Neste blogue discutiremos 5 temas: 1. A segurança social. 2. A linguagem enganosa. 3. As estruturas e os processos de desumanização criados pelas oligocracias contra a democracia. 4. A economia política (e.g. Petty, Smith, Ricardo, Sismondi), remodelada e crismada (no fim do século XIX) de "economia matemática", a qual teria o direito de se proclamar "ciência económica" (Ingl. economics) — um direito que não lhe será reconhecido aqui. 5. A literatura imaginativa (prosa e poesia).

06 julho, 2024

Temas 2 e 3 

As eleições legislativas de Julho de 2024 em França:

Tuidledim e Tuidledum

 

José Catarino Soares

 

N.B. Não escrevo, regra geral, sobre eleições noutros países. Mas a França é, para mim, um caso à parte. Interesso-me pela França por razões não apenas políticas e geopolíticas, mas também, e sobretudo, culturais e sentimentais. Vivi em França 6 anos consecutivos durante a minha juventude e voltei lá muitas vezes desde então. Fui muito bem acolhido e tratado nos anos que lá vivi. É um grande e admirável país que julgo conhecer bem, que tenho em alta estima e consideração, onde tenho amigos e pelo qual nutro muito carinho. Mas a França que conheci na minha juventude está quase irreconhecível. E custa-me dizê-lo: as mudanças que conheceu, entretanto, não têm sido, maioritariamente, para melhor, bem pelo contrário. É apenas uma opinião, bem entendido, e de um estrangeiro. Mas parece ser compartilhada por um certo número de franceses, como, por exemplo, o jovem poeta-cantor Gauvin Sers, que pode ser visto e ouvido aqui:

https://france3-regions.francetvinfo.fr/nouvelle-aquitaine/creuse/gueret/legislatives-2024-si-tu-voyais-grand-mere-le-nouveau-poeme-du-chanteur-creusois-gauvain-sers-2994677.html



Dito isto, vamos ao assunto anunciado no título deste artigo.

 1. Os resultados das eleições legislativas na 1.ª volta

Os resultados da 1.ª volta das eleições legislativas francesas do passado dia 30 de Junho de 2024 foram, para os quatro primeiros classificados, os seguintes:

1 ⎼ O Rassemblement National (RN) e os seus aliados tiveram 33,14% dos votos (10,6 milhões). O RN sozinho obteve 29,25% dos votos, ou seja, 9,3 milhões de votos.

2   O Nouveau Front Populaire (NFP) teve 27,99% dos votos (8,9 milhões).

3 – O Ensemble pour la République (ENS) a coligação a que pertence o partido Renaissance (ex-La République en Marche [LREM]) do presidente da república Emmanuel Macron teve 20,04% dos votos (6,4 milhões).

4 –  O Les Républicains (LR) um descendente remoto e degenerado do Rassemblement du Peuple Français (RPF), um partido político criado pelo general Charles de Gaulle em 1947 e descontinuado em 1955 associado com diversos grupos de direita, teve 6,56 % dos votos (2,1 milhões).

Para efeitos de classificação e arrumação politico-parlamentar, vou qualificar o RN como direita pseudo-soberanista; o LR como direita globalista 1.0; o ENS como direita globalista 2.0; o NFP como uma aliança de forças da esquerda pseudo-soberanista 2.0 (La France Insoumise [LFI], Parti Communiste Français [PCF]) com forças da esquerda globalista (Le Parti Socialiste [LPS], Les Écologistes [LE], Place Publique [PP], etc.).

2. Interpretação dos resultados

Os franceses fizeram em 30 de Junho o mesmo que já tinham feito em 6-9 de Junho de 2024, nas eleições para o pseudoparlamento europeu [1]:

― votaram maioritariamente no RN por ⎼ conjecturo  julgarem que assim (i) evitarão que os seus filhos sejam enviados para a morte nas planícies da Ucrânia; (ii) resguardarão os seus postos de trabalho, as suas casas e o poder de compra dos seus salários e pensões de reforma dos efeitos da recessão e do aumento do desemprego; e (iii) preservarão os seus direitos sociais e civis constantemente ameaçados por políticas públicas da direita globalista 2.0 (ENS) e, anteriormente, em alternância, pela direita globalista 1.0 (LR) e pela esquerda globalista (LPS).

Por outras palavras, os franceses votaram maioritariamente na direita pseudo-soberanista (RN) para se verem livres da direita globalista 2.0 (ENS) a direita defensora do neoliberalismo da UE, do belicismo da OTAN, da submissão política, económica, cultural e estratégica aos Estados Unidos da América e prevenirem o regresso ao poder da direita globalista 1.0 (LR) e da esquerda globalista (LPS), defensoras, em todas as questões centrais, das mesmas políticas públicas que a ENS.

Uma outra parte dos franceses, também grande mas não tão grande como a que votou no RN, votou no NFP, para ⎼ conjecturo  se verem livres da direita globalista 2.0 (ENS) e barrarem o caminho à direita pseudo-soberanista (RN).

2. Depois da 2.ª volta das eleições

Uns e outros os que votaram no RN e os que votaram no NFP (ou na NFP se aportuguesarmos a sigla, como o farei doravante) na primeira volta das eleições vão, naturalmente, querer votar na 2.ª volta das eleições (em 7 de Julho de 2024) da mesma maneira que o fizeram na 1.ª volta das eleições.

Não será fácil para os eleitores da NFP (veremos porquê já a seguir). Mas seja qual for a força política em quem votarem, RN ou NFP, o resultado será o mesmo: serão ludibriados.

