Temas 2 e 3
A sinistra rábula de Volodymyr Zelensky (ex-presidente da
Ucrânia) e dos seus comparsas locais durante a visita que fez a Portugal
José Catarino Soares
Volodymyr
Zelensky fez uma visita-relâmpago a Portugal, dia 28 de Maio de 2024. «Foi um dia de festa para a democracia portuguesa»,
declarou Sebastião Bugalho, o candidato cabeça de lista da AD [PSD + CDS+ PPM] às
eleições para o Parlamento Europeu.
28 de Maio de 2024. Marcelo Rebelo de Sousa, Zelensky e Luís Montenegro, no aeroporto militar de Figo Maduro. Foto: Tiago Petinga. Lusa. |
O
presidente da república portuguesa, Marcelo Rebelo de Sousa, e o
primeiro-ministro, Luís Montenegro, concordam certamente com a opinião de
Bugalho porque foram ambos receber Zelensky ao aeroporto militar do Figo
Maduro, com honras militares, como se Zelensky fosse o presidente de um país de
primeira importância para Portugal e uma grande individualidade política, digna
do respeito, da estima e da admiração dos portugueses.
Mas
Zelensky não é nada disso.
1. Zelensky nunca foi
flor que se cheire
―
Zelensky é um comediante corrupto, cuja avultada fortuna pessoal (estimada em
30 milhões de dólares americanos pela revista americana Forbes, em 21 de
Abril de 2022) foi transferida para paraísos fiscais (segundo revelaram os Pandora Papers
[1]),
para o seu dono poder fugir aos impostos pagos pelo comum dos seus concidadãos.
―
Zelensky é um político oportunista e manhoso, cuja candidatura à presidência da
República da Ucrânia foi concebida, promovida, patrocinada e financiada por um
dos oligarcas mais ricos e corruptos da Ucrânia, o senhor Ihor Kolomoysky [2], que,
entretanto, caiu em desgraça e está preso, desde Setembro de 2023, acusado de
fraude, branqueamento de capitais, peculato e evasão fiscal [3].
―
Zelensky é um presidente que foi eleito, em Abril de 2019, com um programa que parecia
incluir, como sendo o seu ponto principal, acabar com a guerra na Donbass,
contra a República Popular de Donetsk (RPD) e a República Popular de Lugansk
(RPL), por meios diplomáticos [4] — ou seja, através do respeito escrupuloso dos Acordos
de Minsk (Minsk-1, assinado em 2014, e Minsk-2, assinado em 2015).
Estes
acordos, que poucos leram [5] e dos quais raramente se fala para
compreender e explicar a tragédia das duas guerras na Ucrânia (a de 2014-2022, circunscrita
à Donbass; e a de 2022-202?), foram celebrados entre a Ucrânia e essas duas repúblicas
nascidas da rebelião das populações russas, russófonas e russófilas da Donbass
contra o golpe de Estado sangrento de Maidan (Quieve), em 21-22 de Fevereiro de
2014, o derrube inconstitucional do presidente da Ucrânia livremente eleito, Viktor
Yanukovytch, e o ataque cerrado aos seus direitos linguísticos e culturais.
Convém
lembrar que os predecessores de Zelensky, Oleksandr Turchinov (não eleito) e
Petro Poroshenko (eleito no rescaldo do golpe de Estado de Maidan e, por isso, praticamente
sem oposição), violaram sistematicamente os Acordos de Minsk a ferro e fogo,
com a conivência da Alemanha e da França, os garantes do seu cumprimento por
parte da Ucrânia [6].
Foi
essa aparente intenção de pôr fim à guerra civil na Donbass por meios pacíficos
e diplomáticos que constituiu uma das causas contribuintes do êxito eleitoral
de Zelensky, se não mesmo a causa contribuinte principal. Zelensky foi eleito presidente
da República da Ucrânia à segunda volta, contra o presidente cessante,
Poroshenko, com uma maioria (73,2%) dos votos expressos (62,1% dos eleitores
inscritos), e tomou posse em 21 de Maio de 2019 para um mandato de cinco anos.
Mas
esse ponto fundamental que engalanava o seu programa eleitoral foi abandonado,
assim como outros, menos de 2 anos depois, como mostrei noutro lugar [7]. A
guerra na região da bacia hidrográfica do rio Donets, conhecida como Donbass, prosseguiu
com Zelensky, tal como tinha prosseguido com Turchinov e Poroshenko. É por isso
que as suas vítimas civis são tão numerosas. Mais de 80% das vítimas civis até
31 de Dezembro de 2021 resultaram dos bombardeamentos das tropas ucranianas às
zonas residenciais, comerciais e de lazer da RPD e da RPL [8]. Mas
isso raramente ou nunca é dito pelo sistema mediático dominante de comunicação
social do chamado “Ocidente alargado” ou pelos
numerosos comentadores ao seu serviço.
A
guerra brutal e impiedosa que Zelensky e os seus predecessores travaram durante
oito anos contra as populações russas, russófonas e russófilas da RPD e da RPL,
em total desrespeito pelos Acordos de Minsk, foi uma das duas causas
contribuintes da chamada “Operação Militar Especial”
(OME) que a Rússia desencadeou em 24 de Fevereiro de 2022 [9].
O
que as populações russas, russófonas e russófilas da RPD e da RPL tiveram de
sofrer durante esses 8 anos de guerra representa um calvário que não terminou
em 24 de Fevereiro de 2022. O ódio mortal que o regime de Zelensky vota aos
seus ex-concidadãos dessas repúblicas, assim como, mais amplamente, às
populações russas, russófonas e russófilas do leste e sul da Ucrânia, parece
ter crescido ainda mais após o início da OME.
Um
exemplo disso, entre muitos outros, é o ataque aéreo que as tropas ucranianas lançaram
sobre uma zona residencial e comercial da cidade de Donetsk em 18 de Setembro
de 2022, cujos efeitos devastadores o jornalista português Bruno Amaral de
Carvalho presenciou e relatou.
«Se há dias que sei que não vou esquecer na minha vida, um deles é o dia 19 de Setembro de 2022. Estou no meu apartamento quando cai a informação de que um míssil atingiu a Praça Comissários de Baku e de que há mortos. Tento chamar um táxi, mas, uma vez mais, é impossível convencer alguém a levar-me àquele local. Trato de ligar ao Texas [a alcunha de Russell Bentley, um americano natural do Texas que se alistou como voluntário no Batalhão Vostok e no Batalhão XAH Spetsnaz das milícias populares da República Popular de Donetsk por simpatizar com a sua causa. Combateu nessas milícias em 2014, 2015 e 2017, antes de se converter em jornalista independente e correspondente de guerra na Donbass [10], n.e.]. Aparece logo depois com o seu Lada Niva e partimos par Kuibyshevsky.
