Temas 2 e 3
Alegações contra o racismo 2.0
e contra Jean-Paul Sartre, um dos seus mais
célebres ideólogos
José
Catarino Soares
1.Introdução
Odair Moniz, pequeno empresário cabo-verdiano de 43 anos,
morador no Bairro do Zambujal (freguesia
de Alfragide, concelho da Amadora), foi baleado por um agente da Polícia de Segurança
Pública (PSP) na madrugada de 21 de Outubro de 2024, no bairro da Cova da
Moura, no mesmo concelho, acabando por morrer pouco depois no hospital São Francisco
Xavier, para onde tinha sido transportado.
No momento em que ultimo a escrita deste artigo (31 de
Outubro), ainda não se conhecem oficialmente as circunstâncias exactas e
modo exacto em que esta morte ocorreu. Há versões contraditórias a circular. O
caso está a ser investigado pela Polícia Judiciária (através da unidade de combate ao crime especialmente violento do Departamento de Investigação e Acção Penal [DIAP] de Lisboa) e levou à abertura de dois
inquéritos: um pela própria PSP e outro pela Inspeção Geral da Administração
Interna.
Vale a pena lembrar, a este propósito, duas coisas.
1.ª) O uso de armas de fogo por agentes policiais está legalmente
regulado e tipificado no decreto-lei n.º 457/99 de 5 de Novembro. O seu artigo
2.º (princípios da necessidade e da proporcionalidade) estipula:
«1 - O recurso a arma de fogo só
é permitido em caso de absoluta necessidade, como medida extrema, quando outros
meios menos perigosos se mostrem ineficazes, e desde que proporcionado às
circunstâncias.
2 - Em tal caso, o agente deve esforçar-se por
reduzir ao mínimo as lesões e danos e respeitar e preservar a vida humana».
2.ª) Entretanto, e enquanto não for provada a sua culpa de acordo com a lei, o agente da PSP autor do homicídio tem direito à presunção de inocência, como qualquer outro cidadão [1].
Tudo isto são trâmites processuais normais para se apurar
os factos e garantir um julgamento justo numa sociedade que acolhe o lema “nullum crimen, nulla poena, sine previa lege” [«não
há crime, nem pena, sem lei anterior que os defina»]. Mas é também algo muito difícil
ou impossível de aceitar por indivíduos e grupos que desprezam ou desconhecem o
efeito civilizador e os benefícios sociais do princípio do primado do Direito
sobre os linchamentos e a pena de talião (“olho por
olho, dente por dente”).
Assim, de 21 de Outubro a 27 de Outubro de 2024, a Área
Metropolitana de Lisboa (AML) foi palco de actos de vandalismo e de outros
actos de grande violência cometidos por indivíduos anónimos, na sua maioria
jovens, incluindo adolescentes [2], alegadamente desencadeados para
vingar a morte de Odair Moniz. Esses actos de violência tiveram início no bairro
do Zambujal (Amadora) na noite de 21 de Outubro, e estenderam-se depois a
outros bairros da Área Metropolitana de Lisboa.
Eis um quadro sinóptico desses actos de violência nos
concelhos de Almada, Amadora, Barreiro, Cascais, Lisboa, Loures, Odivelas,
Oeiras, Seixal, Setúbal, Sintra e Vila Franca de Xira.
Ocorrências registadas |
155 |
Suspeitos detidos |
22 |
Suspeitos identificados |
23 |
Polícias feridos (apedrejados) |
2 |
Cidadãos feridos (esfaqueados, queimados) |
5 |
Viaturas policiais danificadas (apedrejadas, baleadas, incendiadas) |
5 |
Atentados contra
esquadras da PSP (arremesso de engenhos pirotécnicos) |
1 |
Autocarros danificados (4 incendiados, 1 apedrejado) |
5 |
Automóveis incendiados |
16 |
Motociclos incendiados |
7 |
Fachadas de
edifícios danificadas |
3 |
Fonte: sítio electrónico da PSP, Executive
Digest.Sapo.pt
Um autocarro da Carris e automóveis incendiados nos tumultos e vandalizações na AML na semana de 21 a 27 de Outubro de 2024. Foto: Guilherme de Sousa/TSF |
Além das ocorrências
especificadas no quadro, foram ainda registados, segundo as mesmas fontes, numerosos
incêndios, propositadamente ateados, que destruíram dezenas de caixotes de
lixo, contentores de lixo e ecopontos; uma tentativa de fogo posto e de
rebentamento de petardos, e o apedrejamento de uma loja em Centro Comercial.
2. Uma notícia e um vídeo reveladores
Mas o que me chamou mais à atenção nestes tumultos foi uma notícia e um vídeo, que passo a reproduzir.
TSF. 24 outubro 2024 às 12h32
"Queimaduras graves na face, tórax e membros superiores."