3. O caso da NFP antes mesmo da 2.ª volta

No caso do NFP, os eleitores franceses não poderão sequer dizer que não sabiam que iriam sê-lo.

A primeira razão reside numa promessa que o NFP de Jean-Luc Mélenchon fez e que o jornal Libération descreveu assim:

«A este respeito, a esquerda [entenda-se, a NFP] foi muito clara: em todos os círculos eleitorais em que o RN ficou em primeiro lugar e um candidato da Nova Frente Popular [NFP] ficou em terceiro (ou quarto), este prometeu retirar-se. O mesmo se deve aplicar aos círculos eleitorais em que um candidato da RN ficou em segundo lugar, mas onde a manutenção do candidato da NFP poderia levar à sua eleição.

Em pormenor, 127 candidatos investidos pela Nova Frente Popular ou pela esquerda desistiram em círculos eleitorais onde a RN teria podido ganhar contra vários adversários, segundo a Agence France Press. Três quartos destas desistências foram para candidatos do EN, e para candidatos dos LR em cerca de vinte círculos eleitorais. No sentido inverso, 81 candidatos do EN também se retiraram, assim como três candidatos do LR» [2].

Como se vê, é um bom negócio para o EN (direita globalista 2.0) e para o LR (direita globalista 1.0) que poderão eleger 95 e 32 deputados, respectivamente, à custa da transferência de votos de eleitores da NFP. Em troca, 84 candidatos da NFP poderiam beneficiar da transferência de votos do EN (em 81 círculos eleitorais) e do LR (em 3 círculos eleitorais).

No dia em que estou a escrever estas linhas (3 de Julho), o negócio ainda não estava completamente fechado.

«Assim, restariam cerca de quinze candidatos da maioria [entenda-se, do EN] cerca de dez dos LR e de vários partidos de direita, e um punhado de candidatos da esquerda que poderiam ter retirado as suas candidaturas no caso de uma eleição triangular» [2].

4. O caso da NFP depois da 2.ª volta

Mas há outra razão para prognosticar que os eleitores da NFP ou, pelo menos, muitos deles serão ludibriados se tiverem votado no passado dia 30 de Junho (como presumo ter sido o caso), e forem de novo votar no próximo dia 7 de Julho (como presumo que será o caso), não apenas para afastar do poder a direita globalista 2.0 (EN) e, concomitantemente, barrar o acesso ao poder do direita pseudo-soberanista (RN), mas também e sobretudo para derrotar as políticas públicas de Macron, do seu governo e da sua maioria parlamentar EN no poder há 7 anos.

Isso porém é uma certeza não vai acontecer, mesmo que a NFP ganhe as eleições legislativas.  A razão é simples e conhecida: a denominada “Nova Frente Popular”, que se diz de esquerda, tem dentro dela partidos o Partido Socialista [Le Parti Socialiste], Os Ecologistas [Les Écologistes], Praça Pública [Place Publique] que defendem aberta e vigorosamente a continuação da guerra na Ucrânia até ao último soldado ucraniano, o belicismo da OTAN contra a Rússia, o neoliberalismo da UE, a submissão política, económica, cultural e estratégica aos EUA.

No caso da guerra na Ucrânia foram as posições políticas destas três forças políticas que foram acolhidas como as posições oficiais do programa da NFP, como se pode constatar pelo trecho seguinte desse programa:

«Travar a guerra de agressão de Vladimir Putin e obrigá-lo a responder pelos seus crimes perante a justiça internacional, defender a soberania e a liberdade do povo ucraniano e a integridade das suas fronteiras, fornecendo as armas necessárias, a anulação da sua dívida externa, a apreensão dos activos dos oligarcas que contribuem para o esforço de guerra russo no quadro no quadro permitido pelo direito internacional, o envio de forças de manutenção da paz para proteger as centrais nucleares, num contexto internacional de tensão e guerra no continente europeu e para trabalhar pelo regresso da paz» [3].

5. A realidade pede meças à ficção romanesca

Este trecho do programa da NFP (apelidado de “contrato de legislatura”) exemplifica bem os três lemas do Ministério da Verdade de Oceania, no romance distópico Mil Novecentos e Oitenta e Quatro de Georges Orwell: GUERRA É PAZ, IGNORÂNCIA É FORÇA, LIBERDADE É ESCRAVIDÃO ― este último numa versão mais branda, LIBERDADE É SUBMISSÃO.

#1. Os autores do programa da NFP fingem ignorar que a «guerra de agressão de Vladimir Putin» foi precedida e provocada pela “guerra de agressão de Oleksandr Turchinov, Petro Poroshenko e Volodymyr Zelensky” — ou seja, que antes da agressão das tropas russas à Ucrânia, e como uma das suas causas contribuintes, houve a agressão, durante oito longos anos, das tropas ucranianas à população russa, russófona e russófila da República Popular de Donetsk (RPD) e da República Popular de Lugansk (RPL) na Donbass (leste da Ucrânia).

Podemos, pois, começar por dizer, se quisermos gracejar com coisas sérias, que a Rússia está envolvida numa «guerra de agressão contra a Ucrânia», mas temos de acrescentar imediatamente, para não faltar à verdade e induzir em erro quem nos ouve, que a Ucrânia travou uma guerra de agressão contra uma parte da sua própria população durante oito anos e que foi essa a razão imediata invocada pela Rússia para invadir a Ucrânia em 24 de Fevereiro de 2022.  

É fácil compreender quem é o quê e fez o quê no conflito armado na Ucrânia se o transpusermos para o campo interpessoal.