Russell Bentley (1960-2024), conhecido como Texas, aqui na RPL, numa foto publicada no X em 4 de Abril de 2024. |
Quando saio do carro, deparo-me com um cenário de horror. Ainda a cerca de 50 metros da tragédia, tenho de caminhar com cuidado para não pisar orelhas, mãos e outras partes das 13 vítimas mortais deste ataque da artilharia ucraniana contra esta zona residencial e comercial de Donetsk. Junto a uma mercearia completamente destruída há pelo menos cinco corpos visíveis ou o que resta deles. Duas crianças morreram neste ataque. Uma mulher tem apenas metade do corpo e está de olhos abertos. Atónitos, como eu. A jornalista canadiana da RT, Eva Bartlett, contou-me depois que quando chegou viu um homem de barriga aberta e ao lado o seu telemóvel que ainda tocava música. /.../
No mesmo dia, noutra
parte da cidade morreram mais três pessoas. É o pior dia na cidade desde que em
14 de Março [de 2022] um míssil Tosha-U lançado pelas forças ucranianas
matou 23 civis, sobretudo idosos que esperavam à porta de um banco para
levantar a reforma.
Regresso a casa em
silêncio. Não me saem da cabeça os olhos da mulher nem o corpo da criança com o
cabelo chamuscado. No dia seguinte, regresso ao mesmo lugar. Há dezenas de
ramos de flores, vários peluches e uma bandeira de Marrocos, em homenagem ao
dono de uma loja que vendia Kebabs e que foi uma das vítimas mortais do ataque»
[11]. [n.e.= nota editorial]
2. O acordo de
Istambul que Zelensky negociou e repudiou
―
Zelensky é um presidente que celebrou em Istambul, em fins de Março/princípios
de Abril de 2022, apenas seis semanas depois do início da OME, um acordo com a
Rússia para pôr um fim imediato à guerra.
Sabemos
⎼ através de múltiplas
fontes insuspeitas de qualquer simpatia pela Rússia (The Telegraph, Ukrayinska
Pravda, Berliner Zeitung, Wall Street Journal, Die Welt,
Figaro, entre outras), dos testemunhos directos de Naftali Bennett (ex-primeiro-ministro de Israel) e de Gerhard Schröder (ex-chanceler da Alemanha), que foram ambos mediadores das negociações conducentes a esses acordos, e dos testemunhos directos de alguns dos membros da
delegação ucraniana que participou nessas negociações (Davyd Arakhamia, Oleksandr
Chaliy, Oleksiy Arestovych) ⎼ que
o Acordo de Istambul era muito favorável à Ucrânia. Os pontos principais desse
acordo eram os seguintes:
As tropas russas
retirar-se-iam do território ucraniano e, em troca, a Ucrânia (i) declarava
a sua neutralidade militar (com a concomitante renúncia à sua intenção [a] de
aderir à OTAN (/NATO); [b] de instalar armas nucleares, de fabrico
próprio ou alheio, em território ucraniano; [c] de acolher bases
militares, agências de espionagem e/ou tropas estrangeiras no seu território), recebendo, em contrapartida, garantias de segurança dadas pelos Estados-membros do Conselho de Segurança da ONU; (ii)
reconhecia, de uma vez por todas, a Crimeia como uma república autónoma da
Federação Russa [ver nota #]; (iii) garantia o respeito pela autonomia política,
cultural e administrativa da RPL e da RPD no quadro de uma solução negociada
semelhante, por exemplo, à do Tirol do Sul; (iv) garantia o respeito
pelos direitos linguísticos e culturais das demais populações russófonas e
russófilas da Ucrânia.
―
Zelensky é o presidente que acabou, 10 dias depois, por repudiar esse acordo que
negociara com a Rússia; um acordo que teria poupado a vida a centenas de
milhares de soldados ucranianos (e a dezenas de milhares de soldados russos); que
teria evitado que 300 mil militares ucranianos ficassem estropiados [12];
que mais de 32.100 civis morressem (10.946) ou ficassem feridos (21.946) na
Ucrânia, na RPD, na RPL e na Rússia [13]; que a RPD, a RPL e os oblasti de Kherson e Zaporíjia tivessem sido
integrados na Rússia; que 6,4 milhões de ucranianos procurassem refúgio noutros
países, dos quais 5,9 milhões na Europa (incluindo a Rússia e a Bielorrússia),
sendo a grande maioria mulheres e crianças, e que milhões de outros se vissem
forçados a deslocar-se internamente no seu país, além de enormes destruições
materiais em todos esses territórios.
E
porquê e para quê? Para fazer a vontade aos EUA, ao Reino Unido, à Alemanha e à
França, cujos governantes se puseram de acordo para enviar a Quieve, em 9 de
Abril de 2022, como seu mensageiro, o senhor Boris Johnson, à época
primeiro-ministro do Reino Unido. Segundo o jornal ucraniano Ukrayinska
Pravda, a mensagem que Boris Johnson, no duplo papel de deus Mercúrio e de
demónio Mefistófeles, levou a Zelensky foi muito simples e clara:
«Se o
senhor fizer um acordo com Putin, nós nunca mais ajudaremos a Ucrânia em nada. Fica
por sua conta. Se, pelo contrário, o senhor se dispuser a combater a Rússia
para a enfraquecer e derrotar, custe o que custar, pode contar com o apoio
total dos nossos Estados e de todo o “Ocidente alargado”».
Zelensky
escolheu sacrificar o seu povo e o seu país para servir os desígnios do “Ocidente alargado” [14].
3. Zelensky soma e
segue
Numa
entrevista que deu ao The Guardian em 31 de Maio de 2024, apenas três dias
depois da sua visita a Portugal, Zelensky afirmou:
«“Se a Rússia ganhasse
na Ucrânia, Putin procuraria reformular ainda mais as fronteiras da Europa,
atacando outras nações”. “Esta é a verdadeira terceira guerra mundial”. E
enfatizou: “Não acho que Putin seja louco. Ele é perigoso. O que é muito mais
assustador. Entendam, ele não vai parar”».
