuístico (entenda-se: um sucedâneo da neutralidade aplicado em função de situações específicas avaliadas caso-a-caso) com base nas directivas do Livro Branco de 1993. Dito de maneira eufemística:
«Em cada caso, o Conselho Federal teve devidamente em conta o contexto global e as características específicas do conflito em causa e tomou decisões em conformidade» [8].
Foi assim que, por exemplo, a Suíça apoiou as “sanções” que a UE decretou contra a República Federal da Jugoslávia, em Março de 1999; apoiou as “sanções” que o Conselho de Segurança da ONU decretou contra o Irão, em 2006; apoiou algumas das “sanções” que a UE decretou contra o Irão em 2010; apoiou as medidas coercivas militares decretadas pelo Conselho de Segurança da ONU contra a Líbia, em 2011; apoiou as “sanções” decretadas pela UE contra a Síria, em 2011; apoiou as “sanções” decretadas pela UE contra a Rússia, em 2014.
2.4.4. A Suíça esmera-se na hostilidade contra a Rússia
Em 28 de Fevereiro de 2024, o Conselho Federal da Suíça apoiou
as primeiras “sanções” decretadas pela UE contra a Rússia.
……………………………………………………………………………...
A manchete da Reuters de 16 de Maio de 2022 diz: “A Suíça neutral aproxima-se mais da OTAN (/NATO) em resposta à Rússia”. |
Ulteriormente, a Suíça aprovou todas as “sanções” decretadas pela UE contra a Rússia, salvo a proibição, no espaço da UE, de difundir e publicar notícias e outros conteúdos por parte de órgãos mediáticos de comunicação social russos, como a estação de televisão RT (e as suas seis filiais), a agência de notícias e emissora de rádio Sputnik, assim como mais sete órgãos mediáticos de comunicação social russos. A Suíça permitiu, inclusive, que firmas de armamento da UE e do Reino Unido reexportassem para a Ucrânia material de guerra suíço, adquirido na Suíça, desde que a reexportação fosse feita através de países terceiros.
O gráfico seguinte é esclarecedor. Em Dezembro de 2023, a “neutral” Suíça era o Estado que maior número de “sanções” tinha decretado contra a Rússia, à frente da UE e dos EUA!
3. Bons ofícios
e “maus ofícios”
Tendo abandonado há muitos anos, tanto nas palavras como nos actos, a neutralidade permanente baseada no direito internacional público, só resta à Suíça afivelar uma máscara de bonomia e moderação recorrendo à única coisa que resta do seu passado de Estado neutral: os “bons ofícios”.
Mas os “bons ofícios” só funcionam se o Estado que os emprega tiver uma sólida reputação de seriedade comportamental e (pelo menos) de isenção relativamente ao litígio que pretende, com a sua mediação, ajudar a resolver. Ora, a Suíça destruiu completamente a sua credibilidade nestes aspectos com a sua consistente duplicidade comportamental: afirmar que é neutral, por um lado, e tomar partido por um dos lados de um conflito, por outro.
É essa reputação arruinada de neutralidade e o facto A referido na secção 2.3 que explicam que 47 % dos Estados convidados não tenham respondido ao seu convite para participar na cimeira de Bürgenstock. Os “bons ofícios” da Suíça de outrora são, actualmente, um seu activo tóxico, porque se converteram em “maus ofícios”.
4. Os verdadeiros objectivos da cimeira de Bürgenstock
Mas, se tudo o que foi dito até agora é conforme à verdade, como julgo ter conseguido provar, quais foram, então, os objectivos da cimeira de Bürgenstock?
4.1. A Paz de Zelensky
Foram dois. O primeiro foi exposto, candidamente, por duas pessoas insuspeitas de qualquer simpatia pela Rússia, bem pelo contrário: uma comentadora de política internacional na CNN-Portugal e o secretário-geral da OTAN (/NATO).