Sejam três pessoas: o agressor armado (A) de uma pessoa inofensiva (B) e uma terceira pessoa (C) que vem em socorro da vítima agredida (B) e ataca o agressor (A) para o impedir que consumar o seu crime. Salvo por má-fé, a pessoa (C) não pode ser qualificada de “agressor” de (A), nem a pessoa (A) pode ser qualificada de “vítima da agressão” de (C), mesmo que se alegue (i) que (B) morava no quintal de (A) e (ii) que (C) invadiu a propriedade privada de (A) quando veio em socorro de (B), tendo cometido, por isso, (iii) um crime de lesa-majestade contra a propriedade privada de (A).

As proposições (i), (ii) e (iii) constituem, basicamente, como se depreenderá, o argumento segundo o qual a Rússia violou a integridade das fronteiras e a integridade territorial da Ucrânia ao desencadear a sua autodenominada “Operação Militar Especial” (OME).

Porque é que este argumento é falacioso e inaceitável? Porque apaga completamente as relações entre o agressor (A) e a vítima agredida (B) anteriores à intervenção de (C), apagando ao mesmo tempo o nexo de causalidade que existe entre os actos de (A) em relação a (B) e os actos de (C) em relação a (A), para defender (B).

Substituamos agora (A) por “FAU (Forças Armadas Ucranianas)”, (B) por “população russa, russófona e russófila da RPD e RPL, na Donbass”, e (C) por “FAR (Forças Armadas Russas)” e tudo fica claro como água.

#2. Os autores do programa da NFP fingem ignorar que a guerra na Ucrânia poderia ter sido evitada se (a) a Ucrânia tivesse cumprido os Acordos de Minsk (em particular o Acordo de Minsk-2, de 12 de Fevereiro de 2015, adoptado por unanimidade pelos 15 Estados-membros do Conselho de Segurança da ONU na sua Resolução 2022, de 15 de Fevereiro de 2015) e se (b) a França e a Alemanha tivessem respeitado e feito respeitar à Ucrânia o cumprimento desses acordos, de que eram os garantes junto dela.

#3. Os autores do programa da NFP fingem ignorar, muito em particular, o artigo 11.º do Acordo de Minsk-2/Resolução 2022 do Conselho de segurança (CS) da ONU, que reza o seguinte:

«11. Efectuar uma reforma constitucional na Ucrânia com a entrada em vigor de uma nova constituição até ao final de 2015, que preveja a descentralização como elemento-chave (incluindo uma referência às especificidades de certas zonas das regiões de Donetsk e Luhansk [entenda-se, a RPD e a RPL, n.e.], acordadas com os representantes dessas zonas), bem como a adopção de legislação permanente sobre o estatuto especial de certas zonas das regiões de Donetsk e Luhansk, em conformidade com as medidas referidas na nota de rodapé, até ao final de 2015». [realce por meio de traço grosso acrescentado ao original; n.e.= nota editorial].

#4. Os autores do programa da NFP fingem ignorar que o cumprimento deste artigo do acordo de Minsk-2/Resolução 2022 do CS da ONU era a única maneira de «defender a soberania e a liberdade do povo ucraniano [de todo o povo ucraniano e não apenas de uma parte dele, ainda que maioritária — a parte que ergueu dezenas de estátuas e outros monumentos a Stepan Bandera [4]; que deu o seu nome a ruas, avenidas, praças e outros locais públicos; que lhe dedicou museus e selos postais e que faz marchas anuais em honra da sua memória, n.e.] e a integridade das suas fronteiras».

Monumento a Stepan Bandera (1909-1959) em Levive. Bandera foi um filonazi com um longo historial de crimes de guerra e de crimes contra a humanidade que é tratado como um herói nacional da Ucrânia por uma parte importante e maioritária da população do oeste, centro e norte da Ucrânia.
         

#5. Os autores do programa da NFP fingem ignorar que os presidentes Petro Poroshenko e Volodymyr Zelensky da Ucrânia lançaram quatro ofensivas militares de grande envergadura contra a RPL e a RPD   a “Operação Antiterrorista” (que começou em Maio de 2015); a “Operação das Forças Interarmas” (que começou em Abril de 2018) e, sem nome próprio conhecido, uma terceira ofensiva (que começou em Junho de 2021) e uma quarta (que começou em 16 de Fevereiro de 2022 e que seria aparentemente a mais poderosa)  para destruir a ferro e fogo os Acordos de Minsk e, em particular, o artigo 11.º do Acordo de Minsk-2.

#6. Os autores do programa da NFP fingem ignorar que o presidente Poroshenko da Ucrânia, a ex-chanceler da Alemanha Angela Merkel, e o ex-presidente da França François Hollande, signatários dos Acordos de Minsk-2, confidenciaram repetidamente, em 2022 e 2023, que só tinham assinado os Acordos de Minsk para permitir à Ucrânia ganhar tempo e se armar  até aos dentes (o que ela fez) e poder,  desse modo, tentar destruir a RPD e a RPL (o que ela tentou sem êxito várias vezes) e subjugar de novo as populações russas, russófonas e russófilas da Donbass [5].  

A Chanceler Angela Merkel da Alemanha e o presidente Volodymyr Zelensk da Ucrânia em 22 de Agosto de 2021, em Quieve. Foto:  www.president.gov.ua /CC BY-ND 4.0]

#7. Os autores do programa da NFP fingem ignorar a proposta de tratado que a Rússia propôs à OTAN (/NATO) em 17 de Dezembro de 2021: “Proposta de Acordo sobre medidas para garantir a segurança da Federação Russa e dos Estados membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte” [OTAN].

