tema 2
O QUE VIRÁ DEPOIS DO
FIM DA AGRESSÃO AMERICANO-SIONISTA AO IRÃO?
Uma declaração da “Iniciativa Um só Estado Democrático” [*]
26-06-2025
(Tradução
de José Catarino Soares)
Muro que separa Israel da Cisjordânia, mandado construir por Ariel Sharon [1928-2014], primeiro-ministro de Israel de 2001 a 2006. |
A
agressão americano-sionista ao Irão terminou abruptamente, sem que a colónia [entender: Israel, n.d.t.] atingisse qualquer
dos seus objectivos declarados: efectuar uma mudança de regime e acabar com o
programa nuclear [do Irão]. O regime iraniano
sofreu perdas, mas está longe de ter sido desestabilizado; e embora não se
saiba ao certo que danos sofreram as instalações nucleares iranianas, elas
ainda lá estão, juntamente com o urânio enriquecido e os conhecimentos
científicos necessários para prosseguir com o programa nuclear. A busca de
dominação incontestada por parte da colónia falhou até agora, mas a sua sede de
dominação não. É por isso que é crucial que os palestinianos e os árabes, bem
como os israelitas e o resto do mundo, aprendam com o que aconteceu e
transformem esse conhecimento em acções políticas concretas.
OS PALESTINIANOS E OS
ÁRABES, PARTICULARMENTE NA REGIÃO AL-SHAM, TÊM DE RECONHECER A NECESSIDADE DE
UM PROGRAMA POLÍTICO PRÓPRIO
Temos
de compreender que nem a República Islâmica do Irão nem ninguém se apressará a
salvar-nos. A República Islâmica, que não se mexeu para impedir o genocídio [em Gaza, n.d.t.], mexeu-se para proteger os
seus próprios interesses e depois manteve Gaza fora do acordo de cessar-fogo. É
isto que os Estados fazem: procuram zelar pelos seus próprios interesses, não
os dos outros. A colónia, o Irão, a Turquia e outros Estados têm programas
políticos. Onde está o nosso programa?
Temos
de reavivar o nosso programa e regressar à visão histórica de um só Estado
palestiniano democrático. Isto não significa esperar que os dirigentes
políticos existentes o façam, mas sim criar e aderir a organizações políticas
libertadoras e democráticas que desafiem as direcções políticas existentes. Em
Gaza, estas organizações desempenhariam um papel no “dia
seguinte” [à desocupação por Israel, n.d.t.].
Na Cisjordânia, trabalhariam para prevenir a próxima destruição étnica, talvez
em linha com o documento “Palestinianos, previnam-se contra a ameaça de uma próxima Nakba!”.
Na Palestina de 1948, teriam encontrado formas de desempenhar um papel fora da
estrutura sionista.
Na
diáspora, estas organizações desenvolveriam a capacidade política, mediática e
organizacional para desafiar a hegemonia cultural sionista e participar em
movimentos descolonizadores locais. E nos países vizinhos não estatais [entender: não soberanos, n.d.t.], como o
Líbano, a Síria ou a Jordânia, é necessário juntar movimentos com um programa
político para o estabelecimento de Estados que rompam com os actuais modelos
identitários e coordenem esforços contra a normalização.
OS ISRAELITAS TÊM DE
COMPREENDER QUE O SIONISMO FALHOU
A
sua afirmação de que só abandonando as suas sociedades de origem e criando uma
nova sociedade, “etnicamente pura”, com um
Estado exclusivamente para eles, é que os judeus podem estar seguros, provou
ser falsa. Não só o exército de ocupação israelita não conseguiu subjugar a
resistência palestiniana numa pequena área sitiada, como também não conseguiu
manter a população israelita a salvo dos mísseis iranianos e infligir quaisquer danos duradouros ao
Irão.
Uma bandeira de Israel assinala a área onde foram construídas novas casas de um colonato israelita ilegal na Cisjordânia. 25/10/2021.Fonte: AP -Ariel |
Que
outra reacção se poderia esperar da colonização, do apartheid
e do genocídio perpetrado pelos colonos [israelitas] na
Palestina e na região? Serão os edifícios destruídos em toda a colónia a
segurança que o sionismo prometeu? A dependência total do apoio dos Estados
Unidos é a “auto-determinação judaica”? O que
acontecerá quando, por qualquer razão, um governo americano decidir deixar de
apoiar a colónia?