«A Cimeira foi para advogar a paz de Zelensky e não para contar com a presença da Rússia» (Sónia Sénica, CNN-Portugal, 16 de Junho de 2024).
A “paz de Zelensky” consiste em restabelecer a situação que existia na Ucrânia na primeira semana a seguir
— (i) ao golpe de Estado sangrento de Maidan (em Quieve), em 22 de Fevereiro de 2014;
― (ii) ao derrube inconstitucional do presidente da Ucrânia livremente eleito, Víktor Ianukóvytch;
― (iii) à instalação no poder de um governo provisório constituído pelos partidos golpistas (Oudar, Pátria e Svoboda), chefiado por um primeiro-ministro, Arseniy Yatsenyuk, escolhido por Victoria Nuland [9] — à época subsecretária de Estado para os Assuntos Europeus e Euroasiáticos do ministério dos Negócios Estrangeiros dos EUA no governo de Barak Obama;
― (iv) à revogação, pelos golpistas, da Lei Kivalov-Kolesnichenko que garantia o uso da língua russa como língua oficial regional em 13 dos 24 oblasti da Ucrânia — ou seja, nos oblasti do Leste (na região da bacia hidrográfica do rio Donets, conhecida por Donbass) e do Sul da Ucrânia, onde a população é, na sua grande maioria, etnicamente russa, russófona e também, em grande percentagem, russófila.
Compreende-se porquê. Nessa época, ninguém no poder golpista ucraniano tinha sequer imaginado que teria de enfrentar, a muito breve trecho, a rebelião e a insurreição das populações russas, russófonas e russófilas dos 13 oblasti supramencionados da Ucrânia e da República da Crimeia contra os crimes enunciados em (i), (ii), (iii), (iv) e contra a anexação ilegal da Crimeia pela Ucrânia em 17 de Março de 1995 [10] — rebelião e insurreição de que resultaram a instituição, decidida por via referendária, da RPD e da RPL (em Maio de 2014), na Donbass, e a adesão, decidida por via referendária, da República da Crimeia à Federação Russa (em Março de 2014).
Não vale a pena, julgo eu, gastar tempo a mostrar que a “paz de Zelensky” (ou, o que vem a ser o mesmo, o regresso da Ucrânia à configuração territorial que ela tinha em 29 de Fevereiro de 2014) está totalmente fora de questão.
Se a Ucrânia tivesse honrado o acordo de Istambul de Março/Abril de 2022, ter-lhe-ia sido possível acomodar a RPL, a RPD, assim como os oblasti de Quérson e Zaporíjia, numa solução autonómica semelhante à do Tirol do Sul. Bem entendido, essa possibilidade ‒ que era, então, bem real ‒ dependeria, para se materializar, da vontade livremente expressa da população desses territórios por via referendária. Mas a Ucrânia perdeu definitivamente essa oportunidade nos dias 23 a 27 de Setembro de 2022, quando as populações desses quatro territórios decidiram, por via referendária, integrar-se na Federação Russa.
Não se trata apenas de uma questão de legalidade constitucional. É também uma questão de sentimentos caldeados numa longa e variada experiência emocional. Os tormentos por que passaram (e ainda passam) as populações russas, russófonas e russófilas desses territórios e o sangue que verteram em defesa das suas bandeiras políticas, económicas e culturais durante 8 anos de pesadelo (2014-2022), afastaram definitivamente a possibilidade de quererem voltar a ser parte da Ucrânia.
O caso da Crimeia é diferente, porque esta região nunca pertenceu à Ucrânia [10]. Por isso, não se põe sequer a questão de saber se a sua incorporação na Rússia afecta a integridade territorial da Ucrânia.
4.2. O caminho para “a paz de Zelensky”
Como advogar, então, “a paz de Zelensky”?