Ei-la, resumidamente:

«― A Rússia e todos os países que eram membros da OTAN em 27 de Maio de 1997 não poderão destacar forças militares nem armamento para o território de qualquer dos outros Estados da Europa, para além das forças estacionadas nesse território em 27 de Maio de 1997.

― As Partes [Rússia e Estados-membros da OTAN] não deverão instalar mísseis terrestres de médio e curto alcance em áreas que lhes permitam alcançar o território das outras Partes.

Todos os Estados-membros da OTAN se comprometem a abster-se de qualquer novo alargamento da OTAN, incluindo a adesão da Ucrânia, bem como a adesão de outros Estados.

As Partes que são Estados-membros da OTAN não conduzirão qualquer actividade militar no território da Ucrânia, bem como de outros Estados da Europa Oriental, do Cáucaso do Sul e da Ásia Central» [realce por meio de traço grosso acrescentado ao original, n.e.]

 

Manchete do New York Times do dia 17 de Dezembro de 2021: «A Rússia apresenta as suas pretensões para um novo e abrangente acordo de segurança com a OTAN (/NATO […] que os responsáveis da OTAN rejeitaram imediatamente».


#8. Os autores do programa da NFP fingem ignorar a existência da proposta de tratado que a Rússia fez aos EUA em 17 de Dezembro de 2021: Proposta de Tratado entre os Estados Unidos da América e a Federação Russa sobre as garantias de segurança.

Ei-la, resumidamente:

«― Os EUA comprometem-se a impedir uma maior expansão para Leste da OTAN e a negar aos Estados da ex-União Soviética a adesão à OTAN.

Os EUA não estabelecerão bases militares no território dos Estados da ex-União Soviética que não sejam membros da OTAN, não utilizarão as suas infra-estruturas para quaisquer actividades militares nem desenvolverão com eles uma cooperação militar bilateral.

As Partes [Rússia e EUA] abster-se-ão de destacar as suas forças armadas e o seu armamento, inclusive no âmbito de organizações internacionais, alianças militares ou coligações, para áreas em que tal destacamento possa ser entendido pela outra Parte como uma ameaça à sua segurança nacional, com excepção de tal destacamento nos territórios nacionais das Partes.

― As Partes abster-se-ão de pilotar bombardeiros pesados equipados com armamento nuclear ou não nuclear, ou de utilizar navios de guerra de superfície de qualquer tipo, incluindo no âmbito de organizações internacionais, alianças militares ou coligações, nas áreas fora do espaço aéreo nacional e das águas territoriais nacionais, respectivamente, de onde possam atacar alvos no território da outra Parte.

― As Partes manterão o diálogo e cooperarão para melhorar os mecanismos destinados a prevenir actividades militares perigosas no e sobre o alto-mar, incluindo o acordo sobre a distância máxima de aproximação entre os navios de guerra e as aeronaves.

― As Partes comprometem-se a não utilizar mísseis de curto e médio alcance lançados no solo fora dos seus territórios nacionais, bem como nas áreas dos seus territórios nacionais, a partir dos quais tais armas possam atacar alvos no território nacional da outra Parte.

As Partes abster-se-ão de utilizar armas nucleares fora dos seus territórios nacionais e devolverão aos seus territórios nacionais essas armas já implantadas fora dos seus territórios nacionais no momento da entrada em vigor do Tratado. As Partes eliminarão todas as infra-estruturas existentes para a utilização de armas nucleares fora dos seus territórios nacionais.

As Partes não formarão pessoal militar e civil de países não nucleares para a utilização de armas nucleares. As Partes não conduzirão exercícios nem farão formação para forças de uso geral, que incluam cenários envolvendo o uso de armas nucleares» [realce por meio de traço grosso acrescentado ao original, n.e.]

Estas propostas da Rússia [6], perfeitamente razoáveis, garantiriam a paz e segurança mútua de todos os países da Europa, incluindo a Ucrânia. Garantiriam também a segurança mútua dos EUA e da Rússia, as duas maiores potências nucleares do planeta e, potencialmente, os dois primeiros candidatos à destruição nuclear mutuamente assegurada. Mas foram liminarmente recusadas pelos EUA e pelos países-membros da OTAN. Não foram sequer aceites para discussão.

#9. Os autores do programa da NFP fingem ignorar a existência dessa rejeição.

Mas não é tudo.

#10. Os autores do programa da NFP fingem ignorar a existência do Acordo de Paz e Segurança que a Ucrânia e Rússia celebraram em negociações que tiveram lugar em Istambul na segunda quinzena de Março/primeira quinzena de Abril de 2022, quando a guerra entre os dois Estado ainda estava no seu início e o número de baixas que tem causado em ambos os lados era ainda reduzido.

#11. Os autores do programa de NFP fingem ignorar que o teor do Acordo de Istambul era muito favorável à Ucrânia.

Os pontos principais desse acordo eram os seguintes:

As tropas russas retirar-se-iam do território ucraniano e, em contrapartida, a Ucrânia

(i) declarava a sua neutralidade militar, com a concomitante renúncia à sua intenção [a] de aderir à OTAN (/NATO); [b] de instalar armas nucleares, de fabrico próprio ou alheio, em território ucraniano; [c] de acolher bases militares e/ou tropas estrangeiras no seu território, obtendo em contrapartida [d] garantias de segurança por parte do conjunto de Estados-membros do Conselho de Segurança da ONU (EUA, Reino Unido, França, China, Rússia) e, eventualmente também, de outros Estados como, por exemplo, a Turquia (do agrado da Ucrânia) e a Bielorrússia (do agrado da Rússia);

(ii) reconhecia, de uma vez por todas, a Crimeia como uma república autónoma da Federação Russa [7];

(iii) garantia o respeito pela autonomia política, cultural e administrativa da RPL e da RPD no quadro de uma solução negociada semelhante, por exemplo, à do Tirol do Sul;

(iv) garantia o respeito pelos direitos linguísticos e culturais das demais populações russófonas e russófilas da Ucrânia.