(A) Os
oito anos (2014-2022) durante os quais a Ucrânia desrespeitou constantemente e
a ferro e fogo os Acordos de Minsk sobre a
região da Donbass sem que a Rússia (o garante dos acordos por parte da RPD e da
RPL) tivesse reagido militarmente;
(B) A
“Proposta de Acordo sobre medidas para garantir a
segurança da Federação Russa e dos Estados membros da Organização do Tratado do
Atlântico Norte [OTAN]” e a “Proposta de
Tratado entre os Estados Unidos da América [EUA] e a Federação Russa [Rússia] sobre as garantias
de segurança” que a Rússia apresentou à OTAN e aos EUA no mesmo dia (17
de Dezembro de 2021) e que foram ambas [15] liminarmente
rejeitadas pelos seus destinatários sem qualquer discussão ou contraproposta, e
(C) o teor dos acordos de Istambul que Zelensky celebrou com a Rússia no fim de Março/princípio de Abril de 2022 e que ele repudiou 10 dias depois,
—
são a melhor prova de que Zelensky é um mentiroso contumaz.
Além
de mentiroso contumaz, Zelensky é ignorante, irresponsável e provocador. Na
mesma entrevista ao The Guardian, afirmou que gostaria de poder dar
ordem às tropas ucranianas para utilizarem os mísseis de longo alcance Storm Shadow (que
lhe foram fornecidos pelo Reino Unido), também conhecidos por Scalp, o seu nome francês (que lhe foram
fornecidos pela França); o sistema M142 lançador múltiplo de foguetes HIMARS e o sistema MGM-140 de mísseis balísticos
tácticos do exército ATACMS (que lhe
foram ambos fornecidos pelos EUA), para atacar em profundidade alvos no
interior da Rússia, incluindo bases aéreas e aviões em vôo.
Há
nestas declarações de Zelensky um elemento de bravata, porque os Storm Shadow/Scalp têm
um alcance de 550 km (tal como os mísseis germano-suecos Taurus [500 km] que a Alemanha parece agora
disposta a fornecer à Ucrânia) e os HIMARS, assim como os ATACMS, têm um alcance de 300 km. Assim sendo, estes
mísseis serão, sobretudo, eficazes para atacar a Crimeia (um território russo que
Zelensky e o seu regime ainda acalentam o sonho fagueiro de conseguirem reanexar),
visto que, por exemplo, a distância, em linha recta, de Odessa a Sebastol, na
Crimeia, é de 301 km. Os restantes servirão, conjecturo, para atacar populações civis
indiscriminadamente, segundo o bem conhecido padrão que as tropas ucranianas desenvolveram
contra as populações da RPD e da RPL durante os últimos 9 anos.
Na
mesma entrevista, Zelensky confidenciou que aguardava a autorização pública,
completa e definitiva dos seus patronos e tutores ocidentais (EUA à
cabeça) para levar a cabo esses ataques em profundidade na Rússia. Quer, em
suma, poder fazê-lo com as costas quentes. Os seus patronos e tutores mais
estarolas (com Macron à cabeça) já lha concederam, entusiasticamente, excitados
com o cheiro do sangue que conseguem farejar à distância. Mas os EUA hesitam em
dar carta branca ao seu pupilo ucraniano, por temor das consequências.
E
têm razão para as temer. É que os ataques que Zelensky pretende fazer com o novo
armamento que lhe foi fornecido pelos seus patronos e tutores da OTAN (/NATO) e
da UE e com o seu público beneplácito e incentivo, não são apenas uma bravata,
nem apenas mais do mesmo. Constituem, para todos os efeitos, uma instigação
explícita para que a Rússia, se se sentir em perigo existencial e assoberbada,
recorra ao uso de bombas nucleares “tácticas” para
eliminar, de uma vez por todas, esse tipo de armamento anglo-franco-germano-sueco-americano
no território da Ucrânia, assim como os seus operadores especializados, seja
qual for a sua nacionalidade. E esse, sim, poderia ser o início da terceira e
derradeira guerra mundial, como veremos mais adiante.
4. Um Fausto de
pacotilha
Foi
este homem tenebroso que veio agora a Madrid e a Lisboa lembrar, uma vez mais,
a ajuda constante em armas, munições e dinheiro de que precisa para continuar a
guerra insana que se comprometeu a fazer até ao último soldado ucraniano (e já
sobram muito poucos…), para ficar nas boas graças dos seus patronos da OTAN (/NATO)
e da UE — em particular, dos mais poderosos (EUA, Reino Unido, Alemanha, França)
e dos mais belicosos (Polónia, Estados bálticos, Chéquia).
Fê-lo
num momento em que já não é sequer presidente da Ucrânia, visto que o seu
mandato presidencial expirou no dia 21 do corrente mês de Maio e não há, na
Constituição da Ucrânia, nenhuma maneira de o prolongar [16].
Zelensky usurpa agora o cargo de presidente da Ucrânia. Actualmente, a sua
legitimidade constitucional é nula.
O ex-embaixador da Ucrânia no Reino Unido, Davy Pristayko, alertou para as consequências em cascata desse facto.
«No exercício legítimo dos seus poderes, Zelensky nomeou todos os
governadores regionais da Ucrânia, um grande número de altos representantes do
poder executivo, vice-governadores, chefes de administrações regionais e
distritais, bem como de administrações militares e civis. Assim, com a perda de
legitimidade do Sr. Zelensky, toda a estrutura, todo o poder executivo perde a
sua legitimidade. Nenhum dos seus decretos, ordens, decisões executivas são
legítimas» [17].
Mas
que importância é que isso tem? Para os seus anfitriões, nenhuma. Por exemplo,
o presidente e o primeiro-ministro da república portuguesa fizeram questão de
recebê-lo à saída do avião com honras militares, que chegaram ao cúmulo de incluir
um desfile de todos os ramos da Forças Armadas Portuguesas: Exército, Marinha e
Força Aérea! Em seguida, trataram de lhe meter no bolso um cheque de 126
milhões de euros [18] como recompensa pelos seus inegáveis
talentos de comediante político no desempenho do ignominioso (mas auto-inebriante)
papel de um Fausto contemporâneo.