Em declarações que fez ao Wilson Center ‒ um grupo de reflexão (ing. “think-tank”) com sede em Washington ‒ no mesmo dia em que terminava a cimeira de Bürgenstock, o secretário-geral da OTAN (/NATO), Jens Stoltenberg, respondeu a esta pergunta sem floreados:
«Pode parecer um paradoxo, mas o caminho para a paz passa por mais armas para a Ucrânia».
Por outras palavras, o caminho para “a paz de Zelensky” é fornecer mais armas à Ucrânia para que ela continue a combater a Rússia até ao último soldado ucraniano. É um caminho suicidário para a Ucrânia, como concluirá qualquer pessoa com um mínimo de discernimento. “Mas que importância tem isso” ‒ dirá Stoltenberg para os seus botões ‒ “se a Rússia sair desta guerra muito enfraquecida e a pudermos, seguidamente, desmembrar em dezenas de pequenos países nossos satélites?” [11]
O secretário-geral da OTAN (/NATO) garantiu, na mesma ocasião, que «mais de 20 países» se comprometeram a aumentar os seus gastos militares para 2% do seu PIB, como a OTAN (/NATO) há muito exige. «Isto é bom para a Europa e para os Estados Unidos», disse — concretamente, bom para o complexo militar-industrial dos fabricantes de armas de guerra dos dois lados do Atlântico, para cujos accionistas esta guerra tem sido um maná. Há apenas cinco anos, lembrou Stoltenberg, menos de dez Estados-membros da OTAN (/NATO) gastavam 2% do seu PIB (produto interno bruto) na Defesa.
«Os europeus estão a fazer mais pela sua segurança colectiva do que há apenas alguns anos», exultou [12].
4.3. Amparar um usurpador
Há, porém, uma dificuldade de grande monta para percorrer este caminho até ao fim. É uma dificuldade que se prende directamente com o segundo e inconfessável objectivo da cimeira de Bürgenstock.
A dificuldade é esta. O mandato presidencial de Zelensky terminou em 21 de Maio passado e não há, na Constituição da Ucrânia, nenhuma maneira legal de o prolongar. Zelensky usurpa agora o cargo de presidente da Ucrânia. Actualmente, a sua legitimidade constitucional é nula.
Além disso, como já tive ocasião de assinalar num artigo anterior, a sua nula
legitimidade constitucional contamina, como um vírus informático maléfico, todos
os demais cargos executivos que dependem da nomeação presidencial. O
ex-embaixador da Ucrânia no Reino Unido, Davy Pristayko, alertou para as
consequências deste facto.
«No exercício legítimo dos seus poderes, Zelensky nomeou todos os governadores regionais da Ucrânia, um grande número de altos representantes do poder executivo, vice-governadores, chefes de administrações regionais e distritais, bem como de administrações militares e civis. Assim, com a perda de legitimidade do Sr. Zelensky, toda a estrutura, todo o poder executivo perde a sua legitimidade. Nenhum dos seus decretos, ordens, decisões executivas são legítimas» [13].
Ora, como advogar “a paz de Zelensky” se Zelensky não tem qualquer legitimidade constitucional para continuar a exercer o cargo de Presidente da Ucrânia?
Julgo que há boas razões para pensar que o segundo e inconfessável objectivo da cimeira de Bürgenstock foi, precisamente, o de levar a cabo uma grande operação de “comunicação estratégica” destinada a conferir a Zelensky um semblante de legitimidade. Como? Reunindo à sua volta e sob as câmaras de televisão da “aldeia global” uma numerosa claque de chefes de Estado e outros altos dignitários estrangeiros dispostos a aplaudir calorosamente os seus incansáveis esforços de guerra e a amparar a sua continuação no vértice do poder de Estado na Ucrânia, apesar dessa continuação não ter qualquer respaldo constitucional.
Julgo, pelos fracos resultados obtidos (cf. secções 2 e 3 deste artigo), que este objectivo não foi atingido. O rei vai nu e não vai ser fácil impedir que um número crescente de pessoas se atreva a dizê-lo, inclusive na própria Ucrânia.