#12. Os autores do programa da NFP fingem ignorar que Zelensky rompeu as negociações e repudiou o acordo que tinha feito com o governo da Rússia para fazer a vontade aos EUA, ao Reino Unido, à Alemanha e à França, cujos governantes se puseram de acordo para enviar a Quieve, como seu mensageiro, numa visita-surpresa que teve lugar em 9 de Abril de 2022, o senhor Boris Johnson, à época primeiro-ministro do Reino Unido.

Na manchete do Ukrainska Pravda (UP), lê-se: «A possibilidade de conversações entre Zelensky e Putin foi interrompida após a visita de Johnson  fontes do UP»


#13. Os autores do programa da NFP fingem ignorar a mensagem que Boris Johnson, no duplo papel de deus Mercúrio e de demónio Mefistófeles, levou a Zelensky nesse dia e que pode ser resumida assim:

«Se o senhor fizer um acordo com Putin, nós nunca mais ajudaremos a Ucrânia em nada. Fica por sua conta. Se, pelo contrário, o senhor se dispuser a combater a Rússia para a enfraquecer e derrotar, custe o que custar, pode contar com o apoio total dos nossos Estados e de todo o “Ocidente alargado”» [8].

#14. Os autores do programa da NFP fingem ignorar que Zelensky, ao aceitar a proposta envenenada que Boris Johnson lhe transmitiu, escolheu sacrificar o seu povo e o seu país para servir os desígnios do “Ocidente alargado”.

#15. Os autores do programa da NFP fingem ignorar que Zelensky, para esconder o pacto Faustiano que fez com Boris Johnson e a sua súcia (Biden, Scholz, Macron) e encobrir as suas terríveis consequências para o seu povo e o seu país, chegou ao cúmulo de fazer um decreto ‒ o decreto presidencial n.º 670/2022, de 30 de Setembro de 2022 ‒ em que proíbe (a si próprio!) entabular novas negociações de paz com a Rússia enquanto Putin estiver no poder... Como se Putin fosse o culpado da sua ignominiosa traição aos interesses do seu povo e do seu país e como se Putin fôsse desaparecer por um passe de mágica circense !

Os autores do programa da NFP fingem ignorar tudo o que foi dito de #1 a #15 porque só assim podem acalentar a esperança de conseguirem dar um semblante de verossimilhança ao trecho do seu programa que foi citado no fim da secção 4 deste artigo. Os seus lemas foram como vimos ao longo deste artigo pedidos de empréstimo ao Ministério da Verdade ficcionado por George Orwell em Mil Novecentos e Oitenta e Quatro: Ignorância é Força; Guerra é Paz; Liberdade é Submissão (a versão mais branda de Liberdade é Escravidão).

Com estes lemas, é garantido que a NFP procurará ludibriar os seus eleitores, se vier a ter a maioria dos deputados.

6. O caso do RN

No caso da RN, o embuste eleitoral não é tão óbvio e as ilusões poderão subsistir mais tempo incontestadas. Mas não é arriscar demasiado prognosticar que, mais tarde ou mais cedo, os franceses ouvirão Marine Le Pen e Jordan Bardella, se ganharem as eleições, convertidos à necessidade de apoiar a Ucrânia com mais armas, munições, conselheiros e instrutores militares, reforçar o orçamento militar da França e reforçar o poderio militar  (incluindo o poderio nuclear) da OTAN (/NATO) contra a “ameaça russa”.

Não se pode sequer descartar a possibilidade que venham até, quem sabe, a aderir tardiamente à tese da necessidade de desmembrar a Rússia em 41 Estados  (como preconizam o “Fórum das Nações Livres da Pós-Rússia” e o seu “Big Brother”, a Comissão Helsínquia do Congresso e do Ministério dos Negócios Estrangeiros dos EUA), ou em 200 Estados (como sugeriu o presidente polaco, Andrzej Duda, da Polónia na denominada “Cimeira pela Paz na Ucrânia” que se realizou em Bürgenstock (Suíça)  em 15-16 de Junho de 2024).

Mapa do desmembramento da Rússia em 41 Estados independentes, o devaneio alucinogénio do “Fórum das Nações Livres da Pós-Rússia”, a prole de Zbigniew Brzezinski.


Se não vejamos. Longe vão os tempos em que o RN de Marine le Pen era pela saída da França da União Europeia, da zona Euro e do Comando Militar Integrado da OTAN — posições que lhe valeram o apodo de força de “extrema-direita” por parte da direita globalista e da esquerda globalista, interessadas em denegrir as posições antagónicas aos seus ídolos do foro.

«Nas eleições europeias de 2017, o programa do Rassemblement National já não mencionava a saída da União Europeia e da zona euro. E nas eleições presidenciais de 2022, Marine Le Pen afirmou a sua vontade de restabelecer a superioridade do direito francês sobre o direito europeu, sem no entanto apelar à saída da UE. O Frexit [= a saída da França da UE através de um referendo popular, medida que o programa de Marine Le Pen às eleições presidenciais de 2017 considerava uma prioridade, n.e.] desapareceu, e o Rassemblement National apela agora a uma reforma profunda das instituições europeias para chegar a uma Europa à la carte» [9].