Zelensky
não desempenha, porém, o papel de um émulo real do Fausto de Marlowe ou de
Goethe: o papel de um doutor astuto, superambicioso, malévolo e erudito — como
o fizeram, por exemplo, Zbigniew Brzezinski (1928-2017) ou Henry Kissinger
(1923-2023), doutrinadores da supremacia mundial do seu país de adopção, os
EUA. O papel de Zelensky é o de um Fausto de pacotilha, como convém a um palavroso,
mentiroso, vaidoso, ignorante e superatrevido caixeiro-viajante da Pax Americana [19] —
a máscara benevolente da supremacia mundial dos EUA.
5. A Pax Americana
A
Pax Americana pode
ser descrita sumariamente através de alguns números. Os EUA fizeram 469
intervenções militares (!) desde 1789. Destas intervenções militares, 219 foram
feitas entre 1798 e 1990, e 250 foram feitas desde 1991 até 2022 [20]
— ou seja, depois do fim da Guerra Fria e da implosão da União Soviética!
No
mesmo período (1991-2022), a OTAN (/NATO), alegadamente construída para conter
a “ameaça militar da União Soviética” à Europa
ocidental, alargou-se em 5 ondas sucessivas (1999, 2004, 2009, 2017, 2020) em
direcção às fronteiras da Rússia. Esse processo representou o espezinhamento
das garantias formais dadas a Mikhail Gorbachev e Eduard Shevardnadze, em
representação da União Soviética, pelos EUA, Reino Unido e França (as três
outras potências ocupantes da Alemanha), de que a OTAN não avançaria «nem um centímetro em direcção ao Leste da Europa» — como
o afirmaram solenemente, em 1990, James Baker III [ministro dos Negócios
Estrangeiros dos EUA no governo de George H.W. Bush], Margaret Tatcher e John Major
[primeiros-ministros do Reino Unido], e François Miterrand [presidente da
França].
Isto aconteceu apesar de terem desaparecido – com a reunificação da Alemanha (1990), a dissolução do Pacto de Varsóvia (Março de 1991) e a dissolução da União Soviética (Dezembro de 1991) – todos os pretextos que levaram à criação (1949) e à manutenção da OTAN durante 40 anos. Mais: isto aconteceu apesar da Rússia ter pedido por duas vezes ‒ uma no tempo de Boris Yeltsin, outra durante o primeiro mandato de Vladimir Putin ‒ para entrar na OTAN (/NATO)…
2007. Soldados do Exército dos EUA montam guarda algures no Iraque. Foto: Associated Press. |
A
OTAN (/NATO) tem hoje o dobro de Estados-membros (32) do que tinha em 1991 (16)
e está colada às fronteiras terrestres da Rússia através da Noruega, Finlândia,
Polónia, Estónia, Letónia, Lituânia! Com a eventual entrada na OTAN (/NATO) da
Ucrânia e da Geórgia ‒ que foram ambas convidadas pela OTAN a integrar-se nela
e cujos governos há muito que expressam essa intenção e se esforçam por
concretizá-la ‒ a Rússia ficaria cercada por Estados-membros da OTAN (/NATO) ao
longo de todas as suas fronteiras terrestres europeias, salvo na fronteira com
a Bielorrússia, que não é membro dessa aliança militar com provas dadas do seu
carácter belicista.
Imagine-se
qual seria a reacção dos EUA se a Rússia pertencesse a uma aliança militar do
mesmo carácter com o Canadá e o México…
Cinco
bases aéreas da OTAN (/NATO) na Europa albergam ogivas nucleares dos EUA: Incirlik
(Turquia); Aviano e Ghedi-Torre (Itália); Kleine Brogel
(Bélgica); Büchel (Alemanha), Volkel (Holanda). Além dessas armas,
que só os EUA estão em condições de accionar, a França e o Reino Unido ‒ os
dois Estados-membros mais poderosos da OTAN, a seguir aos EUA ‒ possuem também
o seu próprio arsenal nuclear.
Mas
não é só a OTAN (/NATO) que garante a Pax Americana.
Os EUA têm, ao todo, cerca de 750 bases militares espalhadas, no mínimo, por 80 países (Portugal inclusive) e mantêm 173 mil soldados em 159 países e territórios.
A
Europa alberga pelo menos 60.000 soldados americanos. Com 33.900 efectivos, a
Alemanha tem o maior número de tropas americanas na Europa ‒ e o segundo maior
número do mundo (o primeiro é o Japão) ‒ seguida da Itália com 12.300 e do
Reino Unido com 9.300 [21].
Perguntemos então o que pensam da Pax Americana os cidadãos dos Estados-membros da OTAN (/NATO) e da União Europeia (UE).
Na
sua grande maioria não pensam nada, porque delegam nos governantes a tarefa de
pensar por eles, ou consideram-na uma grande conquista da civilização. Se assim
não fôsse, não votariam há décadas nos partidos que apoiam e sustentam a OTAN (/NATO)
e a UE, dois pilares indispensáveis da Pax
Americana, ou, o que vem a ser o mesmo, da “ordem
internacional baseada em regras” ditadas por Washington D.C.
O
seu credo ficou bem expresso nas palavras memoráveis que o tenente-general
Marco Serronha, comentador da CNN-Portugal, proferiu, sem se rir, no mesmo dia
em que Zelensky visitou Portugal:
«Realmente, o que está em
jogo neste momento é um ataque tanto da Rússia, como da China, como de outros
países, relativamente ao nosso modo de vida ocidental. É isto que está por trás
disto tudo. A Ucrânia é uma peça desse jogo».
Desgraçadamente,
há boas razões para pensar que uma visão tão tosca e distorcida da realidade é
compartilhada pela grande maioria dos portugueses [22], espanhóis,
franceses, holandeses, britânicos, belgas, polacos e assim por diante. As únicas
excepções serão, talvez, os suíços (que não fazem parte da OTAN/NATO nem da UE)
e, em parte, os austríacos, os irlandeses e os malteses (que não fazem parte da
OTAN/NATO).
Perguntemos
agora o que pensam da Pax Americana os cidadãos da Rússia. Claro está, haverá milhares
deles, talvez milhões, que pensarão o mesmo que o tenente-general Marco
Serronha. O seu “modo de vida ocidental”
depende da longevidade da Pax Americana.
Eis
alguns exemplos.
#1 O
senhor Alexei
Mordashov tem uma fortuna que está avaliada em 29,1 mil milhões de dólares
americanos. Que vai ser do seu iate Lady M, que se encontrava no porto de Imperia, no norte de
Itália quando começou a OME? Trata-se de um iate de 65 metros, construído nos
Estados Unidos há sete anos e que está avaliado em 27 milhões de dólares. Mordashov
possui também propriedades imobiliárias fora da Rússia. Uma delas é uma villa,
avaliada entre 88 e 72 milhões de dólares, na costa da Sardenha. Que vai ser
dela?