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P.S. (10h20, 27-06-2024). Nem de propósito. Acabo de ter conhecimento da faixa (ver foto) que apoiantes da equipa de futebol da Ucrânia exibiram durante o jogo Ucrânia-Eslováquia (do campeonato Euro2024) que teve lugar no passado dia 21 de Junho de 2024, em Dusseldorf (Alemanha). A faixa diz: “Restituam-nos as eleições!”, uma alusão a dois factos: a legislatura do parlamento ucraniano terminou em 29 de Outubro de 2023 e o mandato do presidente da República terminou em 21 de Maio de 2024. Mas não foram convocadas eleições para nenhum destes órgãos, sob o pretexto que o país está sob lei marcial, que ninguém sabe quando terminará. A Constituição da Ucrânia prevê que o parlamento possa continuar em funções até ao fim da lei marcial, mas não o presidente da república.
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Notas e Referências
[1] “Cimeira na Suíça: Zelensky diz que Rússia não está pronta para a paz na Ucrânia, 13 países (incluindo Brasil) não assinaram declaração final” (Lusa, 16 de Junho de 2024).
[2] José Catarino Soares, “Quem anexou a Crimeia: a Rússia ou a Ucrânia?”. In blogue Tertúlia Orwelliana [https://tertuliaorwelliana.blogspot.com/2022/08/falsidades-e-mentiras-1.html]
[3] Cf. a série de artigos intitulada “Em 9 de Abril de 2022 Zelensky preferiu a guerra à paz pelos motivos mais mesquinhos”, in Estátua de Sal
[4] Desde pelo menos o fim da chamada “guerra fria” que o New York Times se comporta em estrita obediência ao célebre lema-brinde formulado pelo comodoro americano Stephan Decatur (1779-1820): “À nossa pátria! Que ela esteja sempre certa nas suas relações com as nações estrangeiras; mas estamos sempre com a nossa pátria, esteja ela certa ou errada!”. Uma prova recente disso são as instruções que o New York Times deu aos seus jornalistas que cobrem o genocídio que Israel leva a cabo há 9 meses em Gaza para “evitarem” a utilização de expressões como “genocídio”, “purga étnica”, “territórios ocupados”, “campos de refugiados”, “Palestina” quando descrevem o que se passa. Isto, de acordo com uma cópia de um memorando interno obtido pelo jornal The Intercept. «Embora o documento seja apresentado como uma descrição geral para manter princípios jornalísticos objectivos na reportagem sobre a guerra de Gaza, vários colaboradores do Times disseram ao Intercept que alguns dos seus conteúdos mostram indícios da deferência do jornal para com as narrativas israelitas» (Jeremy Scholl & Ryan Grim, «Lead NYT Gaza memo tells journalists to avoid words “genocide”, “ethnic cleansing” and “occupied territory”». The Intercept, April 15, 2024).
[5] O doutor Alfred de Zayas, professor de Direito internacional e história na Escola de Diplomacia e Relações Internacionais de Genebra (Suíça) adverte-nos: «Devemos escapar à armadilha epistemológica e rejeitar a tentativa de camuflar as medidas coercivas unilaterais (MCU) como “sanções”, rejeitar a exigência antiética de “cumprimento” de ordens que são, na realidade, totalitárias e violam a igualdade soberana dos Estados e a autodeterminação dos povos». «Evadamo-nos, portanto, da armadilha epistemológica e deixemos de nos referir às MCU como “sanções”. /…/ Além disso, a palavra “sanções” implica que o Estado que as impõe tem autoridade moral ou legal para o fazer. Não é esse o caso, tal como foi exposto pelos relatores especiais da ONU, doutor Idriss Jazairy, doutora Alena Douhan, doutor Michael Fakhri e outros» (Alfred de Zayas, “They’re not Sanctions and They’re Not Legal”. Remarks at United Nations Security Council. March 25, 2024).