Muro que separa a Faixa de Gaza de Israel, mandado construir, em 2023, por Benjamim Netanyahu, actual primeiro-ministro de Israel |
É
tempo de os israelitas abandonarem o sionismo. Alguns estão a optar por deixar
a Palestina neste momento, enquanto outros estão a optar por trabalhar com os
palestinianos para desmantelar o Estado dos colonos e estabelecer a sua
antítese: um só Estado palestiniano democrático onde os habitantes de todas as
identidades [étnicas e religiosas, n.d.t.] possam
viver juntos como faziam antes do sionismo. Quantos mais o fizerem e quanto
mais cedo o fizerem, mais perto estaremos todos da verdadeira segurança — segurança
baseada na descolonização, na justiça e na dignidade e não na opressão.
O RESTO DO MUNDO TEM
DE COMPREENDER QUE A COLÓNIA É UM AMEAÇA PARA O MUNDO INTEIRO
Não está apenas a cometer genocídio na
Palestina e a destruir países vizinhos. Iniciou uma campanha de bombardeamento
do Irão, que fica a 1.500 km de distância, sem ser provocada. Chegou mesmo a
visar aliados, cortando o fornecimento de gás à Jordânia, e vozes sionistas
pronunciaram-se recentemente a favor de acções militares contra o Egipto, o
Paquistão, o Qatar e a Turquia.
O
que impedirá a colónia de atacar Chipre, a Grécia ou outros países se sentir
que estes representam uma ameaça para si, talvez até alargando o seu âmbito de
agressão se se tornar mais forte nos próximos anos? O que acontecerá se
recorrer à “opção Sansão” e utilizar as suas
armas nucleares de forma preventiva caso se sinta ameaçada por uma ameaça
militar convencional? Poderá o mundo dar-se ao luxo de tolerar a existência de
um Estado tão desonesto?
As
últimas semanas, anos e décadas mostraram que a colónia é uma ameaça para todos
na Palestina, na região de Al-Sham e no mundo. A “Iniciativa Um Só Estado Democrático” apela a
todos para irem além dos meios de protesto a que temos recorrido até agora e para
se juntarem a organizações políticas que se unam em torno de uma visão que seja
a antítese do projecto sionista: Uma visão de um só Estado democrático, do rio [Jordão] ao mar [Mediterrâneo],
e de uma verdadeira democracia para além do rio e do mar.
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[*]Fonte: https://mobadara.ps/en/statements/what-comes-after-the-end-of-the-us-zionist-aggression-on-iran/
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[n.d.t.= nota do tradutor]
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Anexo. O comentário de Joaquim Camacho (ver mais abaixo) vinha acompanhado dos seguintes fotogramas, que não são inseríveis no espaço dos comentários. A solução foi inseri-los aqui (J.C.S).
[27/06, 13:31] Jom: Interessante reflexão sobre o pós-guerra Israel-Irão. Mas há que ter em atenção o seguinte pormenor: os autores da declaração reivindicam a necessidade de implantar um só estado democrático na Palestina do rio ao mar, «onde os habitantes de todas as identidades [étnicas e religiosas, acrescenta o tradutor] possam viver juntos como faziam antes do sionismo. Mas não refere estado *laico*, condição incontornável da separação do estado das confissões religiosas como garantia do não apoio material a qualquer delas, que sob a administração otomana e dos califados anteriores ao seu domíniotolerava as práticas religiosas dos crentes não muçulmanos mediante o pagamento de um taxa (jizya em árabe).
ResponderEliminar[27/06, 13:36] Jom: Ainda por cima os autores da declaração aludem ao território do Bilād al-Shām, frequentemente chamada de Síria Islâmica ou simplesmente Síria em fontes britânicas, que era a designação de uma província dos califados Rashidun, Omíada, Abássida e Fatímida ocupando aproximadamente o antigo território daDiocese Bizantina do Oriente, conquistada pelos muçulmanos entre 634 e 647. Sob o domínio omíada (661-750), Bilad al-Sham era a província metropolitana do Califado, e diferentes localidades ao longo da província serviam como sedes dos califas e príncipes omíadas.