#2
O
senhor Vagit Alekperov tem uma fortuna avaliada em 24,9 mil milhões
de dólares americanos. É,
entre outras coisas, dono dos estaleiros Heesen
Yachts, nos Países Baixos, onde foi construído em 2016 o seu iate Galactica Super Nova. Que vai ser deles: o
estaleiro e o iate?
#3 O
senhor Alisher Usmanov tem uma fortuna avaliada em 18,4 mil milhões de dólares americanos.
Que vai ser do clube britânico Arsenal (que
comprou em 2007), da sua villa na Sardenha, das suas duas propriedades
no Reino Unido e do seu luxuoso iate, Dilbar,
estacionado em Hamburgo e avaliado em 600 milhões de dólares?
#4 O
senhor Roman Abramovich tem uma fortuna avaliada em 14,5 mil milhões de dólares
americanos. Que vai ser do clube britânico Chelsea,
de que é proprietário, e do seu iate Eclipse
(o segundo maior iate do mundo), que está protegido por um sistema de
defesa antimísseis, tem dois heliportos, três barcos e dois minissubmarinos e
está avaliado em 302 milhões de euros?
#5 O
senhor Dmitry Rybolovlev tem uma fortuna avaliada em 6,7 mil milhões de dólares
americanos. Que vai ser da ilha grega de Scorpios
(de que é proprietário), da sua penthouse no Mónaco (que adquiriu pela
módica quantia de 300 milhões de dólares,) e dos seus clubes de futebol: o Ás do Mónaco e o Cercle
Brugge da Bélgica?
Compreende-se
que estes cidadãos [23] e muitos outros que são, ou aspiram ser, como
eles, sintam o coração apertado e fiquem com os olhos marejados de lágrimas só
de pensarem que a União Europeia e os EUA lhes possam apresar e confiscar os
seus iates, as suas villas, os seus clubes de futebol e congelar as suas
contas bancárias só por eles terem a “infelicidade” de terem um passaporte russo
mais antigo do que todos os seus outros passaportes — israelita, cipriota,
britânico, português, etc. E logo eles, que tem um amor acrisolado ao “modo de vida ocidental” e à Pax Americana que
o protege!
É
um motivo bastante, julgo eu, para pedirem ao tenente-general Marco Serronha
que interceda por eles de modo a evitar tamanha injustiça. “Sanções económicas, sim, mas contra o povo russo, não contra
nós, os maiores activos do “Ocidente alargado” na Rússia!», poderão
clamar junto dele, sem que duvidemos um só instante da sua sinceridade.
6. Um contraponto realista
à Pax Americana
Perguntemos,
por fim, o que pensam da Pax Americana os outros cidadãos da Rússia, a grande maioria, a
centena e tal de milhões que vivem do seu trabalho e que não parasitam o
trabalho dos outros.
Estou
em crer que a resposta seria muito semelhante à que deu Nikita Tretyakov, um ex-paraquedista
russo de São Petersburgo que abraçou a profissão de jornalista na agência Regnum,
quando abandonou as Forças Armadas. No seguimento da OME, passou a cobrir como
repórter de guerra os combates na região da Donbass.
A
um dado momento, como nos conta o jornalista Bruno Amaral de Carvalho, a função
de jornalista (observador não participante) já não se coadunava com os
sentimentos que Nikita Tretyakov nutria sobre o que observava e reportava. Por
isso, comprou uma carrinha Boukhanka e passou a organizar missões de ajuda
humanitária às populações que vivem isoladas no teatro de guerra da Donbass. Meses
depois, sentiu que o seu trabalho de auxílio humanitário também já não era
suficiente para satisfazer a sua vontade de ajudar a população martirizada da
Donbass. E decidiu abandonar o jornalismo e alistar-se como voluntário nas
Forças Armadas da Rússia.
Foi
ferido quatro vezes em combate e foi na quarta vez que esteve hospitalizado que
Bruno Amaral de Carvalho o entrevistou. São suas as palavras seguintes sobre a
segunda guerra na Ucrânia (a que começou a 24 de Fevereiro de 2022):
«Podia ter sido um
conflito regional agudo sobre um conjunto de questões muito particulares e
específicas. E poderia ter sido resolvido rapidamente e de forma muito, muito
menos dolorosa. Mas o Ocidente resolveu utilizar este conflito para desestabilizar
a Rússia, talvez para a derrotar de uma vez por todas. E fizeram deste conflito
uma questão global. Fizeram deste conflito um conflito sobre o futuro da
Rússia. Fizeram deste conflito uma situação de vida ou de morte. E agora é a vez
de nos defendermos de todo o armamento ocidental, da animosidade ocidental, da
pressão ocidental, das sanções ocidentais, da guerra multilateral ocidental.
Não estou a falar apenas de armamento, estou a falar de guerra de informação,
guerra social, guerra económica. Por isso, infelizmente, não nos foi dada outra
opção senão lutar até ao fim. Não fomos nós que escolhemos lutar contra o
Ocidente. É o Ocidente que se recusa a ver a Rússia como algo mais do que o seu
inimigo. E nós vamos actuar em conformidade» [24].
7. A ultima ratio regum
A
única coisa que ficou por dizer ‒ talvez porque Tretyakov nos quis poupar
arrelias que nunca mais nos deixassem dormir sossegados, ou talvez porque
conserve (como eu) uma réstia de esperança de que a Rússia não vai precisar de chegar
a essa extremidade para se defender de um eventual ataque de uma coligação de
Estados-membros da OTAN (/NATO) ‒ foi que “actuar em conformidade”,
na doutrina militar e nuclear russa, implica empregar a ultima
ratio regum (o armamento nuclear), se a existência da Rússia como
país uno, multiétnico e soberano estiver gravemente ameaçada.
E
se isso acontecer, o mais certo é irmos todos para o maneta num ápice, incluindo
o tenente-general Marco Serronha, Sebastião Bugalho, Marcelo Rebelo de Sousa,
Luís Montenegro, Nuno de Melo [que é, para quem não saiba, presidente do CDS,
ex-deputado europeu e, desde há um mês, ministro da Defesa de Portugal], Emmanuel
Macron, Olaf Scholz, Rishi Sunak, Ursula von der Leyen, Jens Stoltenberg, Joseph
Borrell e todos os demais grandes figurões deste mundo.