Motorista de autocarro incendiado está em estado grave
De acordo com fonte da Carris
Metropolitana, o autocarro vandalizado e incendiado em Santo António dos
Cavaleiros (distrito de Lisboa) seguia sem passageiros quando se deu o
incidente.
[carregar 2 ou 3 vezes na seta de reproduzir do vídeo para ele começar]
No passado dia 26 de Outubro, enviei este vídeo, pelo Whatsapp, a alguns
amigos e conhecidos, acompanhado do seguinte comentário:
«O racismo 2.0 (o
título que dei a um ensaio que escrevi há dois ou três anos e que nunca
publiquei) é tão estúpido, obscurantista, odioso e niilista quanto o racismo
1.0. Este vídeo é um bom exemplo disso».
3. A motivação deste artigo
Para grande surpresa minha, dois velhos e bons amigos, pelos quais tenho grande
estima e alta consideração intelectual, responderam-me, pelo mesmo canal, discordando
do meu comentário.
Um deles ⎼ vou designá-lo por A para fins de referência futura ⎼ disse:
«Podemos imaginar facilmente
que, nas “nossas zonas” referidas pela jovem revoltosa, vivem brancos, de quem
o Caetano Veloso, armado em rapper, diz que são “quase pretos de tão
pobres”. Assim, se há racismo (2.0 ou outro), ele é social. Antigamente,
chamava-se “luta de classes”».
O outro ⎼ vou designá-lo por B pelas mesmas razões ⎼ disse:
«É plenamente legítima a
revolta da população do Zambujal e da dos outros guetos para onde foi confinada
a população de origem cabo-verdiana, que tem largamente servido de mão de obra
barata na construção civil portuguesa desde antes do 25 de abril. Neste
conflito com o Estado português é o seu governo e as suas polícias, assim como
os fascistas do Chega, que protagonizam o racismo /…/».
«Para se compreender
plenamente as razões da revolta da juventude negra contra a polícia racista
portuguesa era bom relembrar a caracterização dessa revolta como “racismo
anti-racista” por Jean-Paul Sartre, no seu célebre “Orpheu Negro” (prefácio à Anthologie
de la nouvelle poésie nègre et malgache, de Léopold Sedar Sanghor, Presses
Universitaires, 1948).
Vista do Bairro do Zambujal (Alfragide, Amadora), após os tumultos e as vandalizações subsequentes à morte de Odair Moniz por um agente da PSP. Foto: Nuno Fox. |
Discordo, respeitosa e amigavelmente, do essencial de ambas as opiniões. Nas
secções que se seguem deste artigo, procurarei esclarecer as razões da minha discordância,
agradecendo a A e B o ensejo e, sobretudo, a motivação que me
deram para as expor. Sem os seus estimulantes comentários adversos, eu não teria
tido a estaleca necessária para o escrever, pois não estou na plena posse das
minhas capacidades motoras.
4.
Jean-Paul Sartre
Devo dizer, antes de mais, que não tenho nenhum apreço
por Jean-Paul Sartre, como filósofo, dramaturgo, romancista, politólogo e
cidadão. Deixarei de lado os três primeiros aspectos, para me concentrar nos
dois últimos.
Como cidadão, considero-o
um poltrão (pelo seu comportamento durante a Ocupação nazi em França), um aldabrão
(pelo seu comportamento no imediato pós-2.ª Guerra Mundial) e um desavergonhado
oportunista, capaz de fazer todas as cabriolas políticas (o que efectivamente fez
durante a vida inteira).
Em 1952, quando decidiu aderir à Société des Gens de
Lettres, Sartre teve o desplante de escrever, na sua ficha biográfica, na
rubrica “guerra”, o seguinte:
«Tive uma participação activa na
resistência e nas barricadas de Paris [frase original: “Prend une part
active à la résistance et aux barricades de Paris’’]
Gilbert Joseph, um estudante do liceu que entrou na Resistência
francesa à ocupação nazi com 16 anos e que combateu no maquis de Vercors
até à grande operação de extermínio dos maquisards [os combatentes da
Resistência no maquis] e da população que os apoiava, organizada pelo
exército alemão, em Agosto de 1944 (Gilbert Joseph, Combattant du Vercors,
Fayard, 1972), escreveu um livro para desmascarar Sartre.