Sobre a OTAN (/NATO) a situação é bastante semelhante. Embora o RN nunca se tenha atrevido a defender a saída da França da OTAN (/NATO), defendia, no entanto, uma certa autonomia relativamente a esta organização militar. No seu programa para as eleições presidenciais de 2017, Marine Le Pen preconizava

«O abandono, por parte da França, do comando militar integrado da OTAN [10] para que a França não seja arrastada para guerras que não são as suas» [11].

Esta posição pertence ao passado. A posição actual do RN é outra [12].

«Marine Le Pen tinha feito da saída do comando integrado da OTAN [/NATO] uma das suas prioridades. Em Março, Jordan Bardella anunciou uma mudança de posição, tendo em conta o contexto atual. “A França não deve abandonar o comando integrado da OTAN [/NATO] enquanto estivermos em guerra [Bardella comete aqui um deslize revelador: declara, inadvertidamente, que a França e a OTAN estão de facto (mas não de jure) em guerra contra a Rússia!, n.e.] Isso enfraqueceria consideravelmente a responsabilidade da França na cena europeia e a sua credibilidade perante os seus aliados”, explicou. François Heisbourg [conselheiro do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS), n.e.] considera que se trata de “um truque colossal para não aplicar o seu programa sem dar a impressão de o estar a fazer” »[13].

Sobre o reforço do orçamento militar nos próximos 7 anos, Bardella o Delfim de Marine Le Pen foi também muito claro: quer ser mais macronista do que Macron.

«Em visita à feira de armamento Eurosatory, na semana passada, o candidato a Matignon [o Hôtel Matignon é a residência oficial do primeiro-ministro da França, n.e.] procurou tranquilizar-nos, dizendo que a defesa é “um dos temas menos polémicos com Emmanuel Macron”, lembrando que o seu partido votou a favor da última lei de programação militar, que prevê um aumento do orçamento da defesa nos próximos sete anos. É verdade, mas acima de tudo a RN quer ir mais longe e mais depressa. “A economia de guerra implementada por Emmanuel Macron é muito fraca”, disse Jordan Bardella no mesmo Salão. /…/ O candidato do RN recuou no seu projeto de cooperação com a Alemanha sobre os programas de armamento para os aviões e os tanques do futuro: não os porá em causa se chegar a primeiro-ministro, segundo as declarações que fez à [estação de televisão] BFMTV. Marine Le Pen defendeu o contrário em 2022» [14].

Jordan Bardella (o indivíduo ao centro, com as mãos entrelaçadas) num dos expositores do Salão Mundial da Defesa Eurosatory, dia 19 de Junho de 2024. Foto: Nicolas Messyasz/SIPA

 

Sobre a guerra na Ucrânia, Bardella foi também claro. Está de acordo com o presidente Macron em tudo, excepto em duas coisas: os mísseis Scalp que a França está a fornecer a Quieve, e o envio de instrutores militares franceses para a Ucrânia, confirmado no início de Junho por Emmanuel Macron.

«Durante a apresentação do seu projeto, na segunda-feira, o candidato [Bardella] deixou claro que “não pretende pôr em causa os actuais compromissos da França” e afirmou ser “a favor da continuação do apoio logístico e do equipamento de defesa à Ucrânia”. Mas também sublinhou as suas duas “linhas vermelhas”: “enviar tropas francesas para o território ucraniano” e “enviar mísseis de longo alcance ou equipamento militar /.../ que possam atingir directamente cidades russas”» [15].

François Heisbourg (conselheiro do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS) de Londres e apoiante de Macron) aproveitou imediatamente a oportunidade para pressionar Jordan Bartella a não guardar nenhuma carta na manga, pois isso seria prejudicial aos interesses da economia de guerra que diz defender, perguntando-lhe:

«Será que um governo do RN estaria disposto a aprovar o financiamento da ajuda à Ucrânia, que ronda os 3 mil milhões de euros em 2024?».

A resposta parece ser afirmativa, se atendermos aos seguintes factos:  

«Para além da Ucrânia, Jordan Bardella /.../ foi mais crítico em relação ao Kremlin do que os líderes históricos do FN-RN, a começar por Marine Le Pen. Moscovo é uma “ameaça multidimensional tanto para a França como para a Europa”, disse, citando em particular a sua influência contra os interesses franceses em África e em Mayotte [nas ilhas Comores]» [16].

Quanto ao genocídio que Israel tem vindo a fazer em Gaza, a posição do RN de Le Pen e Bartella não se distingue da posição do ENS de Emmanuel Macron.

«Uma procura de normalização, longe das suas raízes anti-semitas, e uma luta declarada contra o islamismo explicam que a RN tenha declarado firmemente o seu apoio a Israel após os atentados do Hamas de 7 de outubro.

Quando questionado sobre o conflito, no final de maio, o candidato a primeiro-ministro francês manifestou uma posição semelhante à que a França defende hoje: apoio a uma solução de dois Estados, mas reconhecimento de um Estado palestiniano condicionado a um contexto favorável. No entanto, foi mais longe, afirmando que “reconhecer hoje um Estado palestiniano seria o mesmo que legitimar as acções terroristas do Hamas” »[17].

7. Conclusão

De tudo o que foi dito nas secções anteriores, se pode concluir que a escolha eleitoral que os franceses têm perante si em 7 de Julho de 2024, no caso das duas maiores forças em presença da “oposição” política a Macron e o seu Ensemble é entre Tuidledim e Tuidledum.  