Os
poucos que, porventura, escaparem à devastação inicial decorrente do calor
abrasador e da tremenda onda de choque resultantes das explosões nucleares, por
terem conseguido refugiar-se a tempo num bunker especialmente construído
para abrigar a fina-flor do entulho (Biden, Blinken, Austin, Sullivan, Kirby,
Nuland, etc.), morrerão, mais tarde ou mais cedo, sem terem conseguido pôr o
nariz cá fora por causa do excesso de radiação, fumo e fuligem presentes na
atmosfera. E a sua descendência, se a tiverem, acabará por morrer também dentro
dessas masmorras de luxo devido aos efeitos devastadores do Inverno nuclear
sobre a biosfera terrestre.
E foi este risonho destino que Zelensky nos veio aqui vender, em troca de o ajudarmos a perpetuar-se no poder até ao último sopro de vida dos seus compatriotas dos 25 aos 60 anos capazes de empunhar uma arma!
……………………………………………………………………………….
P.S. [8-06-2024] Anteontem, dia 6 de Junho de 2024,
o presidente da Rússia, Vladimir Putin, deu uma extensa conferência de imprensa
(3h12m) aos responsáveis máximos das agências noticiosas nacionais e
estrangeiras acreditadas na Rússia, durante a qual respondeu longamente a todas
as perguntas que lhe foram feitas.
Claro está, Putin é “infrequentável” (como disse há tempos uma conhecida comentadora portuguesa) para os governantes e opinadores do chamado “Ocidente alargado”. Por isso, a conferência de imprensa de Putin nunca será transmitida nos canais de televisão portugueses (RTP, SIC, TVI, CNN-Portugal, etc.), nem será transcrita nos jornais portugueses de grande circulação (Expresso, Público, Correio da Manhã, DN, JN, etc.). As próprias agências noticiosas estrangeiras presentes na conferência farão uma selecção de passagens que acharem mais polémicas e/ou resumos enviezados de tudo o que nela se passou para divulgação aos seus clientes. O essencial ficará por dizer ou será dito de uma maneira distorcida.
Mas quem tiver tempo e curiosidade e souber inglês, poderá ver essa conferência de imprensa na íntegra, aqui [https://odysee.com/@Overthrown:6/putin-newsagencies-meeting-full:c], com legendas em inglês. Vale bem a pena. Entre muitos outros motivos, serve para imaginarmos se Biden, ou Macron, ou Sunak, ou Scholz, ou Ursula von der Leyen, ou Borrell, ou Charles Michel, etc., teriam a preparação intelectual, a presença de espírito e a perspicácia necessárias para se atreverem a enfrentar uma prova semelhante. Em minha opinião, nem pensar. Comparados com Putin, os indivíduos supramencionados são todos eles verbos de encher. Independentemente de se gostar ou não do homem e de se concordar ou não com o que ele diz, faz ou fez, a verdade é que ele deixa a concorrência a grande distância, mesmo tendo em conta todas as suas ilusões, limitações e tergiversações no passado, oportunamente lembradas por Whale Project num dos seus comentários [Estátua de Sal, Junho 5, 2024 às 6:21 am]. Mas que cada um(a) veja, se quiser, a dita conferência de imprensa e tire as suas próprias conclusões neste particular.
Os pontos que quero salientar nessa conferência de imprensa são dois. O primeiro diz respeito às condições necessárias e suficientes para o uso de armamento nuclear previsto na doutrina militar e nuclear russa em relação com a autorização solicitada por Zelensky e o seu regime para usarem as armas de longo alcance (foguetes e mísseis) que os EUA, Reino Unido, França e Alemanha lhes forneceram para atingir alvos no interior da Rússia. A pergunta foi feita directamente a Putin e a resposta que ele deu confirma a análise que eu fiz nas secções 3 e 7 do meu artigo publicado mais acima.
Quem não tenha tempo ou paciência para ver a conferência toda, poderá ver o trecho relevante aqui [https://www.youtube.com/watch?v=-fJtzsKraLg], com legendas em inglês, começando no momento 6m 48s até ao minuto 9.
O segundo ponto a salientar tem a ver com o modo como Zelensky e o seu regime vão utilizar as armas de longo alcance que lhes foram fornecidas pelos seus patronos e tutores para atingir a Rússia em profundidade. Limitei-me a afirmar que essas armas (i) têm um alcance mais reduzido do que aquele que Zelensky apregoa, (ii) que elas são manejadas por pessoal especializado de várias nacionalidades, e (iii) que a Rússia procurará destruir umas e outro por todos os meios ao seu dispor, incluindo, como “ultima ratio regum”, armas nucleares ditas “tácticas”, se vir a sua existência gravemente ameaçada. Mas não desenvolvi o tema (ii) por falta de conhecimentos militares.
Afortunadamente, o coronel Carlos Matos Gomes veio, dois dias depois, colmatar essa lacuna e explicar-nos como é que a coisa funciona (ver “O GPS e a mentira política”, https://estatuadesal.com/ 2024/06/06/o-gps-e-a-mentira-politica/).
1.º) «Quer a guerra na Ucrânia quer a chacina de Gaza estão dependentes de um sistema de localização e comunicação de dados que é propriedade do governo dos Estados Unidos: o GPS. /…/ Sem o GPS fornecido pelos Estados Unidos nenhum míssil disparado da Ucrânia voa para qualquer alvo nem qualquer avião israelita descola para bombardear escolas e hospitais. O GPS é propriedade do Departamento de Defesa dos Estados Unido. Também debaixo do completo controlo da administração americana está a rede de satélites de espionagem / observação, e de comunicações, incluindo a rede Starlink de Elon Musk que fornece as comunicações na Ucrânia. Isto é, toda a informação de referenciação de alvos na Ucrânia, na Rússia e em Gaza está sob o controlo direto dos Estados Unidos»
2.º) «[A] rábula da limitação de emprego de armas ocidentais na Ucrânia. As armas fornecidas pelo Ocidente — sejam espanholas, alemãs, inglesas, polacas, lituanas — são armas americanas, que têm os chips americanos e que só podem ser empregues nas condições que os Estados Unidos, enquanto proprietários, autorizam».