Capa do livro de Gilbert Joseph sobre Jean-Paul Sartre e Simone de Beauvoir |
Maurice Nadeau, na Quinzaine Littéraire n.º 585
(16 septembre 1991), apresentou o livro de Gilbert Joseph, Une Si Douce
Occupation…Simone de Beuvoir et Jean-Paul Sartre 1940-1944 [“Uma
ocupação tão doce… Simone de Beauvoir e Jean-Paul Sartre 1940-1944’’] assim:
«A tese [do livro] é simples: Sartre (assim como, evidentemente, a sua
amiga, Simone de Beauvoir) não foi um membro da Resistência. Além disso, tanto na
sua profissão de professor como nos seus escritos, nunca mostrou o menor sinal
de revolta contra o Ocupante. Submeteu-se às leis de Vichy (assinando, como
funcionário público, o juramento de lealdade a Pétain), aceitou que a sua peça
de teatro Les Mouches [As Moscas] fosse alvo de
uma dupla censura: a dos directores de teatro, colaboracionistas, [entender:
mancomunados com o ocupante nazi, n.e.] e a
do Theaterguppe alemão, e apresentou-a num teatro “arianizado”, o antigo
teatro Sarah Bernhard». [n.e.= nota editorial]
«Não há dúvidas de que o
nazismo o horrorizou. No entanto, ignorou o genocídio dos judeus e, de forma
mais geral, a política de extermínio do Terceiro Reich na Europa ocupada. Não
disse nem uma palavra sobre as rusgas em Paris, nem uma palavra sobre Drancy ou
sobre os campos de concentração nazis em geral. Desinteressou-se completamente
pelos acontecimentos».
No seu livro, Gilbert Joseph não se contenta em acenar com
esta avaliação geral. Ela é, pelo contrário, a conclusão de uma demonstração em
que o percurso de Sartre (e de Simone de Beauvoir) durante a ocupação nazi é
seguido passo a passo. O autor alinha testemunhos, compila relatórios de
inspecção e de reitoria, vasculha os arquivos.
Que eu saiba, acrescento eu, a única atitude intelectualmente
honesta que o cidadão Sartre teve durante a sua vida adulta foi recusar o
prémio Nobel da Literatura, que não merecia. Mesmo um seu biógrafo complacente,
Michel Winock, nos fornece factos suficientes para respaldar este veredicto [“Sartre s’est-il toujours trompé?”,
Michel Winock, Professor emérito no Institut d’Études Politiques de Paris].
5.
“Racismo antirracista”, um oximoro criado por Sartre
Como politólogo,
Sarte está nos antípodas de Marx, do qual nunca entendeu patavina, mas que procurou,
falaciosa e abusivamente, invocar em apoio das suas teses.
No seu ensaio Orfeu Negro, Sartre afirma, a páginas
tantas, que a noção de “raças”
[humanas] ‒ um construto pseudobiológico e fantasmagórico que os nazis
acolheram com gáudio e que utilizaram como fundamento pseudocientífico da sua doutrina
de supremacia “ariana” ‒ é, para as pessoas que
ele qualifica de “negras”, o equivalente da
noção sociológica de classe social (!!).
«A noção de raça sobrepõe-se /…/ à de classe [social], a primeira é concreta e particular, a segunda universal e abstrata; uma vem do que Jaspers apelida de compreensão e a outra da intelecção. A primeira é o produto de um sincretismo psicobiológico e a outra é uma construção metódica baseada na experiência».
Daí a sua proposição de que «o
negro [entenda-se: os indivíduos que Sartre considera terem pele de cor
negra] cria um racismo antirracista» [??!!],
apelidado de “negritude”, o qual seria uma
coisa totalmente legítima, muito progressista e revolucionária. Ou seja, um
conjunto de pessoas ditas “negras” que tomem consciência
da sua comum “negritude”, constitui, perante
um conjunto de pessoas ditas “brancas”, seja
ele qual for, o equivalente de uma classe social explorada e oprimida perante
uma classe social exploradora e opressora.
Para cúmulo, Sartre cita, em abono da sua tese do “racismo antirracista”, um poema de um poeta comunista, Jacques Roumain — “um negro” na terminologia de Sartre.
África, eu guardei a tua memória
África
tu estás em mim
Como a farpa na ferida
como um feitiço tutelar no centro da aldeia
Faz de mim a pedra da tua revolta
da minha boca os lábios da tua ferida
dos meus joelhos os pilares quebrados da tua humilhação
Todavia
eu só quero ser da vossa raça
trabalhadores e camponeses de todos os países
[ênfase, por meio de letra grossa, acrescentado ao original, n.e.]
Neste poema, Roumain desvencilha-se
da “negritude”, repudia as patacoadas da «luta racista antirracista», que Sartre gostaria de o ver
assumir, para se juntar aos «trabalhadores e camponeses
de todos os países». Pois bem, Sartre vê nesta atitude ⎼ que o autor do lema «a emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios
trabalhadores», Marx, saudaria como um desenvolvimento auspicioso ⎼ algo de deplorável:
«Estranho
caminho: humilhados, ofendidos, os negros vasculham as profundezas de si próprios
para encontrarem o seu orgulho mais secreto e quando, finalmente, o encontram,
esse orgulho põe-se a si mesmo em causa: por suprema generosidade, eles
abandonam-no, tal como Filoctetes entregou o seu arco e flechas a Neoptólemo».