Tuidledim Tuidledum são dois personagens fictícios criados por Lewis Caroll no seu livro Alice do outro lado do Espelho (1871). Este é o modo como foram retratados no filme Alice no País das Maravilhas de Walt Disney, em 2010,

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P.S. [8-7-2024, 20h20] Um amigo meu perguntou-me hoje (a) se eu tencionava escrever sobre os resultados da 2.ª volta das eleições legislativas francesas, e (b) em quem eu votaria se fosse francês.

Sobre (a) tenho apenas acrescentar o seguinte comentário.

Os resultados da segunda volta foram os seguintes, para os quatro primeiros classificados: NFP :178 deputados; ENS: 150 deputados; RN:125 deputados, RN + alguns LR aliados : 143 deputados; LR:39 deputados [18].

A NFP (LFI de Mélanchon + aliados) teve 7 milhões de votos (25,6%), mais 3,8 milhões de votos e mais 27 deputados do que tivera a NUPES, a sua antecessora nas eleições legislativas de 2022. O RN (+LR aliados) teve 10,1 milhões de votos (37%), mais 6,4 milhões de votos e mais 53 deputados  do que nas legislativas de 2022. O ENS de Macron teve 6,3 milhões de votos (23,1%) e perdeu 1,6 milhões de votos e 95 deputados em relação às eleições legislativas de 2022. O LR teve 2.1 milhões de votos (6,5%) e perdeu 700 mil  votos e 22 deputados em relação a 2022.

Mesmo assim, o ENS ficou em segundo lugar graças à ajuda que lhe foi prestada na 2.ª volta pela transferência de votos de eleitores da NFP, cujos candidatos desistiram a favor dos candidatos do ENS — ou seja, graças à aliança, cognominada de “frente republicana”, de Mélenchon com Macron em matéria de votação na 2.ª volta.

Nenhum destes quatro partidos ou coligações obteve a maioria absoluta. Macron pode, pois, continuar a governar. Para isso tentará formar um governo do ENS (direita globalista 2.0) com uma parte substancial, pelo menos, da NFP (LPS, Écologistes, PP…) ou seja, com as diversas facções da esquerda globalista 2.0 e, se possível, com apoio do LR (direita globalista 1.0). Por conseguinte, nada de fundamental, ou mesmo de importante, mudará nas políticas públicas da presidência, do governo e do parlamento franceses.

Estes resultados corroboram e reforçam a análise feita no artigo de 6 de Julho de 2024. Para os franceses que votaram para derrotar Macron e o seu ENS, a “escolha” eleitoral era, na 1.ª volta, entre Tuidledim (NFP) e Tuidledum (FN). Na 2.ª volta, a NFP prestou-se a ser uma “barriga de canguru” do ENS. Tuidledim passou a ser ainda mais igual a Tuidledum.

Quando à pergunta (b), pensei que a resposta se depreendia claramente do que escrevi. Pelos vistos, não se depreende. Aqui fica, então: teria votado num candidato que defendesse a saída da França da OTAN (/NATO), da União Europeia e da chamada moeda comum, o Euro.

Porquê? Porque nenhuma política pública favorável aos interesses e reinvindicações do povo (por exemplo, a reposição da idade de reforma aos 60 anos em França, a paz na Ucrânia e na Europa ou o desarmamento nuclear universal) é possível pertencendo a essas instituições oligárquicas e/ou sem enfrentar a sua oposição cerrada.

Desconheço se houve algum partido ou, pelo menos, algum candidato, que tivesse defendido este programa mínimo nas eleições legislativas francesas deste ano. Espero que sim.

P.S.(2) [22-07-2024]. Afirmei, no corpo principal do artigo, que os franceses que foram votar na NFP para afastar Macron e a sua coligação ENS do poder, seriam enganados mesmo antes da 2.ª volta, o que aconteceu (cf. P.S. 8-07-2024). Parece não haver limites ao comportamento vigarista da NFP. Nesta foto, vemos Manon Aubry ‒ cabeça de lista da LFI (La France Insoumise), principal partido da NFR, ao pseudoparlamento europeu ‒ a saudar efusivamente Ursula von der Leyen pela sua  “reeleição como presidente da Comissão Europeia.



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Notas e Referências

[1] Nos Estados-Membros da UE, assim como em muito outros Estados por esse mundo fora, os parlamentos têm competência para propor e elaborar legislação, paralelamente aos governos nacionais. É esse direito formal de iniciativa legislativa que define qualquer parlamento, seja onde for. Porém, no âmbito da UE, o direito de iniciativa legislativa é uma competência reservada quase exclusivamente à Comissão Europeia. É o que dispõe o artigo 17.º, n.º 2, do Tratado da União Europeia que diz o seguinte: «os actos legislativos da União só podem ser adoptados sob proposta da Comissão, salvo disposição em contrário dos Tratados. Os demais actos são adoptados sob proposta da Comissão nos casos em que os Tratados o determinem». Daí se segue que o chamado “Parlamento Europeu” (PE) não é um parlamento. Tudo o que o PE pode fazer em matéria legislativa é solicitar à Comissão Europeia que submeta à sua apreciação propostas legislativas (artigo 225.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia). Mas a Comissão pode recusar esse pedido, limitando-se a informar o PE dos motivos da sua recusa.

[2] “Législatives : au moins 210 désistements, dont 127 candidats du Nouveau Front populaire et 81 d’Ensemble”. Libération, 2 juillet 2024.

[3] Nouveau Front Populaire. Contrat de legislature, p.7 [https://www.nouveaufront populaire.fr/].