Putin, na referida conferência de imprensa, corrobora a análise de Carlos Matos Gomes neste particular. Ver o trecho que vai do momento 0 minutos até ao momento 6 minutos e 48 segundos, do vídeo [https://www.youtube.com/watch?v=-fJtzsKraLg].
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Notas e Referências
[1] Elena Loginova, “Pandora Papers Reveal Offshore
Holdings of Ukrainian President and his Inner Circle.” OCCRP/Slidstvo.Info,
3 October 2021; “Zelensky apanhado nos Pandora Papers com contas offshore.” Correio
da Manhã, 6 de Agosto de 2022.
[2] Ver
as secções “2.2. Kolomoysky, patrocinador de Zelensky; 2.2.1. Kolomoysky,
patrocinador de Zelensky (II); 2.2.2. Kolomoysky, patrocinador de Zelensky (III)”,
in José Catarino Soares, “Volodymyr Zelensky é «a
figura do ano 2022» (para o Financial Times, a Time, etc.). É, de
facto, mas pelas piores razões”. In blogue Tertúlia Orwelliana.
[https://tertuliaorwelliana.blogspot.com/2023/02/volodymyr-zelensky-e-figura-do-ano-2022.html]
[3] “Court in Ukraine extends Ihor Kolomoisky’s custody
remand until June 2”. Ukrinform,
29 May 2024.
[4] Digo
“parecia incluir” porque, de facto, Zelensky
nunca escreveu uma linha sobre este candente assunto que o comprometesse a
respeitar os Acordos Minsk (a solução para a paz na Donbass). O que aconteceu
foi outra coisa, bem diferente. Em Dezembro de 2018, Zelensky deu uma longa
entrevista ao jornalista Dmitry Gordon, onde falou, pela primeira vez, da sua
visão sobre como resolver o conflito armado em Donbass. Passo a citar o trecho
mais relevante, para o meu presente propósito, da transcrição parcial e do
resumo que encontrei em duas fontes distintas: respectivamente, Vladyslav
Bulatchik, “Presidential election: Volodymyr Zelensky about war and peace” (OstroV,
January 25, 2019) e “Zelenskyi on the war in Donbas: Although he is ready to
negotiate with the bald devil” (Ukrainska Pravda, 26 December 2018).
«Segundo ele [Zelensky], será
necessário conversar directamente com os russos («porque não faz
sentido conversar com os dirigentes da República Popular de Donetsk [RPD] e da República Popular de Luhansk [RPL] que são
fantoches dos russos»), sentar-se à mesa de
negociações, oferecer as suas opções e ouvir os adversários. Depois de compilar
a lista das exigências de uns e de outros, será possível encontrar «um meio termo» que satisfaça todos, acredita Zelensky. Segundo o
artista [i.e. Zelensky], será então
necessário divulgar o acordo à população e, em seguida, submetê-lo a um
referendo ou a votação electrónica. Quase imediatamente após a sua declaração
sobre a sua intenção de se candidatar à presidência, Volodymyr Zelensky
dirigiu-se aos ucranianos com um pedido para o ajudarem na elaboração de um
programa eleitoral. Pediu a todos que lhe dissessem por escrito quais eram os
cinco principais problemas da Ucrânia a resolver. Uma semana depois, os
resultados preliminares do inquérito, com base em mais de 120 mil respostas,
foram publicados no canal oficial da “equipa de Zelensky” na rede social Telegram.
A “Guerra
no Leste da Ucrânia” apareceu como estando
em primeiro lugar. Consequentemente, o tema da paz em Donbass pode ser uma das
chaves na campanha eleitoral de Zelensky». A ideia de que Zelensky era
favorável a uma solução pacífica da guerra na Donbass contra a RPD e a RPL vem do
resultado dessa auscultação ao povo que Zelensky nunca se comprometeu a
cumprir, salvo sob a forma caricata que expôs na entrevista: iniciar uma ronda
negocial com a Rússia sobre a situação na Donbass… excluindo das negociações os
seus principais interessados: a RPL e a RPD!
[5] Traduzi os Acordos de Minsk na íntegra e publiquei-os como
anexos (3 e 4) do meu artigo “As guerras na Ucrânia eram evitáveis: os acordos
de Minsk (2014-2015) e as propostas de tratado da Rússia (2021)”. In blogue Tertúlia Orwelliana [https://tertuliaorwelliana.blogspot.com/2022/08/tanta-omissaodeliberada-tanta-mentira.html].
[6] Ver
a secção 1 do meu livro, Dissipando a Névoa Artificial da Guerra: um roteiro para o
fim das guerras na Ucrânia, a paz na Europa e o desarmamento nuclear universal (Editora
Primeiro Capítulo, Agosto de 2023).
[7] Ver
a secção 3 do meu artigo “Volodymyr Zelensky é «a figura do ano 2022» (para o
Financial Times, a Time, etc.). É, de facto, mas pelas piores razões”.
Blogue Tertúlia Orwelliana [https://tertulia orwelliana.blogspot.com/2023/02/volodymyr-zelensky-e-figura-do-ano-2022.html] e a secção 1 do meu livro Dissipando a Névoa Artificial da Guerra: um roteiro
para o fim das guerras na Ucrânia, a paz na Europa e o desarmamento nuclear universal (Editora
Primeiro Capítulo, Agosto de 2023).
[8]
Em 31 de Dezembro de 2021, quando a guerra da Ucrânia contra a RPL e a RPD já
ia no seu sétimo ano consecutivo, o número das suas vítimas já andava entre as 51.000
e 54.000. O número de mortos andava entre os 14.200 e 14.400, dos quais 3.404
civis, 6.500 membros das milícias populares de autodefesa da RPD e da RPL,
4.400 elementos das tropas ucranianas. O número de feridos andava entre os
37.000 e 39.000, dos quais 7.000 ⎼
9.000 civis, 15.800 ‒16.200 membros das milícias da RPD e da RPL, 13.800 ⎼ 14.200 soldados das
tropas ucranianas. Os números são do Alto-Comissariado dos Direitos Humanos da
ONU.
[9] Cf.
secção 1 do livro Dissipando a Névoa Artificial da Guerra: um roteiro para o fim das guerras
na Ucrânia, a paz na Europa e o desarmamento nuclear universal (Editora Primeiro
Capítulo, Agosto de 2023).