Convém recordar ou informar a este
propósito, que Filoctetes, na peça de teatro homónima de Sófocles, recebeu em
herança, após a morte de Héracles [Hércules para os romanos], o arco e as flechas deste grande herói, as suas armas
imbatíveis.
6. Racismo 2.0
Numa palavra, «o racismo antirracista», do qual Sartre fez a
apologia, é uma das variantes, porventura a mais explícita, do que denomino racismo 2.0. Foi
sobre este racismo que escrevi o ensaio (que permanece inédito) que referi na
minha mensagem no Whatsapp.
É o racismo da jovem mulher do vídeo
referido na secção 2 deste artigo, a crença que a “autoriza” psicologicamente
a incitar os seus conhecidos «a ir para Lisboa»,
«para as zonas deles» [entenda-se, dos que não
são da “nossa raça”], «cortar
estradas», «partir montras», «arrebentar com tudo», «com
aquela merda toda». Só faltou dizer, matá-los a todos, às pessoas que
vivem em Lisboa, nas quais minha mulher e eu se incluem.
Não é um exagero. Este racismo, como
vimos, já fez uma vítima na semana passada, que só não foi mortal porque não
calhou: o motorista da Carris, que está hospitalizado com queimaduras muito
graves, um proletário que teve a pouca sorte de cair numa emboscada dos amigos
da jovem do vídeo e cujo autocarro foi incendiado por eles.
Autocarro incendiado no Bairro do Zambujal. Foto: Miguel A. Lopes/Lusa |
Os vídeos dos dois homens que se seguem são ainda mais explícitos (se é que é possível) no seu apelo à eliminação física dos “tugas”, porque “são uns merdas”, um “lixo de pessoas”; no seu incitamento a incendiar as suas casas, incluindo a própria Assembleia da República.
[carregar 2 vezes na seta de reproduzir dos vídeos para eles começarem]
O que uma e outros dizem é música celestial
para André Ventura e o seu partido, pois justifica da maneira mais estridente a campanha que Ventura e o Chega fazem no sentido de conferir à polícia poderes
para disparar a matar a seu bel-prazer.
O ódio “racial”
(e, por conseguinte, visceral, irracional e auto-inebriante) que escorre de
todos os poros dos indivíduos contaminados pelo racismo 2.0 é uma chama
gémea do ódio “racial” que escorre de todos
os poros dos indivíduos contaminados pelo racismo 1.0 — um racismo mais vetusto.
As formas mais virulentas do racismo
1.0 são bem conhecidas. São, por exemplo, as do racismo institucional do
regime de apartheid dos Estados do sul dos EUA depois da guerra civil
(1861-1865), sobretudo na chamada “época de Jim Crow”; do racismo institucional do regime genocida
de Hitler; do racismo institucional do regime de apartheid que existia na
África do Sul; do racismo genocida de Netanyahu e do racismo institucional do
regime de apartheid que existe em Israel; do racismo institucional do
regime neobanderista que existe na Ucrânia desde o golpe de Estado de Maidan, em 22 de Fevereiro de 2014 [3].
O racismo 1.0 e o racismo 2.0
são racismos simétricos na ideologia, embora não nos meios de destruição, mas
esta última situação pode igualar-se ou inverter-se. Depende da conjuntura. Uma
coisa é certa: são ambos irremediavelmente misantrópicos, obscurantistas,
odiosos, facínoras e niilistas. E convém acrescentar que o racismo 2.0 nada
tem a ver com a luta de auto-emancipação dos trabalhadores assalariados, como o
próprio Sartre reconheceu noutra passagem do Orfeu Negro:
«O equipamento técnico e
a industrialização dos países europeus permitem conceber que as medidas de
socialização sejam imediatamente aplicáveis; visto a partir do Senegal ou do
Congo, o socialismo aparece, sobretudo, como um belo sonho: para que os
camponeses negros descubram que é o resultado necessário de suas reivindicações
imediatas e locais, eles devem primeiro aprender a formular essas reivindicações
em comum e, portanto, que se pensem como negros [notar : como ‘negros’, não como camponeses (!), n.e.]
Mas essa consciência difere, pela sua natureza,
daquela que o marxismo tenta despertar no trabalhador branco»
Esta passagem requer dois comentários. “Marxismo” é um termo abusivo, que foi repudiado
pelo próprio Marx. «Eu não sou marxista», disse Marx
várias vezes ao seu genro, Paul Lafargue, e a outros criadores e adeptos entusiastas
dessa palavra. Por isso, a única maneira de entender o que Sartre pretende significar
com esse termo é admitir que ele se refere aos cidadãos que se reclamam (tantas
vezes sem razões válidas, como é o caso, por exemplo, do próprio Sartre) das
ideias políticas e económicas de Karl Marx e Friedrich Engels. Por outro lado, Sartre faz batota quando fala em “trabalhador branco” a propósito do “marxismo”. A palavra de ordem, “Proletários de
todos os países, uni-vos!” (no seu alemão original: “Proletarier
aller Länder, vereinigt euch!”), uma das mais famosas palavras de ordem do
socialismo, foi criada por Karl Marx e Friedrich Engels, em 1848, cem anos antes de Sartre ter publicado o seu Orfeu Negro ! De “todos os países” e, por
conseguinte, de todas as cores de pele.