[4] Para mais pormenores sobre este assunto, ver a secção 3.1 [Stepan Bandera] do artigo intitulado Volodymyr Zelensky é «a figura do ano 2022» (para o Financial Times, a Time, etc.). É, de facto, mas pelas piores razões. In Tertúlia Orwelliana [https://tertuliaorwelliana. blogspot.com/2023/02/volodymyr-zelensky-e-figura-do-ano-2022.html].

[5] Ver, por exemplo, o depoimento de Poroshenko a um filme antirrusso feito pela BBC, “Poroshenko revealed the success of the Minsk agreements”. Pledge Times, January 31, 2023 [https://pledgetimes.com/poroshenko-revealed-the-success-of-the-minsk-agreements/]; as entrevistas de  Angela Merkel, “A Year with Ex-Chancellor Angela Merkel. «You’re Done with Power Politics»”, Der Spiegel, 1-12-2022; “Did you think I was coming with a ponytail?”, Die Zeit, 7-12-2022;  as entrevistas de François Hollande, “Hollande: «There will only be a way out of the conflict when Russia fails on the ground»”, The Kiev Independent, December 28, 2022;  “Nord Stream 2 should have been stopped during construction”, Frankfurter Allgemeine, 24-03-2023; “Quand François Hollande se fait piéger par des humoristes...” Sud Radio: ver aqui  https://www.youtube.com/watch?v=D8FDgJsr Rt0&t=219s ou aqui https://www.youtube.com/watch?v=XaJanzPRS9I

[6] Agreement on measures to ensure the security of The Russian Federation and member States of the North Atlantic Treaty Organization 

[https://mid.ru/ru/foreignpolicy/rso/nato/1790803/?lang=en]; 

Treaty between The United States of America and the Russian Federation on security guarantees [https://mid.ru/ru/foreign_policy/rso/nato/1790818/?lang=en]. A tradução dos excertos citados no corpo principal do artigo é minha.

[7] Ver José Catarino Soares, “Quem anexou a Crimeia: a Rússia ou a Ucrânia?”. In blogue Tertúlia Orwelliana [https://tertuliaorwelliana.blogspot.com/2022/08/falsidades-e-mentiras-1.html]

[8] “Possibility of talks between Zelenskyy and Putin came to a halt after Johnson’s visit UP sources”, Ukrainska Pravda, May 5, 2022.

[9] Romane Laignel Sauvage, “Le FN puis le RN : d’une attitude pro-européenne à un euroscepticisme ferme”, INA, 29.05.2024.

[10] O comando militar integrado da OTAN (/NATO) é o comando militar desta aliança militar. É o órgão que define as estratégias militares e as aplica no terreno. O comando integrado é composto por dois comandos supremos. Um deles é o Comando Aliado das Operações, que está sediado em Mons, na Bélgica, e que é responsável pelo planeamento e execução de todas as operações da Aliança. O outro é o Comando Aliado da Transformação, que está sediado em Norfolk, na Virgínia (EUA) e que é responsável pela estratégia de combate. Estes dois comandos são colocados sob a autoridade do Comité Militar, que reúne os chefes de Estado-Maior dos países membros da OTAN (/NATO). O comandante do Comando Aliado da Operações é também o Comandante supremo aliado na Europa e o chefe do Estado-Maior General Supremo das Potências Aliadas. O oficial que desempenha este cargo, de tremendo poder, é (e sempre foi) um general de quatro estrelas das Forças Armadas dos EUA. O que se compreende facilmente atendendo ao facto de que os EUA são o fundador, mentor, patrocinador, principal financiador e director da OTAN (/NATO).

[11] 144 engagements présidentiels. Marine 2017. [https://www.politique-animaux.fr/sites/ www.politique-animaux.fr/fichiers/prises-de-positions/pieces-jointes/projet-presidentiel-marine-le-pen-2017.pdf]

[12] O RN autoproclama-se um partido de direita “soberanista” — ou seja, respeitador do princípio da soberania nacional, a qual “reside no povo” e é “una e indivisível” (como diz o artigo 3.º da Constituição portuguesa).  Por outras palavras, “o povo é quem mais ordena dentro de ti, ó cidade”, como diz a conhecida canção de Zeca Afonso. Ora, é evidente que um partido, como o RN, que é favorável à integração do seu país numa organização política e económica supranacional (a UE), numa moeda supranacional (o Euro) e numa organização militar supranacional (a OTAN/NATO) cuja criação e organização nunca foram objecto de referendos por parte do povo soberano e cujo funcionamento escapa completamente à soberania popular, não pode, de modo nenhum, ser soberanista. Se insiste, porém, em afirmar mentirosamente que é soberanista, a maneira mais simples de repudiar esse embuste é apelidá-lo de “pseudo-soberanista”. O que aqui foi dito, aplica-se igualmente, mutatis mutandis, ao Parti Communiste Français e ao partido La France Insoumise, que se situam ambos à esquerda do espectro político parlamentar. Porém, são partidos que aceitam (com mais ou menos críticas) a UE, o Euro e a OTAN, como realidades intangíveis, fora do alcance da soberania popular, razão pela qual não se podem levar a sério as suas veleidades soberanistas. 

[13] Sophie Amsili, Législatives 2024 : Ukraine, Gaza, Otan…les changements de pied du RN”. Les Echos, 27 juin 2024.

[14] Ibidem.

[15] Ibidem.

[16] Ibidem.

[17] Ibidem.

[18] Estes são os resultados que encontrei  no sítio electrónico do Ministère de l'Intérieur et des Outre Mer. Não batem certo com os resultados que encontrei noutros sítios electrónicos, como, por exemplo, os do jornal Le Monde, Le Parisien, Toute l'Europe, etc.

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