[6] White Paper on Neutrality. Annex to the Report on Swiss Foreign Policy for the Nineties of 29 November 1993.
[7] Cf. Clarity and guidance on neutrality policy Federal Council (Federal Council report in response to Postulate 22.3385 put forward by the Council of States Foreign Affairs Committee (FAC-S), 11.04.2022. Bern, 26 October 2022); White Paper on Neutrality. Annex to the Report on Swiss Foreign Policy for the Nineties of 29 November 1993.
[8] Clarity and guidance on neutrality policy Federal Council, p.15.
[9] Este facto foi revelado pela BBC, que publicou a transcrição de uma esclarecedora conversa telefónica entre Victoria Nuland e Geoffrey Pyatt, embaixador dos EUA em Kiev. Cf. “Ukraine crisis: Transcript of leaked Nuland-Pyatt call.” BBC News, February 7, 2014.
[10] Ver artigo referenciado na nota [2], supra.
[11] É conhecida a proposta de Zbigniew Brzezinski de desmembrar a Rússia em três pedaços (Zbigniew Brzezinski, “A Geostrategy for Eurasia”, Foreign Affairs, Vol. 76, N.º 5. Sep. - Oct., 1997). Desde então, o objectivo de desmembrar a Rússia numa miríade de pequenos países impotentes é acarinhado abertamente ou em surdina por forças poderosas do Blob americano, como, por exemplo, a “Comissão de Segurança e Cooperação na Europa”, também conhecida por “Comissão Helsínquia dos EUA” [ing. “US Helsinki Comission”]. No seu sítio Internet pode ler-se: «A Comissão de Helsínquia é composta por 21 Comissários, 18 dos quais provenientes do Congresso dos EUA. Nove senadores e nove deputados ‒ cinco da maioria e quatro da minoria em cada câmara ‒ são seleccionados pelo Presidente do Senado e pelo Presidente da Câmara de Representantes, respectivamente. Os restantes três Comissários são nomeados pelo Presidente dos Estados Unidos a partir dos Ministérios dos Negócios Estrangeiros, Defesa e Comércio, normalmente ao nível de Ministro-Adjunto» (https://www.csce.gov/commissioners/). Ora, esta comissão declarou que a “descolonização” da Rússia (entenda-se: o seu desmembramento) deveria ser um «objectivo moral e estratégico» (sic) dos EUA. Mas não é caso único. O “Fórum das Nações Livres da Pós-Rússia”, composto por políticos e jornalistas exilados da Rússia, e muito acarinhado pelo presidente da Polónia, Andrzej Duda, milita no mesmo sentido. Este Fórum realizou uma reunião no Parlamento Europeu em Bruxelas no início de 2023 e três eventos em diferentes cidades americanas em Abril de 2023. «Até divulgou um mapa de uma Rússia desmembrada, dividida em 41 países diferentes, num mundo pós-Putin, partindo do princípio de que ele perde na Ucrânia e é deposto». (Anchal Vohra, “The West Is Preparing for Russia’s Disintegration.” Foreign Policy, April 17, 2023). Os devaneios da Comissão Helsínquia dos EUA e do Fórum das Nações Livres da Pós-Rússia são compartilhados por altos dignitários ucranianos. «O chefe dos serviços secretos de defesa ucranianos, Kyrylo Budanov, é famoso por receber jornalistas num gabinete decorado com um mapa da Rússia dividido em dezenas de Estados imaginários. No dia do seu aniversário, também teve o prazer de cortar um bolo com a forma desse mapa» (Leonid Ragozin, “The Controversy of the Decolonization Discourse. Russia.Post. January 17, 2024).
[12] “Líder da NATO defende que ‘caminho para paz passa por mais armas’ para a Ucrânia” (Expresso, 16 de Junho 2024).
[13] “Officials appointed by Zelensky no longer legitimate since May 21”. Tass. May 30, 2024.
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