«A consciência de classe do
trabalhador europeu [de novo Sartre procura, batoteiramente, restringir
a existência do salariado a um único continente, n.e.] está centrada na natureza do lucro e da mais-valia, nas
condições actuais de propriedade dos instrumentos de trabalho, em suma, nas
características objectivas da situação do proletariado».
Em contraste total, segundo Sartre,
«O homem negro que apela os seus
irmãos de cor a consciencializarem-se, tentará apresentá-los com a imagem
exemplar de sua negritude e virar-se-á para sua alma para apreendê-la. Ele
deseja ser um farol e um espelho ao mesmo tempo. O primeiro revolucionário será
o arauto da alma negra, o arauto que arrancará a Negritude de si mesmo para
entregá-la ao mundo, meio profeta, meio militante partidário, em suma, um poeta
no sentido preciso da palavra vates ».
7. As falácias do “racismo antirracista”
Todo o ensaio Orfeu Negro está impregnado ad nauseam
deste misticismo “racial” e de carácter messiânico.
A única atenuante que se poderá invocar para este misticismo
“racial” e messiânico de Sartre é que o seu ensaio,
Orfeu
Negro, foi escrito em 1948 e visava prioritariamente a população das
então colónias africanas da França, Reino Unido, Portugal e Espanha, a qual era
então, na sua esmagadora maioria, tribal, camponesa e, na terminologia de
Sartre, “negra”. Esse circunstancialismo
geográfico e histórico já foi ultrapassado no plano político, visto que todos
esses territórios são hoje países independentes onde os governantes e os governados
têm a mesma cor de pele. O “racismo antirracista”
de Sartre perdeu, por conseguinte, qualquer sedução que pudesse ter tido, outrora,
junto dos trabalhadores explorados e oprimidos desses países.
Destarte, é esse circunstancialismo geográfico e
histórico caduco que empresta, retrospectivamente, um semblante de razoabilidade
a tiradas como esta:
«A unidade final que juntará
todos os oprimidos no mesmo combate deve ser precedida nas colónias pelo que
designarei como momento da separação e da negatividade: este racismo
antirracista é o único caminho que pode levar à abolição das diferenças de
raça. Como poderia ser doutra maneira? Poderão os Negros contar com a ajuda do
proletariado branco, longínquo, ocupado com as suas próprias lutas, antes de
estarem unidos e organizados no seu terreno? E, de resto, não será necessário
todo um trabalho de análise para reparar na identidade dos interesses profundos
sob a manifesta diferença de condições?».
É precisamente esse necessário trabalho de análise que
Sartre se recusou a fazer, substituindo-o pelo misticismo “racial” e messiânico
da “negritude”.
Seja como for, o racismo de Sartre (racismo 2.0) é
ostensivo, persistente e implacável. Ouçamo-lo:
«Àqueles que, durante séculos,
tentaram em vão, pelo facto de ele ser negro, reduzi-lo ao estado de animal,
ele tem de os obrigar a reconhecê-lo como um homem. Ora, aqui não há
possibilidade de fuga, nem de batota, nem de “zona intermédia” que se possa
considerar. Um judeu, branco entre os Brancos, pode negar que é judeu,
declarar-se homem entre os homens. O Negro não pode negar que é negro nem
reclamar para si uma abstracta unidade incolor: ele é preto. Assim, está
encurralado na autenticidade: insultado, subjugado, se levanta a cabeça, é para
ouvir a palavra “negro” que lhe atiram como uma pedrada; ele reivindica-se como
negro, em face do Branco, orgulhosamente».
Traduzamos. Só um indivíduo “Branco”
pode fazer abstração da cor da sua pele, remetendo-a para o seu lugar (a de uma
característica fenotípica secundária, como, por exemplo, a altura, a cor dos
olhos, o tamanho dos pés, o volume dos seios) e declarar-se homem (ou mulher) entre
os homens (ou entre as mulheres), seja qual for a cor da pele desses homens ou dessas
mulheres. Para Sartre, o indivíduo “Negro” não
tem essa capacidade. E não a tem ⎼ repare-se ⎼ mesmo que se encontre entre os “Negros”,
mesmo que os “Negros” que o rodeiam sejam a
maioria da população do país em que vive, como acontecia (quando eram colónias)
e acontece (agora que são independentes) em todos os países da África
subsariana. Porquê? Pois, precisamente, porque é “Negro”!