[27/06, 13:55] Jom: Sem pôr em causa o interessante contributo do grupo *Iniciativa Um só Estado Democrático*, considero imprescindível a referência a um estado palestiniano único, laico e democrático (em vez do colonizador estado sionista de Israel) do rio Jordão ao mar Mediterrâneo - sem prejuízo de acertos territoriais integradores no estado palestiniano dos território povoados maioritariamente por palestinianos, como acontece com a Jordânia (inventada pelos britânicos como contrapartida do apoio da dinastia Fayçal / Hachemita oriunda do Hejaz no actual território da Arábia Saudita, pelo apoio na I Guerra Mundial contra o Império Otomano - e o direito inalienável de regresso à Palestina de todos os palestrinianos deportados na Nakba de 1948 e dos seus descendentes. Estado palestiniano único , laico e democrático em vez do estado colonial de Israel, excluindo o regresso a qualquer forma de opressão política e social através de supremacia étnico-religiosa: Nem estado judeu nem califado muçulmano, ou império cristão! Palestina livre!
[27/06, 14:02] Jom: Naturalmente o direito de regresso a Palestina de todos os deportados pelo estado sionista de Israel deve abranger não apenas os palestinianos expulsos da sua terra com a Nakba de 1948, mas todas as vítimas de deportação desde a fundação do estado de Israel até a libertação efectiva da Palestina .
Oportuno esclarecimento do meu amigo JMG (que tem um valor acrescentado por vir de um ilustre historiador). É muito importante sermos rigorosos na linguagem que empregamos, sobretudo em matérias tão melindrosas como esta.
ResponderEliminarNa Declaração fundadora da «Iniciativa Um Só Estado Democrática» (IUSED, para abreviar), intitulada «A Palestina de amanhã --- uma Declaração», os seus autores tiveram o cuidado de escrever, a dado passo, que um dos objectivos a alcançar é : «Um Estado laico, que separe a religião da política, que não reivindica qualquer legitimidade religiosa, que salvaguarda a liberdade de crença, o direito de professar e praticar a religião e todos os direitos fundamentais, e que se recusa a conceder ou negar direitos com base nos antecedentes religiosos, ideológicos ou culturais de cada um, em ruptura total com o sionismo e a sua natureza sectária». Seria bom lembrar sempre este objectivo em todas as declarações públicas da IUSED e não pressupor que ele é conhecido da maioria do público leitor (porque não é).
«Iniciativa Um Só Estado *Democrático»
ResponderEliminarO Hezbollah libanês, segundo a propaganda que nos despejam diariamente pela goela abaixo, quer, tal como (alegadamente) os seus patronos iranianos, exterminar os judeus todos. Seguem, em anexo, imagens de uma entrevista do xeque Hassan Nasrallah, secretário-geral do Hezbollah, que a TVI24 transmitiu há anos (julgo que em Dezembro de 2009). Se isto é um "extremista terrorista", como os nazionistas e as nossas "democracias" mentirosas e cleptomaníacas lhe chamam, eu sou o rei da Prússia. O homem, afinal, dá lições de tolerância e democracia aos que, no Ocidente civilizado (medida de todas as coisas boas do planeta, dizem-nos), o vilipendiam e sugere a solução que qualquer país democrático apoiaria e qualquer democrata genuíno subscreveria.
ResponderEliminarÉ claro que só um estúpido da quinta casa não perceberá que, na situação actual, tal solução é absolutamente impossível, mas a (muito) longo prazo, se os loucos furiosos nazionistas não usarem o arsenal atómico de que dispõem para reduzir toda a região a pó, estou convencido de que será a solução adoptada. No tempo do apartheid na África do Sul também ninguém alguma vez acreditou que o país, com todos os seus defeitos e limitações, seguisse a via que seguiu, mas o certo é que, contra todas as expectativas, o "impossível" tornou-se realidade. A solução de Nasrallah, aliás, é a que vigora no Líbano, apesar das dificuldades que por vezes enfrenta (geralmente fomentadas pelas interferências e intrigas de Israel). Não era à toa que o Líbano, dantes, era considerado "a Suíça do Médio Oriente ".
Hassan Nasrallah, como é sabido, foi há alguns meses democraticamente assassinado por Israel. A propaganda nazionista precisa desesperadamente de inimigos radicais e intransigentes que lhe justifiquem escalada atrás de escalada, esbulho em cima de esbulho, massacre sobre massacre, pelo que gente que admite a possibilidade de compromissos é para eliminar... democrática e humanitariamente, claro!
ResponderEliminar"A ideia de dois estados é uma ideia votada ao fracasso. Até agora, é um fracasso. Criar um estado palestiniano ao lado de Israel significa destruir esse estado. A solução seria a criação de um único estado. Um único estado no qual coexistiriam muçulmanos, judeus e cristãos. Um estado democrático, pluralista e multicultural."
Ficou óptimo, amigo José Catarino!
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