[10] Russell Bentley [“Texas”] desapareceu misteriosamente no dia 8 de Abril 2024 nos arrabaldes da cidade de Donetsk (RPD), numa zona onde decorriam combates entre tropas ucranianas e russas. O seu cadáver foi encontrado 11 dias depois. Desconhece-se as causas tanto do seu desaparecimento como da sua morte, que estão a ser investigadas pela polícia da RPD.
[11] Bruno
Amaral de Carvalho, A Guerra a Leste. Oito meses no Donbass (Editorial
Caminho. Abril de 2024), pp. 157-58.
[#] José Catarino Soares, “Quem anexou a Crimeia: a Rússia ou a Ucrânia?”. In blogue Tertúlia Orwelliana [https://tertuliaorwelliana.blogspot.com/2022/08/falsidades-e-mentiras-1.html]
[12] O
número de estropiados de guerra foi divulgado recentemente pela mulher de Volodymyr
Zelensky. Ver “Olena
Zelenska at the meeting of the Barrier-Free Council: «Barrier-free means when
it's convenient for everyone without exception»”. President
of Ukraine, Official website. 29 March 2024. Olena
Zelenska não clarifica o estatuto (civil ou militar) dos estropiados. Mas julgo
que podemos inferir com segurança que se compõem maioritariamente de militares,
visto que, se assim não fôsse, o número de feridos civis contabilizado pelas agências
da ONU (21.946) seria muitíssimo superior.
[13] Os
números são da UN Human Rights Monitoring Mission in Ukraine (HRMMU) e reportam-se
a Abril de 2024.
[14] Analisei exaustivamente esse processo numa série de artigos intitulada “Em 9 de Abril de 2022 Zelensky preferiu a guerra à paz pelos motivos mais mesquinhos”, in Estátua de Sal
[15] Traduzi
na íntegra estas duas propostas da Rússia e publiquei-as como anexos (1 e 2) do
meu artigo “As guerras na Ucrânia eram evitáveis: os acordos de Minsk
(2014-2015) e as propostas de tratado da Rússia (2021)”. In blogue Tertúlia Orwelliana [https://tertuliaorwelliana.blogspot.com/2022/ 08/tanta-omissaodeliberada-tanta-mentira.html].
[16] Mas
ai de quem se atreva a dizer que o rei vai nu, como fizeram, por exemplo, dois
deputados independentes do Verkhovna Rada (parlamento ucraniano): Dmytro Razumkov (ex-presidente
desse parlamento) e Alexander Dubinsky, quando afirmaram que o mandato
presidencial de Zelensky tinha terminado.
Foram imediatamente acusados de difundir propaganda russa e de nada lhes
valeu terem sido ambos membros do partido O Servente do Povo de
Volodymyr Zelensky. Dubinsky, por exemplo, escreveu no seu canal do Telegram:
«Os poderes do Presidente da Ucrânia expiram na noite
de 20 para 21 de Maio de 2024 e não podem ser prolongados. Depois de 20 de Maio,
a Rada será legítima, mas o Presidente não será». Isto porque a Constituição
ucraniana estipula que a autoridade do parlamento deste país deve ser
prorrogada até ao termo da lei marcial. No entanto, a Constituição não contém
disposições explícitas semelhantes no que respeita às eleições presidenciais. Dubinsky
argumenta que a única situação em que o Presidente pode continuar a desempenhar
as suas funções após o termo do seu mandato é o período até à tomada de posse
do presidente eleito. Mas isso exige a realização de eleições e a eleição de um
novo presidente. Entretanto, sob a lei marcial [o equivalente em Portugal ao “Estado
de sítio”], que foi mais uma vez prorrogada na Ucrânia, é impossível realizar
eleições. Dubinsky encontra-se actualmente num centro de detenção preventiva. É
acusado de traição de Estado por envolvimento numa campanha mediática sobre as
polémicas gravações áudio de uma conversa entre Joe Biden, então
vice-presidente dos EUA, e Petro Poroshenko, então presidente da Ucrânia,
confirmando a interferência de Washington nos assuntos internos da Ucrânia (“Zelensky's
presidential powers to expire May 21”. Tass,
February 13, 2024; “Ukrainian president mulls seeking legal advice from top
court as his 5-year term expires on May 20”. Anadolu Agensi, 27 February
2024; “Zelensky’s term would have expired this month, but he’s staying. Russia
wants to use it”. The Kyiv Independent, May 6, 2024).
[17]
“Officials appointed by
Zelensky no longer legitimate since May 21”. Tass,
May 30, 2024.
[18] Li
depois, na imprensa, que 100 milhões de euros (dos 126 milhões) de ajuda
militar à Ucrânia já tinham sido gastos pelo governo anterior (de António Costa)
no programa europeu de compra conjunta de munições promovido pela Chéquia. “Governo
anuncia 126M€ para a Ucrânia. Mas 100M€ já foram pagos por António Costa”. Diário
de Notícias, 28 de Maio de 2024.
[19] Pax Americana é
uma pomposa locução latina que os políticos, geopolitólogos, gestores empresariais, investidores e
jornalistas do Blob americano gostam de usar para dizer Paz Americana.
[20]
Cf. Barbara Salazar Torreon
& Sofia Plagakis, “Instances of Use of United States Armed Forces Abroad,
1798-2022”. Congressional Research Service, March 8, 2022.
[21] “Infographic: US military presence around the world”. Al-Jazeera.
10 September 2021.
[22] Uma
sondagem de opinião realizada pela Aximage, entre 17 e 22 de Maio de 2024, para
DN/JN/TSF, sobre temas da actualidade política, revelou o seguinte: uma grande
maioria dos portugueses concorda que (i) se deve entregar mais poderes à União
Europeia, (ii) quer uma força militar europeia de reacção rápida, (iii) defende
a criação de um fundo comum que financie o investimento nas indústrias de
defesa e (iv) aprova o fim da regra da unanimidade no Conselho Europeu — ou
seja, o fim da possibilidade de qualquer Estado-membro da UE exercer um “direito
de veto” sobre decisões de que discorde
(cf. “Portugueses querem mais poder para a UE mas hesitam sobre um Estado
federal”. Diário de Notícias, 3 de Junho 2024.
[23] Colhi
as informações que reportei sobre estes indivíduos no artigo de Lumena Raposo,
“Quem são os oligarcas russos mais ricos que o Ocidente quer caçar”. CNN Portugal,
6 de Março de 2022.
[24] Bruno
Amaral de Carvalho, A Guerra a Leste. Oito meses no Donbass (Editorial
Caminho. Abril de 2024), pp.163-64.