O argumento, como se vê, é circular; um belo exemplo da
falácia lógica conhecida como “petição de princípio”. Impossível que Sartre não
se desse conta disso: ele era professor de filosofia e filósofo!
Prossigamos. Se um indivíduo é “Negro”,
porque deveria ele (ou ela) sentir como um insulto ou como uma pedrada que alguns
estarolas “Brancos” o apelidem de “Negro” (ou “Negra”), em
vez de o tratarem pelo nome próprio: senhor X ou senhora Z, João ou Mariana,
etc. O que é que o impede de retorquir, zombeteiramente, na mesma moeda: «Eu não me chamo Negro ou Preto. Mas se tu insistes nessa
forma de tratamento, eu faço-te a vontade e passo a chamar-te “Cor-de-burro-quando-foge”.
Concordas?».
São perguntas que Sartre deixou sem resposta, como não
podia deixar de ser.
8.
A ressurreição do ‘racismo antirracista’
O seu “racismo antirracista”,
porém, sobreviveu-lhe de uma forma inesperada. Mas não nos países onde os habitantes
são maioritariamente “Negros” (na acepção
sartriana do termo), como os da África subsariana e da Nova Guiné, onde deixou
de ter, como vimos, qualquer serventia digna de encómios, se é que alguma vez
teve alguma.
O mesmo não sucedeu nos países onde os habitantes são
maioritária ou quase exclusivamente “Brancos” (na
acepção sartriana do termo), como são os países da Europa. Foi neles que o “racismo antirracista” renasceu das cinzas pela
acção e pela palavra de pequenos grupos de activistas, frequentemente jovens, que
desenvolvem a sua actividade no seio de algumas populações de imigrantes oriundos
de outros continentes e/ou dos seus descendentes já nascidos em solo europeu [4].
Vale a pena insistir neste ponto, pela sua incongruente
novidade. Como vimos, o “racismo
antirracista” de Sartre foi feito à medida de uma população autóctone maioritária que, alegadamente, aspirava a sacudir o jugo de uma minoria dominante
e de origem forânea. Mas eis que, numa surpreendente reviravolta, alguns desses grupos, que
fazem gala em reivindicar a sua origem forânea e o seu carácter minoritário, se
apropriam dessa doutrina racista, como se ela tivesse sido feita propositadamente
à medida dos seus anseios mais profundos! As arengas alucinadas que constam dos
vídeos reproduzidos neste artigo são um
bom exemplo disso. Mas não são os únicos [5].
Porém, milagres desses não se produzem. O racismo, seja
qual for o modo de o declinar ou qualificar, nunca deixará de ser uma forma exacerbada
de misantropia, uma ideologia profundamente obscurantista, opressora e odiosa.
O “racismo antirracista” de Sartre não é
excepção, tal como o não são todas as demais formas de racismo 2.0. A
sua adopção por qualquer grupo de imigrantes ou portugueses descendentes de
imigrantes, não augura nada de bom para eles e para a sociedade. É uma receita segura para levar os membros desses grupos (como os que fizeram e se exibem ameaçadores nos vídeos referidos na secção
2 e na secção 6 deste artigo),
― a malhar com os
ossos num estabelecimento prisional de alta-segurança, mais tarde ou mais cedo [6]
― e a alimentar com esteróides o crescimento do partido Chega.
9.
A auto-emancipação colectiva e os seus métodos de acção
A luta contra a exploração e a pobreza; contra a carência e as más
condições de habitação; contra a escassez ou má qualidade de serviços sociais de
apoio e de transportes públicos; contra a boçalidade, sobranceria e brutalidade
policial; contra as ameaças, intimidações e prepotências de quadrilhas de
bandidos e traficantes de droga que parasitam os bairros populares da AML [7], não se faz recorrendo aos métodos arruaceiros,
vandálicos, facínoras e niilistas do racismo 2.0.
Faz-se com os métodos do movimento auto-emancipatório dos
trabalhadores assalariados, aprimorados e testados ao longo de dois séculos — debates
livres, escolarização, associações de ajuda-mútua, arruadas, concentrações, vigílias,
manifestações, protestos sentados, cordões humanos, greves, piquetes de greve,
milícias de autodefesa, etc.
Espero que os meus amigos A e B tenham
achado esclarecedor este artigo, mais do que não seja para delimitarmos bem aquilo
em que discordamos sobre este assunto de grande importância e melindre.
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P.S. [4 de Novembro de 2024] Lido no Diário de Notícias:
«São 1:20h da madrugada de 24 de outubro. Tiago estaciona o autocarro da carreira 2769 (Campo Grande-Cidade Nova, Loures). Ao fim de 21 paragens, já sem passageiros, está finalmente no terminal. Prepara-se para sair. Um grupo de nove encapuçados aproxima-se. Pela janela do condutor ainda aberta, um deles lança para dentro do veículo um cocktail molotov. E atinge Tiago. Em combustão, o motorista precipita-se para fora do autocarro. Os atacantes fogem. Os gritos da vítima e o clarão das chamas que entretanto consomem o veículo, depressa uma carcaça, alertam os moradores mais próximos.
É o mais grave de uma série de actos de vandalismo, aparentemente concertados e perpetrados em resposta à morte de Odair Moniz, morto a tiro por um polícia. “O Tiago não matou Odair. O Tiago não é polícia”, escreve o melhor amigo. Tiago tem queimaduras de segundo e terceiro grau nos braços, nas mãos, no tórax, no rosto e na cabeça. As vias respiratórias ficaram comprometidas. Está consciente.
“Vai ser uma recuperação muito lenta. O que mais me choca foi os agressores terem-no deixado ali a arder, sem uma ajuda”, diz um outro amigo» (“Tiago, 41 anos, lisboeta, benfiquista, sobrevivente de um cancro e do incêndio do seu autocarro”. Diário de Notícias, 4.11.2024).
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Notas
e Referências
[1] O semanário Expresso
avançou (e foi o único órgão de comunicação social a fazê-lo no que toca à
parte realçada em negrito) que este agente foi constituído arguido (o
que é normal) e indiciado de homicídio simples. Esta última informação
parece-me entrar em contradição com o princípio constitucional da presunção
de inocência «até ao trânsito em julgado da
sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com
as garantias de defesa» (artigo 32.º, alínea 2, da Constituição da
República Portuguesa). Mas, como não sou jurista, não tenho a certeza e, por
isso, vou abster-me de ruminar sobre este assunto. Seja como for, é quase
certo, como deu a entender o seu advogado, que o referido agente da PSP invocará
o instituto de legítima defesa se vier a ser acusado de homicídio
simples, pois a legítima defesa é uma das causas de exclusão da ilicitude e da
culpa, conforme dispõe o art. 31.º, n.º 2 a) do Código Penal: «Nomeadamente, não é ilícito o facto praticado: a) em
legítima defesa». Porém, a fazer fé nas informações que foram aparecendo
na imprensa sobre o circunstancialismo deste homicídio, não me parece que essa
invocação da legítima defesa seja compaginável com qualquer das circunstâncias
previstas no artigo 3.º do decreto-lei n.º 457/99 sobre a legitimidade do recurso
a armas de fogo por agentes policiais. A ver vamos.
[2] «As
cenas de destruição repetem-se, noite após noite, com actos de vandalismo
praticados por grupos de jovens, alguns deles adolescentes, a
deixarem em cinzas peças de mobiliário urbano, carros e autocarros em vários
pontos da Área Metropolitana de Lisboa (AML). Registam-se casos de
cocktails-molotov e engenhos pirotécnicos atirados, a meio da noite, contra
transportes públicos e edifícios, um deles uma esquadra da PSP. As autoridades
policiais detêm e identificam dezenas de indivíduos suspeitos de praticarem esses
actos, alguns deles menores de idade, e anunciam um reforço de
intervenção» (“Tumultos nos bairros da Grande Lisboa são sintoma das
“falhas das políticas públicas”. Público, 25-10-2024). [Realce por meio
de traço grosso, acrescentado ao original, n.e.].
[3] O regime neobanderista dos presidentes Oleksandr
Turchynov (nomeado pelos golpistas de Maidan para substituir interinamente Viktor
Ianukóvytch, o presidente livremente eleito derrubado inconstitucionalmente em
22 de Fevereiro de 2014), Petro Poroshenko (7 de Junho de 2014-20 de Maio de
2019) e Volodymyr Zelensky (21 de Maio de 2019-21 de Maio de 2024) não é apenas
russófobo. `É também declaradamente racista. Por exemplo, os russos são
apelidados de orcs (criaturas sub-humanas
de aspecto repelente que combatem contra as forças do bem) e mankurts (escravos completamente
submissos ao seu amo; pessoas sem memória; criaturas vivas, mas semelhante a zombies)
pelos apoiantes do regime ucraniano.
[4] «Referindo-se a uma realidade
que tem tido uma considerável expressão na Área Metropolitana de Lisboa, o
último Relatório Anual de Segurança Interna (RASI), relativo a 2023, assinala um
crescimento de 8,7% da delinquência juvenil e uma subida de 14,8% da
criminalidade grupal, definida como o cometimento de crime por três ou mais
suspeitos. Fenómenos que esse documento integra em dinâmicas associadas a
rivalidades entre grupos de diferentes zonas ou bairros da AML. E que,
nota, “costumam ser referidos em músicas e videoclipes de subculturas musicais
que representam referências hiperlocais e hiperpessoais.
Uma
conjuntura que, escreve-se no RASI 2023, estará muito associada à subcultura
“drill”, subgénero musical derivado do hip-hop e cujo imaginário lírico é, com
grande frequência, preenchido por cenas de brutalidade explícita e
glorificação de actos de violência. Um diagnóstico que já constava do
relatório de 2022. As redes sociais acabam por ser um facilitador da acção desses grupos, identifica o relatório, que aponta como zonas de maior tensão os
concelhos de Loures e Amadora» (Samuel Alemão, «Tumultos nos bairros da Grande
Lisboa são sintoma das ‘falhas das políticas públicas’», Público,
25 de Outubro 2024). [Realce, por meio de traço grosso, acrescentado
ao original, n.e.]
[5] Os protagonistas dos vídeos
reproduzidos neste artigo exprimem o “racismo antirracista” na sua versão
mais grosseira, boçal e facínora, que, presumivelmente, será a mais apelativa
para o seu público-alvo, esquematicamente descrito na nota anterior. Mas há
também uma versão palaciana, ad usum delphini. É a que encontramos
expressa na “Declaração do Porto: reparar o
irreparável”, de 7 de Julho 2023 (in Buala, https://www.buala.org/pt/mukanda/declaracao-do-porto-reparar-o-irreparavel), cuja análise
exigiria um ou mais artigos do tamanho deste.
[6] Talvez seja mais tarde do que cedo (a ter em conta as
informações que constam das duas notícias seguintes). Mas seria ilusório supor
que isso nunca acontecerá. Acontecerá: “é fatal como o destino!”,
como se costuma dizer.
«Em comunicado divulgado esta sexta-feira, a PSP refere
que os dois homens, de 18 e 28 anos, que faziam parte de um grupo de oito
suspeitos que, mediante recurso a combustível e isqueiros “encontravam-se a
deflagrar focos de incêndio em caixotes de lixo”.
As detenções dos dois homens, ocorreram pelas 00h30 de quarta-feira, por
serem suspeitos de crimes de dano qualificado e ofensas à integridade física
qualificada.
Segundo a força policial, quando as autoridades chegaram ao local, os
homens “arremessaram pedras contra [os agentes], encetando fuga de seguida”,
tendo sido desencadeada uma perseguição policial a pé, que terminou com a
detenção dos dois e a apreensão de “um jerricã com resíduos de combustível e de
um isqueiro”, indica a polícia.
Presentes a primeiro interrogatório no tribunal judicial da Comarca de
Lisboa Oeste - Amadora, foi aplicada aos dois homens, como medida de coação, apresentações semanais e proibição da
utilização de isqueiros». (“Suspeitos de atear fogos na Amadora sujeitos a
apresentações semanais e proibidos de utilizar isqueiros”, Lusa. 25 de
Outubro 2024).
A notícia
seguinte esclarece a razão de ser da frouxidão destas sanções.
«Segundo dados oficiais fornecidos pela Direção Nacional da PSP, houve 155
ocorrências relacionadas, de forma directa ou indirecta, com o caso de Odair
Moniz. Estes incidentes, com predominância de fogo posto, resistência [à detenção
em flagrante delito] e danos materiais, resultaram em 22 detenções e a
identificação de outros 23 suspeitos.
Contudo, nenhuma das detenções resultou em prisão preventiva. A decisão de
não aplicar prisão preventiva aos 22 detidos segue o disposto no Código Penal.
Nos casos de vandalismo e dano, que são os crimes pelos quais a maioria dos
detidos foi indiciada, a pena máxima prevista é de três anos de prisão. Este
enquadramento legal não permite a aplicação da prisão preventiva, uma vez que
tal medida é reservada para crimes de maior gravidade com penas superiores. A
pena de até três anos prevista para estes casos tem, por isso, sido
insuficiente para impor medidas de detenção mais severas, mesmo em situações de
agitação social.
No entanto, segundo apurou o Correio da Manhã, os autores dos actos de
maior gravidade, como os incêndios em autocarros, ainda não foram identificados
nem detidos. Estes casos específicos, previstos no artigo 272.º do Código Penal
como crimes de incêndio, implicam uma pena mais elevada, entre três e dez anos
de prisão, e abrem a possibilidade para a aplicação de prisão preventiva» («Morte de
Odair Moniz: 22 detidos por violência e tumultos acabam libertados. PSP fala em
“humilhação”». Revista de Imprensa, 29 Out. 2024. Executivedigest.Sapo.pt).
[7] «[Os maiores traficantes de drogas] Desenvolveram contactos internacionais, criaram estruturas locais de distribuição, conseguiram milhões de euros e aplicaram a lei das ruas para vingarem durante anos no submundo português do tráfico de drogas. Uns caíram e estão presos, um ainda não. Estas são as histórias dos grupos liderados por Samir, Xuxas, Bianchi, Carvalho, Joaquim e Clarinha». (Tomás Guerreiro, “Quem são e como atuam os maiores traficantes de cocaína em Portugal”. Sábado, 16-10-2024).